Por Caio Moyses de Lima, Decio Gabriel Gimenez, Paulo Cezar Neves Junior e Ricardo Geraldo Rezende Silveira
A Constituição Federal de 1988, que aniversariou no último dia 5 de outubro, promoveu importantes transformações no Poder Judiciário brasileiro, dentre as quais a criação do Superior Tribunal de Justiça, com a função precípua de uniformizar a interpretação da legislação federal em nosso país, como última instância das discussões envolvendo leis infraconstitucionais, tanto para a Justiça Federal quanto para a Justiça Estadual. É também competência da Corte julgar criminalmente os governadores dos estados e do Distrito Federal, bem como os desembargadores estaduais e federais e os membros do Ministério Público da União que oficiem perante tribunais, decidir os mandados de segurança e os Habeas Corpus contra atos de Ministro de Estado, e dirimir os conflitos de competência entre os tribunais sob sua jurisdição.
O STJ desempenha, ademais, importantes funções administrativas. É a Corte Superior que regulamenta os cursos oficiais para ingresso e promoção de magistrados em âmbito nacional (por meio da Enfam – Escola Nacional de Formação e Aperfeiçoamento de Magistrados) e que supervisiona a administração e o orçamento da Justiça Federal nas suas cinco regiões, como órgão central do sistema. Além de exercer função correicional sobre os órgãos judiciais que lhe são subordinados. Os Ministros do STJ têm, ainda, participação relevante na Justiça Eleitoral, pois indicam, entre seus pares, dois membros efetivos e dois substitutos para o Tribunal Superior Eleitoral (TSE), incluindo o seu corregedor-geral.
A enorme responsabilidade atribuída ao STJ pela Carta Constitucional, que sem dúvida alguma justifica o famoso epíteto de “Tribunal da Cidadania”, evidencia a necessidade de que a Corte Superior seja composta por ministros que representem os mais diversos segmentos da sociedade brasileira, congregando, em sua composição, as diferentes carreiras jurídicas. Afinal, como já disse o constitucionalista José Afonso da Silva, “a interpretação tem um aspecto objetivo que se refere ao objeto a ser interpretado e um aspecto subjetivo que se refere às qualificações e à ideologia do intérprete, porque este não é neutro no processo interpretativo, porque nele participa com a carga de experiência, de conhecimentos, cultura e ideologia que informam sua formação jurídica” (cf. “Interpretação da Constituição e Democracia”, in “Direito Constitucional Contemporâneo – Estudos em Homenagem ao Professor Paulo Bonavides”. Belo Horizonte: Ed. Del Rey, 2005, p. 439).
Por isso é que a Constituição Federal de 1988 determinou que a Corte Superior tivesse composição mista: um terço dos seus 33 ministros deve provir dos Tribunais Regionais Federais, um terço dos Tribunais de Justiça dos Estados e um terço, em partes iguais, da advocacia e do Ministério Público. Além dessa específica divisão, a forma federativa do Estado brasileiro recomenda que se mantenha um justo equilíbrio, no interior de cada um dos segmentos que compõem o STJ, entre as diversas regiões do Brasil, de modo a conferir à Corte Superior representatividade condizente com sua importante missão constitucional. É bastante salutar, por isso, que os cargos destinados à magistratura federal sejam ocupados por Juízes oriundos de todas as cinco regiões que integram a Justiça Federal.
Essa não é, contudo, a realidade atual. Embora o Tribunal Regional Federal da 3ª. Região englobe dois importantes Estados da Federação (São Paulo e Mato Grosso do Sul) e detenha jurisdição sobre uma grande parcela da população brasileira, sendo responsável por um expressivo volume de processos (é o tribunal que mais recebe casos novos anualmente e o que possui em tramitação mais de 40% dos processos em andamento no segundo grau de toda a Justiça Federal, conforme o relatório “Justiça em Números 2010”, publicado pelo Conselho Nacional de Justiça no site http://www.cnj.jus.br), não há mais no STJ, desde 22 de fevereiro de 2007, quando ocorreu a aposentadoria do Min. Jorge Tadeo Flaquer Scartezzini, um só ministro oriundo da Justiça Federal da 3.ª Região.
Para se ter uma ideia, atualmente há dois Ministros oriundos do Tribunal Regional Federal da 1.ª Região, dois da 2.ª Região, três da 4.ª Região e três da 5.ª Região. Nenhum oriundo do Tribunal Regional Federal da 3.ª Região. Em outras palavras, um dos Tribunais Regionais Federais mais representativos do Brasil não tem atualmente representante nenhum no STJ.
Mas há, contudo, uma valiosa oportunidade para se corrigir essa distorção representativa. No último dia 29 de outubro, o Pleno do STJ indicou três desembargadores federais para ocupar a vaga do Ministro aposentado Aldir Passarinho Junior, dentre os quais se inclui a respeitada e experiente Desembargadora Federal da 3.ª Região, Dra. Suzana Camargo. Cabe agora à Presidente da República, Dilma Rousseff, aproveitar essa oportunidade para restabelecer na Corte Superior o equilíbrio rompido em 2007, porque é dela a atribuição de nomear, para posterior aprovação pelo Senado Federal, o Desembargador que irá ocupar o cargo vago.
As qualidades de todos os componentes da lista apresentada pelo STJ são inegáveis. Porém, não se pode perder de vista a necessidade de manter o equilíbrio federativo tão necessário para sustentar a legitimidade das decisões do Tribunal da Cidadania.
Caio Moyses de Lima é diretor de defesa de prerrogativas e ética da Ajufesp.
Decio Gabriel Gimenez é diretor financeiro e de patrimônio Ajufesp.
Paulo Cezar Neves Junior é vice-presidente da Ajufesp.
Ricardo Geraldo Rezende Silveira é juiz federal e presidente da Ajufesp (Associação dos Juízes Federais de São Paulo e Mato Grosso do Sul).