Beira-Mar renuncia ao cargo

“O que ocorre, numa analogia pragmática, é o mesmo que Fernando Beira-Mar resolver renunciar à condição de traficante…”

Nada melhor para esclarecer a veracidade de acusações do que ir a fundo e tirar o caso a limpo. Pelo menos esta é a lógica na cabeça da maioria dos pensantes de plantão. Em Brasília, no entanto, a coisa é diferente.

A presunção dos atores é tão grande que eles se imaginam não só acima das denúncias como também acima das investigações.

Sem exceções, os acusados que renunciaram até agora, de Valdemar da Costa Neto a Severino Cavalcanti passando pelo Bispo Rodrigues, bateram o pé na afirmação de sua inocência, porém preferiram cair na estrada a ter os fatos esmiuçados pelo Conselho de Ética da casa.

Os que ainda não o fizeram, com exceção de Roberto Jéfferson, buscam no Supremo o direito de defesa que julgam cerceado e a peso de liminar protelam os fatos.

Apesar da indignação que sentem pelo fato do processo ali não exigir a contundência das provas como seria no judiciário, sabem eles que o juízo político é que pesa, e reforçado pela baixa moral da classe atualmente, resulta num jogo de cartas marcadas. A falta de cartesianismo no processo de investigação do legislativo não o faz menos oficial e, portanto, merece o respeito de todos. A crença de que persuadirão novamente seus eleitores com os artifícios que conhecemos é que faz com que tais homens públicos desprezem o julgamento da Câmara e elejam como foro a “opinião pública”.

O grande problema disto é o fato do corporativo Regimento da Câmara permitir que os acusados de infração optem por serem julgados num tribunal em que podem pesar elementos como dinheiro, mentira e paternalismos. O que ocorre, numa analogia pragmática, é o mesmo que Fernando Beira-Mar resolver renunciar à condição de traficante e com isso se livrar do julgamento e das penas do processo em andamento, podendo ser julgado apenas em nova condição e outros autos.

No caso dos parlamentares ainda é pior, porque podem retornar ao poder por conta do poder já acumulado e interferir nos resultados do julgamento posterior com elementos como imunidade parlamentar e tráfico de influências, por exemplo. A conclusão a que se chega é que afirmações como a de Charles de Gaulle de que o Brasil não é um país sério, apesar de nos irritar, está coberta de razão.

Ou alguém vai aceitar como sério o posicionamento de uma pessoa de responsabilidade pública que afirma incisivamente sua inocência no momento em que toma uma atitude equivalente a uma confissão contrária.

João Carlos Marchezan*
Jornalista

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado.


Você está prestes a ser direcionado à página
Deseja realmente prosseguir?
Atendimento