A evolução relativamente recente dos mecanismos de proteção dos interesses difusos colocou em relevo o papel do Ministério Público como curador do patrimônio ambiental da coletividade.
Entretanto, se os mecanismos judiciais que permitem a atuação ministerial na área vêm se mostrando eficazes para a prevenção de danos iminentes, o mesmo não se pode convictamente afirmar sobre sua adequabilidade para recuperar o meio ambiente degradado.
Têm-se buscado formas alternativas de composição de conflitos, que assegurem, de maneira ágil e pronta, a recomposição do estado anterior, evitando submeter o interesse ambiental aos riscos e à demora de uma batalha judicial de fim duvidoso. Um caso recente, conduzido pelo Ministério Público Federal em Minas Gerais, ilustra essa nova técnica.
Em meados de junho, a procuradora da República recebeu a incumbência de apurar e adotar medidas necessárias à reparação de suposta lesão que teria sido praticada pela Fiat Automóveis.
Tratava-se de representação encaminhada pela Secretaria do Meio Ambiente do Estado de São Paulo, apontando a responsabilidade daquela empresa pela produção de aproximadamente 430 mil veículos em desconformidade com a legislação federal que regula a emissão de poluentes.
Eram dois os possíveis caminhos. O primeiro, a propositura de ação judicial visando a reparação do dano. O êxito da medida dependeria da efetiva demonstração da ilicitude do ato e da lesão por ele causada, fatos àquele momento nem sequer esclarecidos.
O segundo seria a busca da composição amigável para o conflito, visando pôr fim à discussão sem a necessidade de apontar culpados.
Reconhecendo a rigidez dos instrumentos judiciais para definir o alcance e extensão dos possíveis danos e as dificuldades de sua eventual reparação, a procuradoria tomou a iniciativa do acordo.
A empresa, por sua vez, abrindo mão do direito de se defender perante o órgão ministerial, aceitou a proposta, anunciando sua disposição de adotar significativas medidas de melhoria da qualidade dos recursos ambientais.
Com a assinatura do acordo, a empresa obrigou-se a doar um laboratório para análise de emissões atmosféricas de veículos leves e a diesel ao Centro Tecnológico de Minas (Cetec) e a incrementar a capacidade do laboratório de motores do IPT de São Paulo.
Obrigou-se, ainda, a doar uma estação de monitoramento da qualidade do ar à Fundação Estadual do Meio Ambiente. Por fim, obrigou-se a adquirir uma área de cerca de 6.000 ha no vale do rio Peruaçu (MG) para a criação de um parque nacional, cuja expressão transcende as fronteiras do Brasil.
Julgou-se necessária uma última providência: submeter o acordo ao Conselho Nacional do Meio Ambiente, com o objetivo de permitir a participação da sociedade na reflexão sobre o alcance e qualidade das obrigações ali previstas.
Ajustes como esse demonstram as expressivas vantagens da negociação, instrumento típico para a solução de assuntos privados, em áreas de interesse público.
* Hindemburgo Chateaubriand Filho
Mestre em direito e Procurador-chefe da República em Minas Gerais.
* Afrânio Nardy
Mestrando em direito na UFMG e Assessor do Ministério Público Federal.