A inexistência de autorização legal do Diretor da Coordenação da Receita do Estado do Paraná para ser realizada uma fiscalização e, lavrado eventual auto de infração por alguma irregularidade a Lei 11.580/96, torna nulo o ato em si, se a empresa estiver enquadrada como empresa de pequeno porte ou microempresa.
Tal fato se dá porque determinadas empresas tem um sistema privilegiado de tributação e fiscalização.
Vejamos.
Os artigos 170 e 179 da Constituição Federal dizem o seguinte:
“art. 170) A ordem econômica, fundada na valorização do trabalho humano e na livre iniciativa, tem por fim assegurar a todos existência digna, conforme os ditames da justiça social, observados os seguintes princípios:
. . .
IX – tratamento favorecido para as empresas de pequeno porte constituídas sob as leis brasileiras e que tenham sua sede e administração no País.
art. 179) A União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios dispensarão às microempresas e às empresas de pequeno porte, assim definidas em lei, tratamento jurídico diferenciado, visando a incentivá-las pela simplificação de suas obrigações administrativas, tributárias, previdenciárias e creditícias, ou pela eliminação ou redução destas por meio de lei.”
Neste enfoque, vislumbra-se que o objetivo do Estado é incentivar o pequeno empresário, de modo a criar empregados e fazer girar a moeda no mercado financeiro, tornando mais competitivo a atuação empresarial nos diversos segmentos, com a redução dos encargos fiscais.
Assim sendo, os benefícios foram sendo criados pelos Estados da Federação, resultando no mês de janeiro de 2003, a edição do Decreto Estadual nº 246.
Nesse decreto, restou sacramentada nova redação dos artigos 406 e 407 da LICMS, quais sejam:
“art. 406) As microempresas e as empresas de pequeno porte terão tratamento tributário diferenciado, regendo-se pelos termos, limites e condições deste Capítulo.
art. 407) Para os fins do disposto neste capítulo, considera-se:
I – Microempresa, aquela que tiver receita bruta anual igual ou inferior a R$ 180.000,00 (cento e oitenta mil reais), no ano de seu enquadramento ou no ano anterior, se estiver em atividade;
II – empresa de pequeno porte – EPP, aquela que tiver receita bruta anula superior a R$ 180.000,00 (cento e oitenta mil reais) e igual ou inferior a R$ 1.5000.000,00 (um milhão e quinhentos mil reais), no ano de seu enquadramento ou no ano anterior, se estiver em atividade.”
Pois bem, com tal redação se encaixaram todas as empresas em questão na orla de aplicação de referido mandamento legal, devendo as mesmas sofrer a isenção e redução de alguns tributos, tal como o ICMS, segundo disposto nos artigos 410 e 411:
“art. 410) A parcela de receita bruta mensal do conjunto de estabelecimentos da microempresa e da empresa de pequeno porte, até R$ 15.000,00 (quinze mil reais), fica desonerada do ICMS.
. . .
art. 411) As microempresas e as empresas de pequeno pote, conforme definidas neste Capítulo, ficam sujeitas ao recolhimento mensal de ICMS de valor equivalente ao somatório do resultado da aplicação dos seguintes percentuais sobre a receita bruta mensal do conjunto de seu estabelecimentos:
I – 2% (dois pontos percentuais), sobre a parcela de receita bruta que exceda R$ 15.000,00 (quinze mil reais) e seja igual ou inferior a R$ 40.000,00 (quarenta mil reais);
II – 3% (três pontos percentuais), sobre a parcela de receita bruta que exceda R$ 40.000,00 (quarenta mil reais) e seja igual ou inferior a R$ 100.000,00 (cem mil reais);
III – 4% (quatro pontos percentuais), sobre a parcela de receita bruta que exceda R$ 100.000,00 (cem mil reais).
. . .”
Aliás, não só a tributação é diferenciada, como também o sistema de fiscalização realizada pelos agentes fiscais, restou submetido a regras intransponíveis, tal como retrata o artigo 3º, in verbis:
“art. 3º) A fiscalização das empresas enquadradas no Regime Fiscal das Microempresas e das Empresas de Pequeno Porte terão, prioritariamente, caráter orientativo e medidas fiscais de caráter punitivo serão, NECESSARIAMENTE, precedidas de autorização do Diretor da Coordenação da Receita do Estado.” – grifo nosso
Com essas regras, certamente que o objetivo do Estado do Paraná era de incentivar os pequenos empresários a produzirem e ministrar o dinheiro que iria ser direcionado ao fisco estadual, dentro de seu próprio negócio, mantendo-lhes plena eficácia sobre seus atos e livre disposição para melhor atuar no mercado, tornando-se competitivos e aumentar, gradativamente, a produção.
No entanto, havendo uma fiscalização em determinada empresa e conseqüente autuação fiscal, tal ato somente seria legal se houvesse a expressa demonstração dessa autorização pelo Diretor da Coordenação da Receita do Estado.
Não havendo tal autorização, o ato é nulo de pleno direito, vez que há agressão ao Princípio da Reserva Legal, pois somente à partir da obediência a lei, é que poderia o fisco atuar contra uma determinada empresa, ou seja, exercer o seu direito de polícia.
Lembremos sempre que o Estado pode muito, mas não pode tudo.
Agindo em contrário, o Estado exorbita em seu poder de fiscalização, deixando de incentivar a produção das empresas de pequeno porte, bem como a onera de forma ilegal e injusta.
Também há que se atentar para a violação ao Princípio da Legalidade, consubstanciado no artigo 5º, II da Constituição Federal, tornando completamente informal o modo como se perquire a base de cálculo sobre o imposto e eventual multa, os quais necessitam, de lei federal para sua modificação.
Vejam nobres leitores que, estamos falando aqui de atos vinculados da administração fazendária, a qual não pode, por ato discricionário, por presunção, realizar atos divorciados de suporte legal.
Neste passo, extrai-se a inarredável conclusão de que o ato da fiscalização e a lavratura de eventual auto de infração são nulos de pleno direito, pois ilegais.
Ainda, caso o auto de infração seja convertido em certidão de dívida ativa, a CDA também se reveste de ilegalidade, pois incerta a obrigação ali contida, haja vista a dúvida razoável existente quanto a legalidade do ato ou fato imputado como certo.
* Éderson Ribas Basso e Silva é advogado na cidade de Umuarama-PR.