Aspectos conceituais do princípio do poluidor- pagador

silvana colombo

Advogada
Especialista em Direito Ambiental
Mestranda em Direito Ambiental UCS RS

Resumo
A humanidade vive uma realidade de incertezas, sob o ponto de vista ecológico, haja vista que a degradação do meio ambiente aumentou significativamente nas últimas décadas. Nem sempre o princípio da precaução tem êxito, por isso se consubstancia a importância do princípio do poluidor-pagador- objeto de estudo deste artigo ; este regula as situações de atividades ou obras lesivas ao meio ambiente, atribuindo ao agente poluidor a responsabilidade pela reparação do bem ambiental lesado.

Palavras – Chaves
Poluidor – meio ambiente – responsabilidade- Estado- coletividade- custos- reparação
1.1 Conteúdo normativo do Princípio do Poluidor-Pagador

O princípio do poluidor-pagador pode ser entendido como sendo um instrumento econômico e também ambiental, que exige do poluidor, uma vez identificado, suportar os custos das medidas preventivas e/ou das medidas cabíveis para, senão a eliminação pelo menos a neutralização dos danos ambientais.
Nessa linha de pensamento, afirma Derani que “A objetivação deste princípio pelo direito ocorre ao dispor ele de normas do que se pode e do que não se pode fazer, bem como regras flexíveis, tratando de compensações, dispondo, inclusive, de taxas a serem pagas para a utilização de um determinado recurso natural.” (1997, p. 159).
Em relação ao direito internacional, a Organização para Cooperação e para o Desenvolvimento Econômico (OCDE), através da Recomendação C (72) 128, de maio de 1972, definiu o Princípio do Poluidor Pagador como

[…] o princípio que usa para afetar os custos das medidas de prevenção e controle da poluição, para estimular a utilização racional dos recursos ambientais escassos e para evitar distorções ao comércio e ao investimento internacionais, é o designado princípio do poluidor-pagador. Este princípio significa que o poluidor deve suportar os custos do desenvolvimento das medidas acima mencionadas decididas pelas autoridades públicas para assegurar que o ambiente esteja num estado aceitável […] (ARAGÃO, 1997, p. 60).

É oportuno detalhar que este princípio não permite a poluição e nem pagar para poluir. Pelo contrário, procura assegurar a reparação econômica de um dano ambiental quando não for possível evitar o dano ao meio ambiente, através das medidas de precaução. Desta forma, o princípio do poluidor-pagador não se reduz à finalidade de somente compensar o dano ao meio ambiente, deve também englobar os custos necessários para a precaução e prevenção dos danos, assim como sua adequada repressão.
Coaduna com esta perspectiva, Barde e Girelli, ao afirmarem: “O princípio do poluidor-pagador não é um princípio de responsabilidade civil: vimos que a identificação do responsável não constitui de modo nenhum o ponto central de uma política ambiental. Cabe aos poderes públicos determinar o nível de intervenção mais eficaz.” (apud ARAGÃO, 1997, p.111-112).
Por isso, Antunes assevera que o Princípio do Poluidor-Pagador deve ser admitido em termos, justamente pelo fato de que este não pode, em hipótese alguma, se tornar um instrumento que “autorize” a poluição ou que permita a “compra do direito de poluir” (2001). Isto significa que a atividade poluente não pode em nenhuma situação trazer benefícios econômicos para o poluidor, pelo contrário, os custos das medidas de prevenção devem ser mais baratos em relação aos custos para eliminação ou redução dos efeitos decorrentes da lesão ambiental.
De outro lado, autores como Martin, citado por Aragão, criticam o Princípio do Poluidor-Pagador por considerá-lo “uma compra do direito de poluir”. Este autor fala de um “estranho complô” entre os poluidores e os seus fiadores (por exemplo, companhias seguradoras) e os mais puros ambientalistas, quanto à recusa em atribuir um valor monetário ao ambiente, por o “valor da natureza” não ser contabilizável (1997, p. 105).
Com efeito, não é possível confundir o princípio do poluidor-pagador com o instituto da responsabilização. Este é o entendimento de Aragão ao apontar que: “identificar os princípios do poluidor-pagador com o da responsabilidade, de maneira indiscriminada, do ponto de vista dogmático, conduziria a um verdadeiro desaproveitamento das potencialidades de ambos.” (apud LEITE, 2000, p. 58).
Assim, este princípio não está limitado apenas à sua dimensão econômica, embora tenha surgido como um princípio econômico, pois sua significação se estende ao campo da prevenção e também se constitui numa diretriz da responsabilidade civil. Não obstante o caráter de prevenção presente em sua aplicação, permanece ainda o dever do poluidor de arcar com os custos advindos desta atividade lesiva, bem como sua adequada reparação, ou mais especificamente, em atribuir ao poluidor o dever de arcar
Desse modo, o princípio da responsabilidade ambiental é analisado principalmente sob o enfoque do Princípio do Poluidor-Pagador (dimensão econômica). Reitera-se, então, que não há uma confusão entre este e o da responsabilidade ambiental, conforme leciona Canotilho: “[…] o princípio do poluidor-pagador não se identifica com o princípio da responsabilidade pois abrange, ou, pelo menos foca outras dimensões não enquadráveis neste último.” (apud LEITE, 2000, p. 57).
Embora no Direito Ambiental vigore o Princípio da Responsabilidade Civil, não podemos reduzir o princípio do poluidor-pagador a um princípio de responsabilidade. Isso porque as sanções civis têm efeito preventivo que pressupõe a ocorrência de um dano ao meio ambiente e, principalmente, porque as atividades poluidoras se apresentam lucrativas, seja pela possibilidade de não pagamento, seja pelo lucro líquido auferido com a atividade, mesmo que seja obrigado a indenizar
Assim, Kloepfer identifica as quatro dimensões do Princípio do Poluidor-Pagador: “a dimensão objetivo-racional-econômica, a social-ética-normativa, a política ambiental e a jurídico-normativa.” (apud DERANI, 1997, p. 161).
A primeira dimensão do princípio supramencionado refere-se aos custos ambientais, como também aos custos das medidas preventivas necessárias à preservação do meio ambiente. Já a perspectiva social ética-normativa se traduz na idéia de que a valorização econômica dos recursos naturais não pode implicar aumento das desigualdades sociais, devendo haver eqüidade na distribuição dos custos das medidas ambientais (DERANI, 1997).
Na terceira dimensão do princípio do poluidor-pagador procura-se determinar quem é o poluidor para que o mesmo seja responsabilizado. Uma vez identificado o poluidor, deve-se estudar as diversas formas jurídicas de responsabilizá-lo, ou seja, não há uma única forma de reação frente ao dano causado pelo agente poluidor, previsto em nosso ordenamento jurídico (dimensão jurídico-normativa) (DERANI, 1997).
Dessa forma, apesar de o princípio do poluidor-pagador preocupar-se essencialmente com o cálculo dos custos de reparação do dano ambiental (aspecto econômico), deve-se salientar que ele envolve normas de direito ambiental e, sobretudo, procura identificar o poluidor para imputar-lhe a responsabilidade pelo dano ecológico, seja exigindo indenização, seja determinando que o poluidor, quando possível, elimine os efeitos advindos de sua ação negativa sobre o meio ambiente.
Nos dizeres de Derani: “Com a aplicação do princípio do poluidor-pagador, procura-se corrigir este custo adicionado à sociedade, impondo-se sua internalização […]. O causador da poluição arca com os custos necessários à diminuição, eliminação ou neutralização deste dano.” (1997, p. 159).
O princípio em discussão apresenta explicitamente uma vocação redistributiva , pois os custos advindos do processo de produção devem ser internalizados, ou seja, os efeitos decorrentes do Princípio do Poluidor-Pagador são considerados como um dos fatores a serem observados na elaboração e cálculo dos custos de produção. Em relação a este aspecto escreve Prieur que “visa imputar ao poluidor o custo social da poluição por ele gerada. Engendrando um mecanismo de responsabilidade por dano ecológico abrangente dos efeitos da poluição não somente sobre bens e pessoas, mas sobre toda natureza.” (apud MILARÉ, 1990, p. 116).
Bender e Sparwasser confirmam a preponderância do aspecto econômico deste princípio ao afirmarem que “a atuação principal está ligada ao princípio da contabilização dos custos, através do qual deve arcar com os custos aquele que, pelo uso, provoca a deterioração dos recursos naturais […]. Deve-se proceder, portanto, a uma internalização dos custos sociais externos.” (apud DERANI, 1997, p. 159).
Nesta perspectiva, embora a sociedade não deva arcar diretamente com os custos de reparação da atividade lesiva ao meio ambiente, permite o princípio supramencionado que os custos sejam transferidos para o produto final, atingindo assim toda a coletividade e confirmando a máxima: “privatização de lucros e socialização de perdas”. Isso traz conseqüências negativas à eqüidade ambiental, uma vez que desencadeia a desigualdade na distribuição de riqueza, além de representar um benefício econômico que atinge um único indivíduo e não a coletividade.
Não se pode refutar que o causador do dano ambiental deva arcar com a responsabilidade de repará-lo, seja ele “produtor, consumidor, transportador” (DERANI, 1997, p. 158), e que até um certo ponto o mercado absorve esses custos e também a própria sociedade, pois não podemos esquecer que estamos inseridos numa organização social que prioriza, em sua essência, o econômico. Entretanto, isso não deve se tornar uma constante, sob pena de o Princípio do Poluidor-Pagador se tornar um instrumento útil ao poluidor, que se esquiva assim de sua única e exclusiva responsabilidade. Afastar-se-ia aquele de reparar o dano ecológico e, principalmente, de prevenir os danos ambientais.
Rebhinder reitera o entendimento de que a sociedade, em muitas situações, suporta os custos da reparação dos danos ambientais, ao apontar que:

Na prática política aplica-se no sentido limitado de que o poluidor suporta apenas os custos de controle da poluição que surgem devido à regulamentação ambiental; não há intenção de uma completa internalização de custo. Além disso, o princípio não é absoluto. Com freqüência aplica-se o princípio do encargo comum, o que significa que o público suporta os custos da proteção do ambiente. (apud LEITE, 2000, p. 60).

Na verdade, o Princípio do Poluidor-Pagador não se restringe simplesmente à internalização dos custos ambientais. Pelo contrário, sua aplicação procura determinar o causador do dano ambiental, a fim de imputar-lhe a responsabilidade pelos seus atos e, antes de tudo, prevenir a ocorrência de danos ambientais e não apenas repará-los.
Com efeito, o princípio acima referido não se destina apenas a atribuir os custos da atividade lesiva ao seu causador, em razão de seu caráter multifuncional. Isso por que, ao mesmo tempo em que auxilia na aplicação das medidas ambientais de precaução, abarca também a redistribuição dos custos advindos da degradação ambiental (LEITE, 2000).
Neste sentido, Canotilho leciona que o caráter multifuncional do Princípio do Poluidor-Pagador deve ser entendido como: “1) é uma diretiva da política de prevenção, evitando que externalidades sejam cobertas por subsídios do Estado; 2) é um princípio de tributação; 3) é um princípio tendencionalmente conformador do instituto da responsabi-lidade.” (apud LEITE, 2000, p. 58).
Pelo princípio em tela, busca-se num primeiro momento imputar ao poluidor o dever de reparar o dano causado ao meio ambiente, exigindo a recomposição do bem ambiental lesado (quando possível), e/ou fazendo com que aquele suporte os encargos econômicos provenientes da atividade considerada poluidora. Mas é preciso esclarecer que embora o Princípio do Poluidor-Pagador apresente algumas semelhanças com o mecanismo da responsabilidade civil, com este não se confunde, pois a responsabilidade civil objetiva vem a ser uma das conseqüências da aplicação do referido princípio.
Ademais, este princípio fundamental do Direito Ambiental assume uma significação que foge do campo meramente econômico, para alcançar também relevância nos diversos ramos do Direito, pois a aplicação do Princípio do Poluidor-Pagador busca diminuir o impacto para a sociedade dos custos econômicos da poluição, que se não corrigidas de forma satisfatória, acabam sendo suportadas diretamente pela sociedade e não pelo poluidor.
Com a aplicação do Princípio do Poluidor-Pagador, reitera-se que o fim precípuo do Direito Ambiental, a prevenção dos danos ao meio ambiente, está presente, ainda que com menos intensidade, no princípio anteriormente mencionado, o que coaduna com as exigências da tutela dos direitos difusos e coletivos, reconhecidos constitucionalmente e amplamente discutidos em nossa sociedade.
1.2 Fundamentos e fins do Princípio do Poluidor-Pagador

Um aspecto muito importante em relação a este princípio fundamental do Direito Ambiental, que tem seu nascimento e também fundamento na teoria econômica, estando relacionado, portanto, com o direito Econômico, é destacar a repercussão dos custos sociais da poluição, ou seja, os efeitos negativos que decorrem da atividade produtiva. De fato, a correção dos custos adicionais da atividade poluidora, atenuando as falhas do mercado, e desonerando a sociedade da responsabilidade direta pela poluição é, sem dúvida alguma, um dos fins deste princípio, especialmente se considerarmos sua dimensão econômica.
Benjamin assevera que “o objetivo maior do princípio do poluidor pagador é fazer com que os custos das medidas de proteção do meio ambiente – as externalidades ambientais – repercutam nos custos finais de produtos e serviços cuja produção esteja na origem da atividade poluidora. Em outras palavras, busca-se fazer com que os agentes que originaram as externalidades assumam os custos impostos a outros agentes, produtores e/ ou consumidores.” (1993, p. 229).
Associado a esta finalidade encontra-se enraizada, também, a obrigação de serem detectados e eliminados os fatores que conduzem à poluição, o que resulta na análise do custo-benefício da utilização do referido princípio, isto porque a correção das fontes potencialmente poluidoras é concomitantemente mais vantajosa para os poluidores, Estado e para a sociedade, do que a aplicação da responsabilidade civil. Não se trata de um princípio exclusivamente contabilizador dos custos econômicos e nem mesmo atrelado somente ao instituto da responsabilidade civil, sua função permeia o campo da prevenção e precaução dos danos ambientais.
Outro ponto a ressaltar refere-se ao direito adquirido em se tratando da preservação do meio ambiente, que precisa estar adequado a este fim, para que não constitua um elemento que venha permitir a violação dos preceitos normativos ambientais. Para a compreensão desta questão explicitaremos um exemplo: “uma indústria, previamente licenciada, deve ser freqüentemente monitorada e adequar-se aos novos padrões ambientais e tecnológicos sob pena de cassação da licença.” (LEITE, 2000, p. 60).
A constatação deste fato demonstra que “devem ser abolidos os direitos adquiridos” (PRIUER apud LEITE, 2000, p. 60), a fim de que não seja consagrado o direito de poluir naquelas atividades que já estão em funcionamento, contrariando o conteúdo normativo do Princípio do Poluidor-Pagador; as medidas de prevenção/precaução precisam ser implantadas nas atividades que já se encontram em funcionamento e nas novas instalações.
Pode-se verificar, no geral, que o Princípio do Poluidor-Pagador, além das finalidades anteriormente mencionadas, atua como instrumento de repressão, porque se empenha na tarefa de inibir a ação lesiva ao meio ambiente, através da punição do poluidor, na esfera civil, penal e administrativa. Assim, este princípio contempla a obrigação de reparar o dano causado e o impedimento da continuidade da atividade poluidora enquanto não for observado o padrão ambiental.
No que tange às finalidades do Princípio do Poluidor-Pagador, Aragão destaca que:

[…] a prossecução dos fins de melhoria e da qualidade de vida, com justiça social e ao menor custo, seria muito mais eficaz se cada um destes princípios se especializasse na realização dos fins para os quais está natural e originalmente mais vocacionado – o PPP, essencialmente, os fins da precaução, prevenção e redistribuição dos custos da poluição, com o sentido que expusemos. – O princípio da responsabilidade civil, sobretudo o fim da reparação dos danos, embora tenha também, naturalmente, um certo efeito preventivo inerente à aplicação de sanção, que não deve, contudo, ser a sua preocupação principal. (1997, p. 218).

Desta forma, se analisarmos o PPP apenas como um princípio econômico, seu fim ficará limitado a imputar ao poluidor os custos para o controle da poluição, que adveio da atividade produtiva por ele desenvolvida, ou seja, não haverá uma completa internalização dos custos sociais da poluição. De outro lado, podemos entender o referido princípio como um princípio jurídico e econômico, o que consagra os custos necessários à reparação do bem ambiental danificado e também os necessários à eliminação e redução da poluição emitida.
Concretamente, a responsabilidade civil ambiental está solidificada como um dos instrumentos indispensáveis para a concretização prática do Princípio do Poluidor-Pagador, à medida que permite a aplicação de uma sanção ao poluidor. Nesta acepção, o mecanismo de responsabilidade traz uma segurança jurídica, pois o poluidor é compelido a responder pelas suas ações, e também de uma forma mais abrangente e sistemática, o desestímulo da prática de atividades potencialmente poluidoras, demonstrando uma pretensão preventiva do instituto de responsabilização civil.
No entanto, apesar de vigorar a premissa de que devem responder pelos danos ambientais o agente que deu causa, o Princípio do Poluidor-Pagador não pode restringir-se ao mecanismo da responsabilidade civil, porque “se o PPP se identificasse efetivamente com o princípio da causalidade na responsabilidade civil, os fins do PPP identificar-se-iam com as funções gerais da responsabilidade civil: reparatória, preventiva e sancionatória.” (VARELA, 1992, p.100 ).
Ao discutir as finalidades deste princípio é pacífico na doutrina e na jurisprudência que seu fim principal é a prevenção dos danos ao meio ambiente, ante o fato de que a poluição não permite em todos os casos a completa reparação, sendo economicamente mais vantajoso para o Estado e para o potencial poluidor, a regulamentação das atividades que apresentam riscos para o meio ambiente, antes que ele realmente ocorra.
Observa, com muito acerto Moura: “se o que está em causa é prevenir, interessa sobretudo a regulamentação das atividades potencialmente lesivas do ambiente, antes que a lesão ou até o perigo de lesão tenha lugar. Um direito repressivo ou sancionatório aparece normalmente “depois do mal feito” com a irremovibilidade do dano respectiva” (1994, p. 13-14).
Ora, pontua-se que em alguns casos, mesmo sendo aplicadas as medidas de prevenção, o dano ambiental venha realmente a se concretizar, ultrapassando a margem de segurança dos padrões ambientais previamente estabelecidos. Deste fato, decorrem duas constatações:
1) Os poluidores desrespeitaram os níveis máximos de poluição permitidos, não se conformando com as medidas aplicadas, se considerarmos a utilização de instrumentos normativos. Aplica-se, sobretudo, as normas ambientais referentes à ação praticada pelo poluidor, como por exemplo, multas ou punição por crimes ambientais.
2) No que tange à utilização dos instrumentos econômicos, podemos concluir que o Princípio do Poluidor-Pagador não foi corretamente empregado e, portanto, o interesse social visado pela norma ambiental não foi alcançado, reforçando a necessidade de proceder-se uma avaliação periódica e sistemática da legislação ambiental, para a otimização de seus resultados (ARAGÃO, 1997).
Para Derani, a objetivação deste princípio pelo direito ocorre ao dispor ele de normas definidoras do que se pode e do que não se deve fazer, bem como as regras flexíveis tratando de compensações, dispondo inclusive sobre taxas a serem pagas para a utilização de um determinado recurso natural (1997, p. 159).
A prática efetiva dos fins primordiais do Princípio do Poluidor-Pagador, ou seja, prevenção e precaução, significam em última análise que os responsáveis pela degradação do meio ambiente, têm a responsabilidade de suportar os custos econômicos das medidas que forem selecionadas para a despoluição. Abrange também àquelas indispensáveis para a implementação das medidas de precaução e prevenção, sobretudo quando há certeza da ocorrência do dano e também nas atividades que oferecem riscos ao meio ambiente e que são consideradas potencialmente poluidoras.
O PPP é um princípio típico do Estado social que obriga a criar normas que alterem a ordenação espontânea de valores que gera através das regras do mercado (ordenação essa que redunda na subjugação da parte mais fraca à mais forte), contribuindo assim para alcançar o bem-estar e a justiça social (ARAGÃO, 1997, p. 212).
Assim, explicitadas as finalidades da aplicação deste principio estruturante do Direito Ambiental, cabe-nos discorrer no próximo tópico, a respeito de quem é realmente o poluidor, ou seja, quem a legislação ambiental considera poluidor, para que possamos compreender a significação e o alcance do referido princípio na sua totalidade que, a priori, embora haja controvérsias, se constitui num instrumento útil para a tutela dos direitos difusos, quando presente nas políticas ambientais dos Estados.
1.3 Definição do termo poluidor

No ordenamento jurídico brasileiro encontra-se a definição do termo “poluidor”, no art. 3o, inciso IV, da Lei 6.938/81, que expressa: “poluidor: a pessoa física ou jurídica, de direito público ou privado, responsável direta ou indiretamente por atividade causadora de degradação ambiental.”
Além disso, o art. 225 da Constituição Federal também proporciona subsídios para que se possa determinar o conceito de poluidor ou, mais especificamente, quem pode figurar no pólo passivo, na responsabilidade ambiental. Assim, ao expressar que “é dever do Poder Público e da coletividade preservar e defender o meio ambiente”, entende-se que tanto a coletividade como o Poder Público podem se enquadrar no conceito de poluidor, figurando como legitimado passivo (FIORILLO & RODRIGUES, 1997, p. 128).
Nos ensinamentos de Derani, poluidores são “todas aquelas pessoas integrantes de uma corrente consecutiva de poluidores – que contribuem com a poluição ambiental, pela utilização de materiais danosos ao meio ambiente como também pela sua produção ou que utilizam processos poluidores.” (1997, p. 165).
Nesta acepção, o Poder Público pode ter responsabilidade ambiental, uma vez que, quando ele tiver o dever de agir para evitar a ocorrência do dano e não o faz, tendo, portanto, uma conduta omissiva, a ele é imputada a responsabilidade civil ambiental, porque o Poder Público não pode esquivar-se de cumprir o preceito legal.
Assim como o Poder Público, a coletividade que abrange indivíduo, associações civis, pessoas jurídicas, grupos, etc, também pode ser responsabilizada pela omissão causadora do dano ambiental. Mas não será toda a coletividade responsável pelo dano, e sim “será poluidor por omissão o membro da coletividade diretamente responsável pelo dever positivo não cumprido.” (FIORILLO & RODRIGUES, 1997, p. 129). Ou seja, o poluidor é integrante da coletividade, devendo ser individualizado para que possa responder civilmente pelos danos lesivos ao meio ambiente.
Com efeito, a aplicação do Princípio do Poluidor-Pagador exige a definição de quem seja o poluidor, embora deva ser registrado que quando nos deparamos com sua aplicação prática, à imputação da responsabilidade ao poluidor é uma tarefa complexa, que ainda precisa ser aprofundada, especialmente no que tange à fixação de critérios que auxiliem na determinação, não do melhor pagador mas àquele que realmente irá concretizar as finalidades primordiais do PPP.
Para Aragão, o poluidor que deve pagar é aquele que tem o poder de controle sobre as condições que levam à ocorrência da poluição, podendo portanto preveni-las ou tomar precauções para evitar que ocorram (1997, p. 136).
Assim, a identificação do poluidor perpassa necessariamente pelo estabelecimento da relação de causalidade, ou seja, o liame existente entre a ação e a poluição que resulta desta. A proposta em questão traz à tona a discussão sobre a prescindibilidade da prova absoluta de causalidade em matéria de responsabilidade civil ambiental, o que significa dizer que, atualmente, o legislador e os operadores do direito começam a aceitar a probabilidade séria da causalidade e até mesmo a presunção em vez da certeza absoluta.
De fato, em razão de o direito brasileiro não dispor de meio específico para simplificar a atividade probatória do nexo causal do dano ao meio ambiente, tem-se discutido doutrinária e até jurisprudencialmente a necessidade de se adotar critério de probabilidade e a inversão do ônus da prova (LEITE, 2000).
Neste sentido, Cruz aponta que:

[…] não se abdica do liame da causalidade, elemento indispensável à obrigação de reparar o dano ambiental. Contudo, defende-se o abrandamento do nexo de causalidade, fugindo dos limites restritos de quase certeza. Ademais, entende-se que mister se faz a substituição deste pela probabilidade séria fundada na experiência e no apoio científico. (1996, p.218-219).

É oportuno destacar que a doutrina brasileira tem-se posicionado favoravelmente à inversão do ônus da prova, com fundamento no art. 6o, inciso VIII do Código do Consumidor, que permite a “facilitação da defesa dos seus direitos, inclusive com a inversão do ônus da prova a seu favor, no processo civil, quando, a critério do juiz, for verossímil a alegação ou quando ele hipossuficiente, segundo as regras ordinárias de experiência.”
Sampaio coaduna com este entendimento ao asseverar que: “O princípio que norteia a inversão do ônus da prova no Código do Consumidor é, em tese, aplicável à responsabilidade civil por danos ambientais, pois as razões que justificam a inversão do ônus da prova são comuns em ambos os casos.” (1998, p. 232).
Com efeito, a transferência do ônus da prova para o causador da degradação do meio ambiente e a facilitação da atividade probatória do dano implicariam atualização do instituto da responsabilidade, com vistas a tornar mais eficaz e ágil as demandas ambientais. Ademais, constituir-se-ia num mecanismo que traria segurança jurídica, no sentido de não deixar impunes os responsáveis pelas atividades lesivas ao meio ambiente, principalmente quando houver pluralidade de autores do dano ao meio ambiente.
No direito estrangeiro, podemos destacar a legislação alemã, que em relação à responsabilidade civil ambiental

[…] consagra já uma presunção de causalidade sempre que, segundo as circunstâncias do caso, uma instalação possa ter causado o dano considerado, tendo em conta o funcionamento da instalação, os equipamentos utilizados, a natureza concreta das substâncias utilizadas ou emitidas, os dados metereológicos, etc., mas sempre só no caso de acidente ou incidente nas instalações. A presunção da causalidade não se aplica quando a instalação funcionou normalmente, as regras impostas para o seu funcionamento foram respeitadas e não houve incidentes. O detentor da instalação pode ilidir a presunção, se provar que segundo os dados do caso, outra circunstância pode ter sido a causa do dano (VON BREITENSTEIN apud ARAGÃO, 1997, p. 138).

Não se pode refutar que a responsabilidade pelos danos ambientais pode ser atribuída a vários autores, que irão figurar no pólo passivo da relação processual. Por isso, a importância da definição do termo “poluidor” para que se possa determinar quem pode ser legitimado passivo da ação ambiental.
Pontua-se que quando houver pluralidade de autores do dano ambiental, vigora a responsabilidade solidária, conforme determinação expressa do art. 1.518, caput, do Código Civil, que dispõe: “Os bens do responsável pela ofensa ou violação do direito de outrem ficam sujeitos à reparação do dano causado; e se tiver mais de um autor a ofensa, todos responderão solidariamente pela reparação.” Assim, os “co-responsáveis podem utilizar a via regressiva para a distribuição do quinhão de responsabilidade.” (SEGUIN, 2000, p. 297).
É preciso destacar que a pluralidade de agentes poluidores dificulta a reparação do dano ambiental, considerando o fato de que a lesão ao meio ambiente pode resultar de várias fontes, dificultando e até impedindo a identificação exata do responsável (LEITE, 2000).
No mesmo sentido, o enfoque de Machado:
Além da existência do prejuízo, é necessário estabelecer-se a ligação entre a sua ocorrência e a fonte poluidora. Quando é somente um foco emissor não existe nenhuma dificuldade jurídica. Quando houver pluralidade de autores do dano ecológico, estabelecer-se o liame causal pode resultar mais difícil, mas não é tarefa impossível […]. (apud ALMEIDA, www.fdc.br/artigos).

Ora, é preciso destacar que a atividade que provocou a poluição pode ter sido causada por uma atividade de produção ou consumo. Convém, portanto, lembrar que o meio ambiente apresenta vantagens econômicas para os produtores, já que produz bens e serviços e também para os consumidores, à medida que estes recebem serviços e satisfações (ARAGÃO, 1997).
De acordo com o explanado anteriormente, se considerarmos que a poluição foi desencadeada por uma atividade produtiva, a produção pode voltar-se tanto para o consumo, quanto para o mercado. Na primeira hipótese teremos apenas o poluidor direto, ou seja, aquele causou de forma direta a poluição; já no segundo caso, verifica-se a existência de um poluidor direto e o poluidor indireto.
Resta-nos esclarecer, então, quem é o poluidor indireto nos casos em que são constatados danos ao meio ambiente e também qual a sua responsabilidade perante a legislação ambiental. Poluidor indireto pode ser entendido como aquele que se beneficia da atividade poluente, consumindo o produto que é proveniente de uma atividade considerada poluente, ou quem cria os elementos necessários para que a poluição ocorra, permitindo que o bem a ser consumido seja poluente (ARAGÃO, 1997).
Mas é claro que o consumidor não dispõe do meio mais apropriado para eliminar ou cessar a poluição, uma vez que esta é produzida precisamente pelo produtor que desenvolve uma atividade prejudicial ao meio ambiente, e que lucra com esta atividade. Com efeito, a poluição deve ser atacada na sua origem, adotando-se medidas de prevenção/precaução, o que não retira a obrigação do poluidor que deve pagar, isto é, aquele que proporciona as condições para o desencadeamento dos danos ao meio ambiente.
Na realidade, enquanto o consumidor praticamente não tem outra alternativa, para reduzir a poluição, senão deixar de consumir um determinado bem ou serviço, os produtores dispõem de soluções alternativas: podem utilizar técnicas de produção menos poluentes, mecanismos de controle da poluição, alterar a composição dos produtos, etc. (ARAGÃO, 1997, p. 136).
A imputação da responsabilidade pelos danos ao meio ambiente somente pode ser atribuída àquele que a lei determina que seja o poluidor, ou seja, de acordo com a Lei Federal número 6938/81, art. 3o, inciso IV, poluidor é a pessoa física, de direito privado, responsável direta ou indiretamente, por atividade causadora da degradação ambiental. Salienta-se, que a Lei Estadual número 11.520/00, no seu artigo 14, inciso LX, acolhe o conceito de poluidor adotado pela lei da política nacional do meio ambiente.
Milaré (ano), ao analisar a responsabilidade do consumidor-poluidor, em decorrência dos malefícios advindos da utilização dos recursos naturais por eles consumidos, cita como exemplo a erosão e a devastação florestal: enquanto esta se relaciona com um modelo de consumo que privilegia a utilização da madeira em grande escala, àquela é afetada pela aumento significativo dos consumidores de alimentos.
Essas considerações nos mostram que a responsabilidade do consumidor-poluidor ainda carece de um estudo mais aprofundado, para que se possam determinar os contornos da sua obrigação de reparar o bem ambiental lesado, ainda que de forma indireta. Desta forma, parece-nos certo que a utilização inadequada dos bens por parte dos consumidores, ou seja, o seu uso além dos limites fixados pela lei não pode ser desconsiderado pelos operadores do direito e nem pela legislação ambiental, sob pena de obstar a aplicação do Princípio do Poluidor-Pagador. Além do que, é imprescindível que a responsabilização pelos danos causados ao meio ambiente seja abarcada de forma ampla pela legislação, a fim de viabilizar a proteção integral do meio ambiente e a punição do poluidor, que seguramente não se restringe àquele que diretamente causou a poluição.
É necessário mencionar, ainda, a poluição provocada por vários poluidores, em que a responsabilidade pela reparação do bem ambiental lesado será de todos aqueles que contribuíram para o ato lesivo ao meio ambiente, devendo ser determinado o que cada um deverá pagar, conforme a respectiva contribuição para a degradação do meio ambiente. Assim, diversos sujeitos contribuem para o desenvolvimento da atividade poluidora, o que dificulta determinar a participação dos agentes poluidores, embora se possa afirmar que o poluidores que devem pagar são os que concorrem direta ou indiretamente para a concretização da poluição.
Considerando implicações da delimitação de quem é o “verdadeiro” poluidor, cabe-nos dizer que em alguns casos a poluição provocada por um único poluidor pode ser irrelevante para o meio ambiente, mas quando este ato for praticado por vários poluidores concomitantemente, a ação pode se constituir numa fonte altamente poluidora e igualmente prejudicial ao meio ambiente e também para o homem.
Ademais, a compreensão das celeumas que envolvem o Princípio do Poluidor-Pagador perpassam também pela análise dos seus princípios concretizadores, ou seja, o princípio da precaução. Estes princípios servem de parâmetro não apenas para o estabelecimento do que paga o poluidor, como também são um dos instrumentos que facilitam o controle da poluição e que criam as condições favoráveis para que a ação lesiva ao meio ambiente, provocadas por um ou vários poluidores, seja realmente evitada.

1.4 O que paga o poluidor

Pontua-se, num primeiro momento, que a determinação do que paga o poluidor, uma vez identificado, está diretamente associado ao processo produtivo, considerando o fato de que o desenvolvimento de atividades econômicas produz efeitos positivos e também negativos, que precisam ser amortizados, com o intuito de fazer com que a sociedade não suporte de forma onerosa os custos provenientes da poluição.
Assim, o custo que irá ser imputado ao causador da poluição não está limitado apenas ao valor monetário necessário para a completa reparação do bem ambiental lesado, pelo contrário, ele envolve também os custos relacionados à prevenção dos danos ambientais e à redução dos efeitos negativos da ação lesiva ao meio ambiente.
Convém explanar que dos poluidores são cobrados apenas os custos das medidas ambientais exigidas pela política publica de proteção ambiental, isto é, na medida dos objetivos públicos de qualidade ambiental (DERANI, 1997, p. 164). Isto implica em dizer que o custo que deverá ser suportado pelo poluidor depende da política ambiental adotada pela legislação do Estado, que pode priorizar a atuação preventiva, assim como estabelecer uma taxa para a prática de atividades danosas ao meio ambiente.
Com muita perspicácia assevera Derani:
Neste contexto emergem duas opções para a conservação do bem: ou deve o poluidor arcar com o emprego de instrumentos para a diminuição dos custos de substituição daquilo que causa a poluição; ou, por uma avaliação política, alivia-se o poluidor de tal encargo, devendo os prejudicados arcar com ele (sobretudo via atuação do Estado). Ocorre, então, uma subvenção do poluidor para que ele realize os investimentos necessários a fim de eliminar ou reduzir o dano ambiental. (1997, p. 163).

Efetivamente, a indicação do que deve pagar o poluidor, se identificarmos o Princípio do Poluidor-Pagador simplesmente com o da responsabilização, nos leva à conclusão que àquele suportará o quantum indenizatório a ser pago para os atingidos pela atividade poluente. Claro, que esta interpretação do PPP demonstra que é imposto aos poluidores os custos que estão previstos no aparato legal e da mesma forma na política ambiental consagrada por esta legislação. No entanto, um dos pontos centrais deste princípio é a sua finalidade preventiva, o que impõe ao poluidor o dever de suportar os valores necessários para indenizar as vítimas, para manter a qualidade ambiental em níveis aceitáveis e, principalmente, para concretizar sua atuação preventiva.

1.4.1 Custos imputados ao poluidor

Inicialmente, pode-se dizer que o problema da determinação em torno do que paga ao poluidor está diretamente associado aos custos que este deverá suportar, seja em decorrência da prática de uma atividade lesiva ao meio ambiente, seja porque está o mesmo obrigado a adotar medidas para evitar danos ambientais, especialmente quando for constatado que sua atividade oferece riscos para a manutenção da qualidade ambiental.
Desta forma, o Princípio do Poluidor-Pagador, como afirma Benjamin (ano, p. 228), apóia-se na teoria da compensação (paga quem provoca uma ação governamental, na medida do custo desta) e na teoria do valor (paga quem se beneficia com a poluição, na medida dos seus benefícios recebidos).
Como se percebe, a análise do referido princípio numa perspectiva ampla, revela a complexidade da consolidação dos fundamentos e objetivos deste princípio do direito ambiental, uma vez que a qualquer atividade produtiva gera efeitos positivos e/ou negativos que num primeiro plano devem ser suportados por aqueles que produziram o dano e com ele se beneficiaram de alguma forma. Assim, as externalidades produzidas precisam ser “amortizadas”, a priori, pelo causador da poluição, que é o responsável , então, pela redução e eliminação dos efeitos nocivos ao meio ambiente.
O poluidor, então, passa a ser o primeiro pagador, de modo que é obrigado, dessa forma, a integrar plenamente, no seu processo de decisão, o sinal econômico que constitui o conjunto dos custos ambientais (BENJAMIN, ano, p. 229).
Mas a internalização destes custos traz inerente uma série de efeitos negativos, ou seja, embora o poluidor seja responsabilizado por sua atuação poluidora, não dispiciendo lembrar que os custos sociais de sua atividade poluidora também refletem na vida dos consumidores, que são os usuários dos bens ambientais, embora estes não sejam responsáveis diretamente pelo foco de origem da atividade poluidora, geralmente atribuída aos produtores.
Fica claro, portanto, que o objetivo maior do Princípio do Poluidor-Pagador é fazer com que os agentes que originaram as externalidades assumam os custos impostos a outros agentes, produtores e/ou consumidores (COMUNE, 1992, p. 13). Nesta perspectiva, se preceitua que a externalização dos custos advindos da poluição e que não são contabilizados no processo produtivo, são abarcados pelo PPP, à medida que esses acabam por refletir no preço final dos produtos e também nos serviços, ocorrendo a internalização dos custos sociais da poluição.
É justamente a internalização dos custos sociais decorrentes da poluição o cerne da problemática ambiental, exigindo por parte do Estado uma atuação política, apoiada necessariamente por uma teoria econômica, para que sejam desenvolvidos os meios e instrumentos para a estruturação de uma política ambiental, adequada ao processo de prevenção, repressão e reparação dos danos ao meio ambiente.
Assim, é evidente que em sendo o poluidor perfeitamente identificado, a sociedade não pode ser demasiadamente onerada, a tal ponto de ser obrigada a arcar com a reparação do bem ambiental lesado e com os demais efeitos decorrentes da atividade poluidora. No entanto, não há como negar que o ônus econômico e ambiental dos danos ao meio ambiente são, ainda que indiretamente, suportados também pela sociedade, porque os custos são considerados na determinação do preço final dos produtos ou serviços, que serão adquiridos e usufruídos pelos consumidores.
Assevera Derani que:

[…] durante o processo produtivo, além do produto a ser comercializado, são produzidas externalidades negativas. São chamadas externalidades porque, embora resultantes da produção são recebidas pela coletividade, ao contrário do lucro, que é percebido pelo produtor privado. Daí a expressão privatiza-ção de lucros e socialização de perdas, quando identificadas as externali-dades negativas. Com a aplicação deste princípio procura-se corrigir este custo adicionado à sociedade, impondo-se sua internalização (1997 158).

A legislação ambiental impõe ao causador dos danos ao meio ambiente o dever de corrigir, recuperar e/ou eliminar os efeitos negativos para o ambiente, o que demonstra que o poluidor suporta teoricamente todos os custos que desta ação decorrem, assim como torna inviável a continuação da atividade enquanto as causas da poluição não forem sanadas.
Para Fonseca,

[…] foi desenvolvido o chamado Princípio Polluer-Payer (PPP), segundo o qual o dano ecológico deve ser ressarcido por quem dele se houver beneficiado, seja o próprio causador do dano ou o adquirente do produto para cuja fabricação foi provocado o dano. Este último, ao adquirir o produto, paga o valor acrescido do custo ambiental (1981, p. 146).

É perceptível que se de um lado a legislação impõe ao poluidor a responsabilidade pelos custos ambientais, de outro permite em determinadas situações que o consumidor do produto ou dos serviços venham arcar com parte deste ônus, ocorrendo o fenômeno da repercussão, ou seja, o custo ambiental é repassado para a sociedade.
Desta forma, torna-se evidente que o repasse dos custos ambientais para o consumidor final apresenta algumas desvantagens, como por exemplo, o elevado custo do produto final para aqueles que irão adquiri-lo. Mas a aplicação correta dos recursos provenientes desta repercussão representa um ganho significativo, não apenas para o meio ambiente como também ao homem, evitando uma maior elevação dos preços, a partir do controle da escassez dos recursos naturais (cf. SAMPAIO, 1983).
O custo ambiental abarca o quantum econômico necessário para a recuperação do bem ambiental lesado, que pode ser valorado economicamente, embora esta seja uma tarefa complexa e que não prescinde adoção de critérios a serem estabelecidos pela política ambiental que orienta as ações ambientais do governo e da sociedade. No entanto, a determinação do que paga o poluidor e o que é abarcado pelos custos da poluição inclui outros fatores que devem ser considerados na cobrança do encargo econômico da poluição.
Conforme o entendimento de Fonseca,

[…] a sanção correspondente às atividades antijurídicas deve permitir não só a regeneração ambiental, como também atuar como forma desalentadora de sua ocorrência. Estabelece também o referido autor que os instrumentos de cobrança do custo ambiental podem ser classificados em quatro categorias: a) polícia administrativa: b) a imposição tributária; c) a concessão de incentivos fiscais; d) via judicial. (1983, p. 146).

Não obstante o estabelecimento de regras para a recuperação do bem ambiental atingido pela poluição e o pagamento dos custos ambientais por parte do poluidor, não autoriza a atividade poluente e nem ignora a imprescindibilidade de uma política ambiental voltada para a prevenção/precaução dos danos ambientais. Nota-se, que a par da Constituição Brasileira de 1988, e dos princípios nela expressos, é transparente que os dispositivos constitucionais prevêem tanto a prevenção quanto a reparação, permitindo uma segurança jurídica para os atingidos pela poluição e uma completa reparação, quando constatada a degradação do meio ambiente.
Coaduna com esta posição Machado, que assevera:

[…] há sempre o perigo de se contornar a maneira de se reparar o dano estabelecendo-se uma liceidade para o ato poluidor, como se alguém pudesse afirmar “poluo mas pago”. Ora, o princípio do poluidor pagador que está sendo introduzido no direito internacional não visa contestar a poluição, mas evitar que o dano ecológico fique sem reparação (ano, p. 192).

Afirma Mateo que os objetivos do Direito Ambiental são fundamentalmente preventivos. Sua atuação preventiva está voltada para o momento anterior à da consumação do dano – o do mero risco. Ou seja, diante da pouca valia da simples reparação, sempre incerta e, quando possível, excessivamente onerosa, a prevenção é a melhor, quando não a única, solução. De fato, não podem humanidade e o próprio Direito contentar-se em reparar e reprimir o dano ambiental (ano, p. 85-86).
O prejuízo a ser reparado exige que o bem ambiental seja quantificado economicamente porque a partir da constatação dos danos ao meio ambiente é que será desencadeado o processo de responsabilidade ambiental. Além do mais, é fundamental para que se posa auferir a extensão dos efeitos negativos (resultantes da atividade lesiva) para a sociedade que os recursos naturais, tenham uma expressão econômica, ainda que esta temática jurídica demande o desenvolvimento de um estudo teórico-prático mais aprofundado.
À título de exemplificação, no tocante ao estabelecimento de critérios para avaliação dos danos ambientais devem ser citados os apresentados por Jones, que propõe os seguintes elementos:

1) O custo de restauração, reabilitação, reposição de recursos naturais ou aquisição do seu equivalente.
2) A redução do valor desses recursos naturais, partindo do patamar de antes do sinistro.
3) O custo razoável de avaliação de danos. (apud TESSLER, 2001, p. 176).

Com efeito, a aplicação do PPP tem como finalidade no campo econômico a internalização dos custos sociais da poluição, ao mesmo tempo em que “no plano jurídico e político, o princípio atenua a injustiça social resultante de encargos à sociedade (efeitos secundários) não incluídos nas decisões de produção ou de consumo por parte dos agentes poluidores (CANOTILHO, 1994, p. 43).
Ao se discutir os custos imputados ao poluidor, que não estão restritos àqueles necessários para recomposição do bem ambiental lesado, faz se necessário frisar que o encargo financeiro decorrente da atividade poluente não é suportado na sua totalidade pelo causador originário da degradação ao meio ambiente, principalmente porque os consumidores também acabam por suportar, mesmo que indiretamente, os custos da poluição.
Segundo Rehbinder,

[…] na prática política, aplica-se no sentido ilimitado de que o poluidor suporta apenas os custos de controle da poluição que surgem devido à regulamentação ambiental: não há intenção de uma completa internalização de custo. Além disso, o princípio não é absoluto. Com freqüência aplica-se o princípio do encargo comum, o que significa que o público suporta os custos da proteção do ambiente. (apud AMARAL, 1994, p. 257).

Nesta perspectiva, o princípio do ônus social se constitui num contraponto ao Princípio do Poluidor-Pagador, já que esse determina que os custos relativos à implementação das políticas ambientais e da redução ou eliminação dos efeitos oriundos da degradação do meio ambiente devem ser suportados pela sociedade, e também pelo Estado. Na verdade, como alerta Rebhinder, os custos da proteção ambiental são suportados “pelos pagadores dos impostos, sem se observar a utilidade relativa que cada indivíduo retiraria.” (apud DERANI, 1997, p. 160).
Não é demasiado citar Moussis:

O poluidor assim definido, tem de suportar: as despesas correspondentes às medidas necessárias para lutar contra a poluição (investimentos em equipamentos e material, antipoluição, aplicação de processos novos, despesas de funcionamento de instalações antipoluição), incluindo as medidas que vão além das normas impostas pelos poderes públicos […].

Os encargos, cujo objeto é incitar o poluidor a tomar, ele próprio, pelo custo mínimo medidas necessárias para reduzir a poluição da qual é autor (função de incitação) ou obrigá-lo a suportar sua quota-parte das despesas das medidas coletivas de depuração (função redistribuição), caso em que o momento global do ônus deve ser igual à soma dos encargos colectivos de eliminação dos prejuízos. (1985, p. 297-8).

Pelo que se pode concluir, o poluidor é obrigado a arcar com os custos das medidas de precaução, que devem ser adotadas nas atividades que são consideradas potencialmente poluidoras pela natureza que apresentam e por oferecerem riscos maiores ao meio ambiente, prescindindo, portanto, da absoluta certeza científica. No entanto, ela se reveste da previsibilidade e pode acarretar a sustação temporária e até mesmo definitiva da atividade poluidora em potencial.
Da mesma forma, o poluidor deve suportar os custos da prevenção, ou seja, quando já existem provas científicas a respeito dos efeitos negativos de uma determinada atividade, presentes os elementos da responsabilidade civil ambiental, é atribuído ao poluidor o dever se arcar com os custos das despesas indispensáveis para a reparação do dano ao meio ambiente assim como para a manutenção da qualidade ambiental.

Em suma o que o poluidor deve pagar são os custos das medidas necessárias para se conformar com os padrões de qualidade do ambiente vigentes, em função da actividade que desenvolve e da poluição que gera. Na verdade, quanto mais próximo estiver do limiar da admissibilidade, tal como ele for definido pelos poderes públicos, menores serão as necessidades de prevenção, e menos terá que pagar, isto é, os pagamentos são inversamente proporcionais, entre outros fatores, à quantidade e gravidade de poluição que gera. (ARAGÃO, 1997, p. 159).

A aplicação do Princípio do Poluidor-Pagador impõe ao poluidor a obrigação também de suportar os custos administrativos, que referem-se aos custos necessários para a implementação das medidas de proteção do ambiente, englobando o planejamento, a execução e o controle da aplicação das medidas ambientais, seja de precaução, prevenção ou reparação.
Relevante aduzir o que assevera Aragão (1997, p. 161),

É, com efeito, mais justo que sejam os geradores ou beneficiários da poluição a suportar os custos administrativos da proteção do ambiente, do que sejam os contribuintes, muitas vezes eles próprios vítimas inocentes da poluição, a suportar através de impostos, mais esse encargo.

Cabe ressaltar que em algumas situações, especialmente naquelas em que os poluidores não são identificados, transfere-se para o Estado a responsabilidade pela implementação das medidas de proteção e/ou reparação dos danos ambientais, pois o meio ambiente é um direito difuso, que tanto o Estado quanto os particulares têm a obrigação de preservá-lo.
Mas a intervenção do Estado não pode implicar na violação dos preceitos do princípio do poluidor-pagador, se constituindo numa forma dos poluidores isentarem-se de suas responsabilidades. Pelo contrário, a atuação do Estado deve ser financiada pelos poluidores, porque estes, a priori, são os responsáveis pelos custos das medidas públicas, o que não retira a possibilidade do Estado executá-las e nem de desenvolver atividade estatais típica, como por exemplo, a educação ambiental.
Justifica-se, desta forma, que a estatuição do que paga o poluidor ou o que deveria pagar, encontra seus fundamentos em certos parâmetros que devem ser observados, para permitir que se faça a quantificação econômica dos custos que envolvem a reparação do dano causado ao meio ambiente. Estes não estão restritos somente ao quantum dependido para recuperação do bem ambiental danificado, mas também abarca os custos de prevenção, precaução, reparação e de medidas públicas, estando perfeitamente em consonância com os preceitos constitucionais referentes à proteção ambiental.

1.5 Exceções ao Princípio do Poluidor-Pagador

De início é mister pontuar que as divergências em torno do referido princípio perpassam também pela discussão da admissibilidade de exceções à aplicação deste princípio. Assim, o PPP, justamente pelo fato de ser um princípio orientador, não tem aplicação absoluta, devendo ter uma margem de flexibilidade, o que não induz que se deva tolerar a poluição e eximir os poluidores de suas responsabilidades: civil, administrativa e penal.
Não se deve esquecer como assevera Groisman que “contaminar tem, pois, um custo social, e evitar a contaminação também tem.” (apud ARAGÃO, 1997, p. 195). Além do mais, uma política ambiental deve ser observada sob diversos ângulos, porque ao mesmo tempo que visa a manutenção da qualidade ambiental, traz à tona efeitos nem sempre positivos, como por exemplo, o desemprego, aumento de preços.
Apesar das posições contrárias às exceções do PPP, o estudo dos diversos aspectos que envolvem este princípio conduz à admissibilidade das exceções que, de acordo com Aragão (1997), se constituem naqueles casos em que o poluidor deveria pagar, mas não o faz, e quando poluidor paga e recebe .
No primeiro caso, ocorre quando há omissão da aplicação do Princípio do Poluidor-Pagador, assumindo o Estado a responsabilidade que deveria ser atribuída ao poluidor ou, muitas vezes, não são adotadas nenhum tipo de medidas de proteção ambiental, resultantes de uma. Como exemplo podemos citar: “se os poderes públicos não estabelecem limites máximos de emissão de certas substâncias poluentes, ou então se estabelecem expressamente que certos poluidores não pagam, ou por fim, se isentam os poluidores de encargos fiscais.” (ARAGÃO, 1997, p. 202).
Em relação aos casos em que o poluidor paga, mas recebe, explicita os subsídios ou os auxílios financeiros concedidos aos poluidores, com o intuito de fazer com que cumpram efetivamente com suas obrigações e/ou desestimulem a ocorrência de atividades poluidoras. Essa forma de excepcionar a aplicação do Princípio do Poluidor-Pagador pode ocasionar a prevalência dos interesses econômicos em detrimento aos sociais, no que conduziria a uma política ambiental ineficaz.
Para Martin:

Pagar a uma pessoa para que ela deixe de causar um dano é seguramente afirmar que a priori ela é titular de um direito de prejudicar logo, a aplicação do princípio “quem depura” recebe resulta na confirmação da existência de um direito de lesar, reconhecido aos poluidores. Uma tal situação redundaria na compra do direito de poluir (apud ARAGÃO, 1997, p. 203).
Mas apesar da aceitação das exceções do PPP, é perceptível que as mesmas devem sofrer limitações, principalmente porque em última análise conduzem à inexistência de uma política ambiental de proteção, conduzindo ao dumping ecológico. Este se concretiza quando um país se especializa na produção dos produtos ambiente-intensivos, calcado na degradação dos recursos naturais, sendo uma ação ilícita, que permite um preço baixo dos referidos produtos, em razão da omissão do Estado.
Segundo Kolm, deve-se estar atento ao fato de que

[…] algumas empresas poluidoras vão tentar provar ao Estado que, se não forem auxiliadas, será inevitável o encerramento e o despedimento dos trabalhadores. Neste caso é necessário averiguar se esta atitude dos empresários é bluff para tentar evitar os pagamentos e a empresa na realidade não encerra, ou se é verdade que está sujeita a encerrar. Neste ponto, duas coisas podem acontecer: ou, feitas todas as contas, é preferível que feche, ou então socialmente, impõe-se que se mantenha em actividade. Em função da conclusão, assim se aplicam ou não as exceções ao PPP. (apud ARAGÃO, 1997, p. 206).

Por fim, é imprescindível que se diga que a adoção das exceções do Princípio do Poluidor-Pagador precisa estar em consonância com princípio da razoabilidade, sujeitos a um controle pelas autoridades competentes, para que aquelas não venham representar a falta de uma política ambiental de proteção. Ressalta-se, que as medidas de proteção são orientadas pelo PPP e pelos princípios da prevenção e precaução, que significam, em última análise, o suporte para a concretização do conteúdo normativo do princípio ora em análise.

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Autora:
Silvana Colombo, advogada, especialista em Direito ambiental pela ULBRA RS e mestranda em direito Ambiental pela UCS

Sumário
1 ASPECTOS CONCEITUAIS DO PRINCÍPIO DO POLUIDOR-PAGADOR
1.1 Conteúdo normativo do Princípio do Poluidor-Pagador
1.2 Fundamentos efetivos do Princípio do Poluidor-Pagador
1.3 definição do termo poluidor
1.4 O que paga o poluidor
2.4.1 Custos imputados ao poluidor
1.5 Exceções ao Poluidor-Pagador

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