"As sanções tributárias e os princípios constitucionais."

É comum a pergunta sobre se as sanções tributárias, que têm natureza jurídica distinta dos tributos, estariam, ainda assim, sujeitas aos princípios constitucionais tributários, especificamente aos princípios da legalidade, da irretroatividade, do não-confisco, da capacidade contributiva, da tipicidade, da segurança jurídica e da anterioridade.

É claro que as normas jurídicas gerais e abstratas que estipulam sanções tributárias estão, como as demais unidades do sistema, submetidas aos princípios jurídicos, quer constitucionais gerais quer constitucionais tributários, na medida em que, estes, como normas vetoras, constituem, nas palavras do mestre Roque Carrazza, enunciados lógicos, implícitos ou explícitos que, por sua grande generalidade, ocupam posição de preeminência nos vastos quadrantes do Direito, e, por isto mesmo, vinculam, de modo inexorável, o entendimento e a aplicação das normas jurídicas que com ele conectam.

Dentre os princípios supra elencados, preferimos ver, na esteira do que leciona o Professor Paulo de Barros Carvalho, como sendo princípios constitucionais gerais o da legalidade, o da irretroatividade e o da segurança jurídica, e como sendo princípios constitucionais tributários o do não-confisco e o da anterioridade, sendo certo que não faz ele alusão aos princípios da capacidade contributiva e da tipicidade.

Óbvio que a fixação normativa de sanções tributárias está atrelada ao princípio geral da legalidade, bem como é curial que há que se respeitar a baliza maior, igualmente genérica, da irretroatividade (aqui expressando a segurança jurídica) no estabelecimento geral e abstrato de sanções dessa natureza, ressalvada a chamada retroatividade benéfica, objeto de expressa estipulação do Código Tributário Nacional.

Quanto ao não-confisco, ou, mais propriamente, quanto ao “Princípio da proibição de tributo com efeito de confisco”, na dicção do Professor Paulo de Barros Carvalho, entendemos que, conquanto a Constituição Federal enuncie, expressamente, a vedação à utilização de tributo com efeito de confisco, tal economia de palavras não pode dar respaldo à fixação normativa de sanções tributárias que, por sua flagrante desproporção com a dimensão econômica da lesão causada, venham a mal travestir a intenção expropriatória , o fito de, a latere do sistema, engordar o Erário com agressão ao direito de propriedade.

Assim é que, gratia argumentandi, a previsão de uma multa equivalente a três vezes o montante do tributo sonegado, ou de penalidade correspondente a duas vezes o montante da exação declarada e impaga, soaria, mesmo ao homem comum, como uma forma extravagante de penalização, embutindo o animus de retirar a fórceps a propriedade do particular.

Nessa direção, importantíssimo é o precedente fixado pelo Supremo Tribunal Federal que, na apreciação da ADIn 551-1 – Rio de Janeiro, decidiu pela declaração de inconstitucionalidade de disposições constitucionais transitórias da Constituição do Estado do Rio de Janeiro, que fixavam valores mínimos de multas correspondentes a duas vezes o montante do imposto declarado e não recolhido e a cinco vezes o monte do tributo sonegado, balizando seu entendimento para os inúmeros casos análogos certamente embutidos no cipoal das regras tributárias penais da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios e da legislação previdenciária.

Ditou a Magna Corte que A desproporção entre o desrespeito à norma tributária e à sua conseqüência jurídica, a multa, evidencia o caráter confiscatório desta, atentando contra o patrimônio do contribuinte, em contrariedade ao mencionado dispositivo do texto constitucional, exatamente o art. 150, IV, da Constituição Federal.

No que concerne ao princípio constitucional tributário da anterioridade, não vemos que a ele se submeta a fixação de sanções tributárias, pois as normas que a estabelecem podem ter vigência imediata, não se lhes aplicando a restrição do art. 150, III, “b”, da Constituição Federal.

Admitida a existência do princípio constitucional tributário da capacidade contributiva, tal como referido na indagação feita, cogito que o mesmo, que pode ser visto como uma derivação do não-confisco, deveria ser observado na previsão geral e abstrata de multas pecuniárias, com o escopo de que essas guardassem estrita proporção com o quantum do dano causado e respeitassem o imperativo de continuidade da atividade econômica do sujeito passivo, o que implicaria na impossibilidade do estabelecimento de sanções de cunho patrimonial fixas ou tão exacerbadas que acarretassem o seguimento dos negócios do contribuinte.

Da mesma sorte, o princípio da tipicidade, direcionado ao elaborador da norma geral e abstrata, e por igual dirigido ao criador da regra individual e concreta, implicaria em que o primeiro, ao desenhá-la, deve esgotar a descrição de todas as situações (tipos), cuja concreção será necessária e suficiente para o surgimento da pretensão punitiva do Estado, bem ainda exaurir todo os traços de quantificação da sanção aplicável; ao segundo, o aplicador da lei, por força da tipicidade, proibe-se a interpretação extensiva e a analogia, métodos hermenêuticos não compatíveis com serem taxativos e cerrados os tipos tributários penais.

Luiz Fernando Mussolini Junior é advogado, contador, juiz do Tribunal de Impostos e Taxas de São Paulo, professor titular em Direito Tributário no UniFECAP, vice-reitor do UniFECAP, mestre em Direito do Estado pela PUC/SP, sócio diretor de Piazzeta, Boeira, Rasador & Mussolini – Advocacia Empresarial

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