"Critica de Abdala sobre súmula vinculante é insubstancial."

Por Félix Soibelman
O presidente eleito do TST, Vantuil Abdala, no que chamo de “ênfase estéril”, classifica como bordão e falácia a expressão “engessamento da justiça”, adotada por muitos, sobre o tema da súmula vinculante.

Os argumentos expendidos são raquíticos; para ilustrar o que afirmo tomo a seguinte frase do Sr. Vantuil: “A súmula seria adotada depois de várias decisões no mesmo sentido, e ainda assim por dois terços da Corte do STF”.

Ora, que novidade há nisto? Todos sabem que o procedimento se daria nestes termos e seria mesmo espantoso se fosse de modo diferente, ou seja, resultaria escandaloso que o efeito vinculante fosse concedido a algo ainda não pacificado em diversas decisões. O Sr. Vantuil parece falar algo como se houvesse descoberto a pólvora, quando esta noção é clara para todos os críticos do instituto.

Os diversos operadores do direito que se insurgem contra isto conhecem, portanto, perfeitamente o que ele enuncia e é justamente esta transformação de “várias decisões no mesmo sentido” numa super-lei que denominam como “engessamento da justiça”, alertando para a origem política da constituição dos membros da mais alta Corte, que é de onde emanaria o efeito vinculante,
ou seja, periga dotar-se a dosagem política do STF com a irreversibilidade que a súmula ostenta. O argumento do Sr. Vantuil é, pois, insuficiente para a defesa do que ele mesmo preconiza.

O perigo do efeito vinculante deriva, sim, desse componente político que integra o STF, de forma a instrumentar judicialmente alguns interesses nem sempre socialmente justos. Um olhar mais arguto revela o valor da irrestrita liberdade de julgamento das instâncias inferiores como força de renovação social e jurídica, bastando que nos recordemos dos casos apontados por Celso
Bastos em texto publicado nesta revista ou da intensa oposição à ADIN nº 4 (que favoreceu a vampiresca atuação usurária e especulativa dos banqueiros) praticada ao longo dos anos pelas primeiras instâncias e por diversos tribunais. Tanta foi a pressão que trataram logo de retirar da Constituição o preceito, infelizmente.

Todos aqueles que são favoráveis à sumula de efeito vinculante, declaram, no que é também quase um bordão cego, que a autonomia judicante não seria afligida pela súmula; recordando a Nelson Jobin, invoca o Sr. Vantuil o argumento de que o juiz poderia expor todo seu pensamento no voto. Ora, Sr. Vantuil gostaria de entender tal colocação, porque não me parece crível que
alguém possa afirmar que a liberdade decisória possa ser reduzida à faculdade do julgador de expor suas convicções na fundamentação da sentença, mas, pasme-se, ser obrigado a decidir de acordo com a súmula! Isto seria mais perfumaria judicante que autonomia do magistrado.

Do jeito que a coisa se desdobra não estranharei que um dia, no futuro, se repita o caso do chamado “crime de interpretação”, quando Rui Barbosa defendeu um juiz processado em virtude de não ter aplicado a lei que considerava inconstitucional. Leis interpretativas ou súmulas vinculantes são sempre um caminho para podar-se o livre julgamento.

Afirma ainda o Sr. Vantuil que a súmula atingiria apenas 5 % dos feitos; ora, por que então é ovacionada como solução uma medida que deixaria sem solução 95 % da problemática da morosidade?

Enfim, creio que antes de se atender aos ímpetos retóricos que levam alguém a qualificar como “falácia” (é um termo muito forte) aquilo que vem sendo proferido por inúmeros juristas e advogados (e me incluo tão somente nesta segunda categoria), se deve antes buscar arrimo em argumentos bem mais profundos, sob pena de, como no presente caso, ser flagrada a total inconsistência das razões (ou falta delas) na menor contestação. Repetindo, não será a ênfase o que fará a substância do que é dito.

Félix Soibelman é advogado no Rio de Janeiro, editor e atualizador da Enciclopédia Jurídica Soibelman em CD-ROM.

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