Conflitos entre Judiciário e imprensa estão mais expostos

Por Santamaria Nogueira Silveira

O primeiro jornalista que atentou para o fenômeno da “judicialização da pauta jornalística” foi Ricardo Amaral, à medida que o país consolidava sua estabilidade política e econômica, levando os conflitos de toda ordem a serem decididos dentro dos tribunais. A judicialização do Estado é um fenômeno das sociedades democráticas e altera a concepção de equilíbrio dos Três Podres, que exercem suas funções por meio de pesos e contrapesos, pensada por Montesquieu em “O Espírito das Leis”.

Nessa nova perspectiva, o Judiciário passa a ser um ator político importante que busca responder às demandas e às necessidades de uma sociedade cada dia mais diversificada, avançando sobre as esferas de atuação do Legislativo e do Executivo.

Um exemplo claro disso é a judicialização da saúde, pela qual o direito constitucional à saúde acaba se materializando pela medidas judiciais, que garantem aos cidadãos fornecimento de remédios, atendimento médico, novos tratamento e procedimentos diagnósticos. Em contrapartida, os críticos apontam que esse chamado “ativismo judiciário” vem usurpando do Estado a prerrogativa de definir políticas públicas de saúde e ignorando a conciliação para solução de conflitos.

Com a “Judicialização da pauta jornalística”, os operadores do Direito se projetam como “fontes” naturais da mídia, especialmente o advogado porque dispõe de maior autonomia para expressar seu conhecimento especializado e analisar questões jurídicas. O juiz, geralmente, fala – ou falava – no processo e os promotores falam em “off”, ou oficialmente pelo Ministério Público. Certamente, as instituições são balizas limitadoras, porque é necessário expressar a opinião institucional em conformidade com a instituição. As fontes são a base da ação e do trabalho jornalístico.

As entidades do universo jurídico também são fontes de grande destaque na mídia. Algumas, como a OAB, que se tornaram frentes de defesa do Estado de Direito e dos Direitos Humanos durante a ditadura, vêm ocupando esse espaço midiático desde a década de 1970, no sentido de criticar posições obscurantistas, como prisões arbitrárias, censura etc. Atualmente, é fonte para a imprensa no sentido de repercutir atos do Poder Público e relativos aos direitos dos cidadãos ou à falta deles, além de temas corporativos, em menor escala.

Estando no foco das transformações sociais, políticas e econômicas do país, a Justiça passou a atrair, definitivamente, a atenção da imprensa. As decisões do Supremo Tribunal Federal são um exemplo. O STF já se pronunciou sobre matérias de grande relevância, como pesquisa com células-tronco embrionárias, união estável, união homoafetiva, Lei da Anistia, Lei da Ficha Limpa, marcha pela liberdade de expressão e muitas outras , com reflexos práticos sobre a vida de todos os brasileiros.

O que a mídia busca dos operadores do Direito, especialmente do advogado, como fonte, é, principalmente, sua expertise no ramo do Direito em que atua. Direito Penal, Civil, Família, Consumidor, Trabalhista, Tributarista e Constitucionalista lideram o interesse.

Uma das fontes da advocacia mais recorrente é o jurista Ives Gandra da Silva Martins, especialista em Direito Constitucional e Tributário, que é capaz de opinar sobre as mais diferentes matérias com propriedade e autoridade. Atualmente, os escritórios de advocacia também passaram a ganhar espaço na mídia e muitos deles possuem assessoria de imprensa, que municiam diariamente a mídia, com pautas e fontes.

O advogado também interessa à mídia como fonte quando patrocina uma causa com grande repercussão social , para explicar a aplicação de determinada lei ou para comentar os caminhos que um processo deve seguir. Certamente, a exposição do advogado na mídia tem suas restrições éticas e ele não pode se manifestar sobre a causa de outro colega, mas pode falar em tese.

A despeito do interesse da mídia, ainda há muitos pontos de conflito na relação entre o Judiciário e a imprensa, embora ambos visem o interesse público em primeiro lugar. Há até quem afirme que a mídia consegue influenciar, sob pressão da opinião pública, decisões da Justiça; assim como há muita reclamação da imprensa sobre a chamada “censura jurídica”, pela qual o juiz sobrepõe os direitos da personalidade à liberdade imprensa, embora a Constituição Federal vete a censura.
Santamaria Nogueira Silveira é jornalista, doutora em Comunicação Social pela ECA-USP , mestre em Literatura Brasileira pela FFLCH- USP e trabalha com jornalismo institucional.

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado.


Você está prestes a ser direcionado à página
Deseja realmente prosseguir?
Atendimento