Ao que parece, voltou ao País uma antiga modalidade de resolver os problemas na educação. Ela tem por base aquele “jeitinho”, literalmente. O que assusta em tudo isso é que passam por cima de tudo, até da Constituição Federal, para dar “solução” a um problema. As cotas, como são apresentadas, não vão solucionar a questão do ingresso dos menos favorecidos na universidade pública, mas irão tirar direitos dos que lutaram para se qualificar e passaram com méritos no vestibular. Tem mais para criação de grandes problemas, raciais por exemplo, do que solução dos existentes. O “jeitinho”, isso sim, tem que resolver a falta de qualidade ao ensino público de base. Fala-se nisso há tempos.
As cotas para alunos provenientes do ensino público, por si, são discriminatórias, aceitáveis por prazo determinado. Agora, não satisfeitos, estão inserindo negros e índios. Aliás, para estes, índios, já está em andamento a idéia de cotas no Congresso Nacional, sem falar da universidade indígena.
Existe, ainda, a tentativa de cotas para professores negros. São medidas entranhadas de voto. Negros e pardos são 48% dos eleitores (IBGE). O perigo é que, na verdade, estão à procura da criação de um grande problema que hoje é insignificante, ante todo o contexto, neste Brasil cheio de raças e cores. Querem estimular um problema racial que hoje é bem pontual.
Nos EUA foi, através desse processo de cotas, atendida uma situação de explosão de comportamento racial. Não foram as cotas, o resultado do progresso social dos negros americanos. No caso brasileiro, o problema é que a visão escravagista, em ambos os lados, permaneceu impregnada por longo tempo. Isto não quer dizer que aos negros foram fechados o acesso ao campo educacional. Existem maravilhosas mentes desenvolvendo magníficos trabalhos e considerável número de negros cursando as universidades.
Resolver o problema da educação pública no Brasil. Acredito em algumas medidas em vários níveis. Entre elas, a redução do gigantesco quadro de funcionários públicos na educação que, em Mato Grosso do Sul, Goiás e Mato Grosso, como exemplos, e se procedem as informações, giram em torno de um para cada doze alunos, aproximadamente, nos ensinos fundamental e médio. É tornar mais leve e eficiente a estrutura. Outras podem ser adotadas, também, com eficácia. Uma delas é o ensino pago nas universidades federais para os alunos que possam pagar mensalidades e com isso facilitar ingresso dos que não podem pagar. Outra seria a integral absorção das mensalidades pelo ProUni no sistema de reembolso, após formatura. Neste caso, aí sim, teríamos uma política social de apoio ao estudante, sem aberrações. Negros, índios e brancos desfavorecidos teriam todas as universidades.
Existe outra atitude que tem eficiência comprovada. É aquela que tem por objetivo não somente a inserção, mas também a qualidade. É a melhor canetada que o poder público poderia dar a si mesmo.
Obrigar que toda escola pública de ensino fundamental e médio, em regiões possíveis, tenham em seus quadros de ativos, um percentual mínimo de professores com curso de pós-graduação stricto sensu, principalmente nas matérias básicas. É uma proposta voltada a ensinar e não apenas a “alfabetizar”. Acompanhada de uma boa estrutura física da escola, com equipamentos, laboratórios etc., com certeza não precisaríamos de cotas nas universidades públicas. Nem negros, nem índios e nem brancos provenientes do ensino público ficariam desamparados no aprendizado de conhecimentos e possibilidades de ser doutor.
Não é surrealismo não. Este é o caminho decente para dar solução ao ensino de base e público no Brasil. Há muito já escrevi e debati sobre este assunto. Como assessor parlamentar em 1991, fiz rascunho de um projeto de lei nesse sentido. Infelizmente, tive que sair da assessoria. Quem sabe, penso, hoje não teríamos necessidades de cotas, de discriminação. É possível.
Raphael Curvo, Advogado e pós-graduado pela Universidade Cândido Mendes do Rio de Janeiro.