As mudanças no Direito Sucessório e de Família no novo Código

J. A. Almeida Paiva*

O Código Civil 2002 introduziu certas modificações no Direito de Família, como v.g.: o direito de “qualquer dos nubentes, querendo, poder acrescer ao seu o sobrenome do outro” (CC 1565 § 1º); o fato de ter acabado com a instituição do “marido como chefe da sociedade conjugal” (CC 1916, 233) que a partir do CC atual “será exercida, em colaboração, pelo marido e pela mulher, sempre no interesse do casal e dos filhos” (CC 1567); a redução do prazo de 2 (dois) anos previsto na Lei nº 6.515 (Ldi) de 26/12/1977 para se requerer a separação judicial; o art. 1.574 do CC 2002 reduziu de 2 (dois) para um ano tal prazo; isto quer dizer que com a nova redação do atual Código Civil, já é possível requerer a separação judicial por mútuo consentimento dos cônjuges após decorrido apenas um ano do casamento, além de outras.

Mas, no direito sucessório o novo CC que entrou em vigor a 11/01/2003 alterou vários dispositivos introduzindo novidades.
Numa análise superficial do novo CC podemos destacar algumas dessas alterações, mas antes de informá-las, é oportuno recordamos certos termos que são “gerais e concernentes à sucessão, que se aplicam tanto à sucessão testamentária quanto àquela que se processa tendo falecido o de cujus ab intestato , isto é, sem ter deixado testamento”. (I)

São regras gerais, tais como: “legítima” que é a “porção da herança que o testador não pode dispor por ser, por lei, reservada aos herdeiros necessários. (II)

O art. 1846 norma que “pertence aos herdeiros necessários, de pleno direito, a metade dos bens da herança, constituindo a legítima.”

São “herdeiros necessários” os descendentes, os ascendentes e o cônjuge (CC 1845); são considerados “herdeiros necessários” porque eles não podem ser afastados da sucessão pela simples vontade do sucedido, salvo se o autor da herança afastá-los quando atribuir-lhes um fato caracterizador de ingratidão.

Os casos que só podem ser revogados por ingratidão estão elencados no art. 1183 do CC e resumem-se nos seguintes: se o donatário atentou contra a vida do doador, se cometeu contra ele ofensa física, se o injuriou gravemente, ou o caluniou e, se, podendo ministrar-lhes, recusou ao doador os alimentos, de que este necessitava.

“Vocação Hereditária” é uma regra pela qual o legislador estabeleceu uma ordem em que são divididas as pessoas chamadas a herdar em classes impondo, como esclarece SILVIO RODRIGUES, entre eles uma “relação preferencial”. (III) A ordem da vocação hereditária pelo art. 1.603 do CC 1916 considerava a sucessão legítima na seguinte ordem: I) descendentes; II) ascendentes; III) cônjuge sobrevivente; IV) colaterais; V) Municípios, Distrito Federal ou à União.

Já o art. 1.829 do CC 2002 deferiu a ordem obedecendo o seguinte critério: I) aos descendentes, em concorrência com o cônjuge sobrevivente, salvo se casado este com o falecido no regime da comunhão universal, ou no da separação obrigatória de bens (art. 1.640, parágrafo único); ou se, no regime da comunhão parcial, o autor da herança não houver deixado bens particulares; II) aos ascendentes, em concorrência com o cônjuge; III) ao cônjuge sobrevivente; IV) aos colaterais.

MARIA HELENA DINIZ doutrina que “entre nós, o regime obrigatório é o da separação de bens sem a comunhão dos aqüestos, necessário em hipóteses excepcionais (CC, art. 1.641, I a III), quando perdem os noivos a liberdade de escolher o regime matrimonial de sua preferência.” (IV)

A convocação das classes, segundo doutrina WASHINGTON DE BARROS MONTEIRO(V) “é sucessiva, uma depois da outra”; isto quer dizer que chamada a primeira classe, só será chamada a 2ª se não houver herdeiro necessário na primeira, e assim sucessivamente ou como diz SILVIO DE SALVO VENOSA : “a chamada dos herdeiros é sucessiva e excludente, isto é, só serão chamados os ascendentes na ausência de descendentes, só será chamado o cônjuge isoladamente, na ausência de ascendentes, e assim por diante.” (VI)

Somente se considera herança para efeito sucessório, a meação do de cujus, quando houver cônjuge supérstite ou sobrevivente, isto porque a meação do cônjuge não é herança. (VII)

Verifica-se que o Poder Público foi retirado da ordem da Vocação Hereditária e que o cônjuge supérstite foi incluído nas três primeiras classes, sendo que para as duas primeiras são exigidos certos pressupostos para que possa concorrer com os descendentes e ascendentes.

Na primeira classe o cônjuge concorre com os descendentes (art. 1.829, I) somente se não for casado com o de cujus no regime de comunhão universal ou se casado no regime de separação obrigatória de bens (art. 1.640, parágrafo único) ou ainda se casado no regime de comunhão parcial, o autor da herança não houver deixado bens particulares.

O regime legal de bens, à falta de estipulação expressa ou convenção, é o regime de comunhão parcial; todavia o parágrafo único do art. 1.640 permite aos nubentes, no processo de habilitação, optar por qualquer dos regimes previstos no CC, fazendo-se o pacto antenupcial por escritura publica, dispensável somente se o regime escolhido for o de comunhão parcial feito apenas por termo reduzido no processo de habilitação.

Os nubentes têm também a liberdade de estabelecer um sistema misto de regime de bens no pacto antenupcial, desde que as cláusulas não contenham disposições proibidas por lei ou não contrarie o sistema jurídico, e refiram-se exclusivamente à questão patrimonial.

Outras novidades no direito sucessório é que marido e mulher não podem ser sócios entre si ou de terceiros, se forem casados sob os regimes de comunhão universal ou separação legal de bens.

Impera aqui a norma do art. 977 do CC que diz: “Faculta-se aos cônjuges contratar sociedade, entre si ou com terceiros, desde que não tenham casado no regime de comunhão universal de bens, ou no da separação obrigatória”.

O art. 1.639, § 2º admite a alteração do regime de bens, “mediante autorização judicial em pedido motivado de ambos os cônjuges, apurada a procedência das razões invocadas e ressalvados os direitos de terceiros”

Todavia, observa MARIA HELENA DINIZ que “a esse respeito será preciso ressaltar que pelo art. 2.039 do novel Código os casamentos realizados antes da sua entrada em vigor, em relação ao regime de bens, seguem o disposto no Código Civil de 1916 (norma especial)” (VIII) ; isto que dizer que a norma do § 2º, do art. 1.639 do CC 2002, só se aplica aos casamentos realizados após 11/01/2003.

Entendemos que à falta de previsão legal para o procedimento, as partes interessadas na obtenção da autorização judicial para alterar o regime matrimonial de bens, deverão valer-se do procedimento de jurisdição voluntária, normado no art. 1.103 do CPC, tal como se faz na hipótese do suprimento de outorga uxória.

Notas de rodapé

1- Giselda Maria Fernandes Novaes Hironaka, Comentários ao Código Civil, ed. Saraiva, 2003, vol. 20, p. 213.

2- Artur Vasco Itabaiana de Oliveira, Tratado do direito das sucessões, V. 2, p. 626

3- Silvio Rodrigues, Direito Civil; direito das sucessões, v. 7, p. 61.

4- Maria Helena Diniz, Comentários ao Código Civil, ed. Saraiva, 2003, vol. 22, p. 316

5- Washington de Barros Monteiro, Curso de Direito Civil, direito das sucessões, V.6, p. 67.

6- Sílvio de Salvo Venosa, Direito Civil – Direito das Sucessões, ed. Atlas, 3ª ed. 2003, p. 92.

7- Idem, p. 104.

8- Maria Helena Diniz, Comentários ao Código Civil, ed. Saraiva, 2003, vol. 22, p. 319.

J. A. Almeida Paiva é advogado em São Paulo e professor de Processo Civil

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