Brasil deve e pode prestar serviços ambientais no exterior

por Flavio José de Souza Brando

O Brasil pode gerir grande parte de seu passivo financeiro internacional prestando serviços ambientais à comunidade mundial e desenvolvendo seu agronegócio em bases saudáveis. O mundo se globalizou, bem ou mal, inclusive no tema aquecimento por emissão de gases do efeito estufa, que vão para a atmosfera geral.

Os países desenvolvidos foram e são os maiores responsáveis pela catástrofe, com sua industrialização desenfreada e irresponsável através do tempo. Cortaram suas florestas, mataram seus índios, criaram comida nociva, poluíram o mundo e agora, alarmados com o futuro deste simpático planeta, exigem que o hemisfério sul conserve suas florestas, a água, a biodiversidade. Nada a opor, por ética ou pragmatismo, mas vão ter que pagar a conta e caro.

A República Federativa do Brasil detém ativos ambientais únicos, públicos e privados, cujo valor precisa ser reconhecido e pago.

A crescente conscientização do problema levou a iniciativas como o Protocolo de Kyoto, o mais conhecido, mas certamente não exclusivo, pois existem outras em especial na Comunidade Européia. Alguns estados americanos também já se movimentam, independentemente do governo federal em Washington, onde a administração Bush se nega a aderir aos apelos mundiais. Vários estados americanos estão processando a União americana por não aderir aos tratados internacionais. Seja como for, uma reviravolta política na eleição americana neste novembro de 2.004 poderá significar um passo importante na direção do estímulo a práticas saudáveis. A Rússia continua leiloando sua adesão a quem oferecer o melhor negócio para seus interesses imensos e particulares.

Todas as iniciativas baseiam-se na exigência de os países e empresas do primeiro mundo diminuírem obrigatória e paulatinamente sua emissão de gases, o que pode ser feito pela mudança de processos e práticas industriais ou pela aquisição de certificados de investimento em projetos “verdes”, mesmo fora de sua jurisdição, o que normalmente será mais barato.

Os instrumentos legais e financeiros são papéis ou títulos de projetos limpos, sejam eles reflorestamento, mudança de matriz energética (substituição de carvão mineral por vegetal, p. ex.) ou captação de gases em aterros sanitários.

Existe sim resposta para a ausência hoje de legislação clara e definitiva: quando alguém começou a comprar petróleo na região da Arábia, não existiam nem o país Arábia Saudita, petrodutos, petroleiros, Bolsa em Londres, postos de gasolina, etc, mas grandes empresas (públicas e privadas) nasceram desta iniciativa. Por mais que os burocratas não acreditem, muitos negócios acontecem simplesmente porque fazem sentido a gente com visão, trabalho e talento. Marco Polo não teria ido ao Oriente se dependesse de marcos regulatórios definitivos.

Um grande tema, ainda razoavelmente polêmico, e muito importante para nós, é a elegibilidade de projetos de preservação florestal pura, ou desmatamento evitado.

No mundo real, um preciosismo lamentável: se o desmatamento evitado não for premiado, parabéns ao madeireiro ilegal que vai faturar 2 vezes (ao cortar e vender madeira ilegal e depois ao receber incentivos para reflorestar) e pêsames ao “idiota” que teve o ideal ou incompetência de preservar.

Várias correntes governamentais, políticos e ONGs também se opõem à concessão de incentivos ao desmatamento evitado, alegando razões de “segurança nacional” (o mundo, a CIA estariam comprando a Amazônia!).

Pergunta-se se a exportação de minérios legitimamente brasileiros, pela Vale do Rio Doce provoca alguma desnacionalização ou feriu a “segurança nacional”?.

Este pensamento medieval sobrevive dos “parques de papel” criados e existentes somente no Diário Oficial e ambientes refrigerados da burocracia confortavelmente instalada em Brasília.

Lá no mato, não existe dinheiro para pagar guardas florestais ou indenizar os proprietários legítimos expropriados.

Parte do enorme fluxo de bilhões de dólares advindo dos serviços ambientais pode ser utilizado para o deslocamento e manutenção de tropas para nossas fronteiras, aí sim garantindo-se uma verdadeira segurança nacional contra guerrilheiros, traficantes de drogas e “missionários” de estranhas igrejas.

O Brasil está dando uma lição ao mundo com sua produtividade e qualidade de soja, suco de laranja e carne. A burocracia e o discurso não podem continuar criando obstáculos à valorização das riquezas nacionais, públicas e privadas, que não se opõem nem excluem mutuamente. O país é rico, só falta mandar a conta para os gringos, de uma forma ordenada, inteligente e sustentável.

Revista Consultor Jurídico, 11 de Março de 2004

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