Cenário atual inspira cuidados sobre contribuição sindical

Autores: Jorge Gonzaga Matsumoto e Christiana Fontenelle Mac Dowell (*)

 

Antes da vigência da Lei 13.467/2017, apelidada de reforma trabalhista, o recolhimento da contribuição sindical era compulsório tanto para empregados quanto para empregadores. Ocorre que, com as alterações promovidas pela citada lei nos artigos 578, 579, 582, 583, 587, e 611-B, inciso XXVI da CLT, essas contribuições passaram a ser facultativas, ou seja, os empregados e empregadores têm o direito, a faculdade, de concordar (ou não) com o seu recolhimento.

Em relação a contribuição de categoria profissional (trabalhadores), importante registrar que o artigo 611-B da Lei 13.467/2017 que lista o que não pode ser negociado coletivamente, inclui textualmente no inciso XXVI, ao tratar da liberdade de associação sindical, o direito de o empregado não sofrer, sem sua expressa e prévia anuência, qualquer cobrança ou desconto salarial estabelecidos em convenção coletiva ou acordo coletivo de trabalho.

Desta forma, quanto à contribuição sindical dos empregados, seguramente, há fortes argumentos legais no sentido de que não poderão ser objeto de negociação coletiva ou de cobrança sem autorização.

Neste panorama legal, a princípio, os empregados sequer precisariam apresentar carta de oposição ao sindicato quanto ao recolhimento da contribuição sindical. Na verdade, somente quando cobrados e se desejassem contribuir para o sindicato é que teriam que se manifestar positivamente, valendo o silêncio como negativa.

Ademais, a legalidade da imposição de recolhimento de contribuições sindicais pelo sindicato após a reforma trabalhista deve ser analisada à luz dos artigos 462 e 611-B, VII da CLT e 7º, X da Constituição Federal. A simples leitura dos artigos acima deixa claro que as cobranças que os sindicatos pretendem são ilegais, mesmo se prevista em norma coletiva e aprovadas por assembleia.

O artigo 462 da CLT proíbe qualquer desconto nos salários do empregado, salvo quando este resultar de adiantamentos, de dispositivos de lei ou de contrato coletivo. Entretanto, a previsão em norma coletiva de taxa ou contribuição sindical a ser descontada do próprio empregado é ilegal, na medida em que o artigo 611-B incisos VII e XXVI da CLT estabelecem respectivamente: (i) a proteção do salário na forma da lei, constituindo crime sua retenção dolosa (ii) proíbe a cobrança ou desconto salarial estabelecidos em convenção coletiva ou acordo coletivo de trabalho.

Não fosse só isso, a própria Constituição Federal no artigo 7º, X protege o salário proibindo a sua retenção.

Apesar de todo o exposto, o cenário atual inspira cuidados. Não é segredo que os sindicatos e o judiciário vêm travando verdadeira guerra política em face das alterações implementadas pela reforma trabalhista e, por óbvio, que a retirada do caráter compulsório das contribuições sindicais está no topo da lista dos assuntos polêmicos, contando, inclusive, com 14 ações diretas de inconstitucionalidade em trâmite no Supremo Tribunal Federal ajuizadas contra o tema.

Além das referidas ações diretas de inconstitucionalidade, os sindicatos têm agido regionalmente e ajuizado ações civis públicas no âmbito da jurisdição em que atuam, nas quais requerem, via de regra, liminarmente, que as empresas sejam obrigadas a descontar o valor das contribuições de seus empregados e repassá-las para as respectivas entidades.

Em todas essas ações os argumentos principais dos autores, de forma resumida, são: (i) suposta exigência de lei complementar para a extinção da contribuição sindical face o artigo 146, inciso III, alínea “a” da CF, o que tornaria as alterações da Lei 13.467/2017 inconstitucionais; (ii) que a facultatividade do pagamento da contribuição sindical provocará o exaurimento financeiro dos sindicatos, prejudicando a defesa dos empregados

Ocorre que estes argumentos não se sustentam legalmente já que, também de modo resumido: (i) não se exige lei complementar para a instituição da contribuição sindical, apenas para aquelas decorrentes de outras fontes de custeio, conforme artigo 195, parágrafo 4º da CF. Não sendo necessária lei complementar para sua instituição, evidentemente não há necessidade de lei complementar para extingui-la; (ii) as entidades sindicais possuem outras fontes de custeio, como: (a) as contribuições dos associados/ filiados ao sindicato (CLT, artigo 548, alínea b); (b) as contribuições fixada pela assembleia geral para o custeio do sistema confederativo da representação sindical (CF, artigo 8° IV) e a taxa assistencial; (c) artigo 548, c da CLT os bens e valores adquiridos e as rendas produzidas; (d) artigo 548 d as doações e legados; (e) artigo 548, e as multas e, também, a assistência jurídica aos empregados não necessariamente está vinculada à atuação dos sindicatos, podendo se dar pela atuação da advocacia ou da própria defensoria pública.

A Anamatra, no entanto, por meio do Enunciado 38, se posicionou de forma contrária à reforma trabalhista neste ponto, mas certamente este posicionamento não tem força vinculante ou vem sendo seguido por todos os magistrados. De todo o modo, ele é um forte indicativo de que a maioria é contra o fato de que, hoje, o recolhimento da contribuição sindical é facultativo.

O Ministério do Trabalho e Emprego, por sua vez, no dia 16/3/2018, emitiu a Nota Técnica 02/2018/GAB/SRT apresentando o entendimento de que as assembleias coletivas podem fixar que todos os membros da categoria devem realizar o recolhimento sindical, independentemente da determinação legal de que este somente poderá ocorrer com a anuência expressa do trabalhador.

O que se vê, naturalmente, é que o MTE se coloca de modo contrário ao que diz a lei. Entretanto, o Supremo Tribunal Federal por meio da Súmula Vinculante 40 sedimentou entendimento de que as contribuições sindicais em instrumentos coletivos somente criam obrigação aos associados aos sindicatos e o artigo 103-A da CF/88 é claro ao dizer que as súmulas vinculantes criam obrigações à Administração Pública. Deste modo, sem dúvidas há argumentos para se sustentar que essa nota técnica do MTE é inconstitucional.

O fato é que, até que o STF se pronuncie sobre o tema, o entendimento não está sedimentado, tendo o judiciário proferido decisões liminares tanto favoráveis à constitucionalidade da lei quanto contrárias, não tendo sido proferida decisão em qualquer das ações que tenha aplicação erga omnes, ou seja, para empresas que não as que fazem parte da lide específica.

Um bom exemplo foi a decisão proferida pelo TRT da 6ª Região, que acolheu o pedido liminar requerido em sede de mandado de segurança pela empresa Riachuelo, acabando por cassar a decisão, também liminar, proferida pelo juízo da 3ª Vara do Trabalho de Jaboatão dos Guararapes, a qual havia determinado que a empresa recolhesse a contribuição sindical de todos os seus empregados e a repassasse para o Sindicato dos Comerciários.

O TST, por sua vez, também em recente decisão proferida nos autos da Ação Correcional 1000136-28. 2018. 5.00.0000, suspendeu liminar que obrigava as empresas Aliança Navegação e Logística e Hamburg Süd Brasil a recolher a contribuição sindical de empregados. Esta decisão, certamente, será um importante divisor de águas para a jurisprudência atual que está dividida, pois poderá quebrar uma sequência de liminares que permitiam a cobrança.

Neste cenário, de grande insegurança jurídica diante do jogo político das partes envolvidas, importante o empregador se mantenha do lado do texto da lei vigente e se posicione a favor da reforma trabalhista e da constitucionalidade das alterações por ela implementada.

 

 

 

 

Autores: Jorge Gonzaga Matsumoto  é sócio do Bichara Advogados e mestre e em Direito Internacional do Trabalho pela Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo.

Christiana Fontenelle Mac Dowell é advogada sênior do Bichara Advogados.


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