Cássio Telles Ferreira Netto
A Lei Federal 9.307/96 que instituiu a arbitragem completa uma década. É um método alternativo de solução de conflitos fora da esfera do Poder Judiciário, onde um ou mais árbitros emitem decisões válidas como sentenças judiciais em território nacional. Aos poucos, essa forma de contornar a lentidão do Judiciário brasileiro ganhou credibilidade e sua utilização avança.
O Caesp (Conselho Arbitral do Estado de São Paulo), uma das câmaras pioneiras no país, criada em 1998, demonstra o crescimento do emprego da arbitragem nessa década. A entidade já acumula 19.762 conflitos solucionados, sendo 14.050 (71,10%) na área trabalhista, 2.991 (15,14%) na área comercial/outros e 2.721 (13,77%) na área cível. Uma justificativa para o crescimento nessas áreas pode estar no fato de a arbitragem começar a ser “desmistificada” entre os advogados, profissionais do direito, além de ser mais difundida entre os empresários.
Do ponto de vista econômico, o que se evidencia, na prática, é que a arbitragem é para as empresas a melhor forma de solucionar conflitos devido à rapidez, segurança e eficácia, diminuindo os custos dos processos que, no Judiciário, podem se arrastar por anos.
Hoje, no Caesp, os contratos são firmados de acordo com a necessidade das empresas, o que reduz ainda mais os custos com os procedimentos. A criação de convênios com empresas permite estreitar o vínculo do conveniado com a instituição, gerando maior volume de procedimentos. O mesmo acontece com entidades como ABF (Associação Brasileira de Franchising), APARH (Associação Paulista de Administração de Recursos Humanos), Associação de Ensino Superior Elite e a Ocesp (Organização das Cooperativas do Estado de São Paulo), que firmaram convênio com o Caesp.
Se tal fato já ocorre na área privada, na área pública a arbitragem também começa a ganhar impulso. O método ganhou força depois da promulgação pelo governo federal da Lei 11.196/05, a das Parcerias Público-Privadas (PPPs), que acrescentou dispositivos na Lei Geral da Concessão e Permissão de Serviços Públicos (Lei 8.987/05). O artigo 11, da Lei das PPPs e o artigo 23º da Lei 8.987 estabelecem que esses contratos podem “prever o emprego de mecanismos privados para resolução de disputas decorrentes ou relacionadas ao contrato, inclusive a arbitragem, a ser realizada no Brasil e em língua portuguesa, nos termos da Lei 9.307, de 23 de setembro de 1996”.
A introdução desses instrumentos fez com que o investidor privado se sentisse mais seguro para investir nas PPPs e seus projetos de infra-estrutura, como transporte, saúde, energia e saneamento. Do lado do governo, representou um avanço na credibilidade em um instrumento de solução de conflitos do qual a iniciativa privada já faz uso. O Caesp já tem casos concretos que mostram o uso da arbitragem na área pública. A Prefeitura de Araras, cidade do interior de São Paulo, por exemplo, já firmou parceria com a entidade para a instalação de uma câmara arbitral que atenda conflitos entre a administração pública e os munícipes.
Recentemente, o Caesp e a EMTU (Empresa Metropolitana de Transportes Urbanos de São Paulo) —que gerencia o transporte intermunicipal na região metropolitana do Estado— firmaram parceria para o uso da arbitragem. A empresa pretende utilizar a conciliação e a mediação em conflitos que possam surgir a partir de contratos firmados nas áreas trabalhista ou comercial com empresas terceirizadas. A idéia também é expandir o uso da arbitragem para todos os contratos de concessão e terceirização. A iniciativa ainda é rara entre as empresas públicas, mas precisa ser vista como uma alternativa viável, menos onerosa e mais rápida para as partes resolverem suas pendências.
É com esse objetivo que o Conima (Conselho Nacional das Instituições de Mediação e Arbitragem) vem trabalhando. O órgão, que congrega 118 câmaras ligadas ao instituto da arbitragem, sendo 35 filiadas e 83 em processo de filiação, está desenvolvendo uma série de iniciativas como apoiar e orientar câmaras nas áreas jurídica, fiscal, financeira e administrativa, entre outras.
A grande inovação, porém, quando falamos em arbitragem, ocorreu em junho do ano passado. Com a edição do decreto 4.719, Brasil, Argentina, Paraguai e Uruguai assinaram acordo sobre Arbitragem Comercial Internacional do Mercosul, uniformizando a organização e o funcionamento da arbitragem internacional nos Estados membros do bloco.
São avanços da arbitragem para além do território nacional, mas ainda falta às autoridades públicas brasileiras fazer o trabalho de casa. Ou seja, convencer os dirigentes de órgãos públicos locais de que a arbitragem é instrumento legal e legítimo para solucionar conflitos, inclusive na esfera pública.
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