por Grijalbo Fernandes Coutinho
Recente matéria veiculada no londrino The Economist considera o Judiciário brasileiro “jurássico e disfuncional” e os juízes “parecem antiquados e lhes faltam experiência e educação”, concluindo o guardião do capitalismo financeiro oligopolista europeu que assim como fizeram outros países latino-americanos, o Brasil agora deve reformar o Judiciário.
Incomoda o periódico o fato de “confrontados entre defender um contrato e promover a justiça social, três quartos dos juízes optariam pela segunda idéia, além de fazerem e desfazerem na interpretação dos contratos, para conduzir a sentenças socialmente benevolentes”
Os juízes do trabalho conhecem as deficiências do Poder Judiciário, bem como da legislação brasileira, reivindicando, pelo menos desde o início da década de 90, mudanças profundas que possam lhe dar maior agilidade e que concretizem efetiva legitimidade. Dentro deste contexto, têm sugerido medidas que democratizem a sua gestão e o aproxime da imensa maioria do povo, sobretudo dos setores que não conseguem exercer as garantias mínimas legais e constitucionais.
Não é por outra razão que as associações de classe da magistratura possuem uma postura nitidamente crítica em relação ao modelo arcaico vigente, concentrador de poder nas cúpulas do Poder Judiciário, capaz de afastar a imensa maioria de juízes do processo decisório, no âmbito administrativo e também na esfera judicial, através dos incidentes processuais previstos na Constituição Federal e na legislação ordinária.
Se há algum consenso no seio do Poder Judiciário, este diz respeito ao tom crítico lançado contra o sistema processual em vigor, responsável por parte considerável da morosidade do sistema judiciário brasileiro. Mas tal função, como não poderia deixar de ser em qualquer Democracia, está reservada ao Poder Legislativo, cabendo aos juízes apontar a falha do mecanismo recursal e do complexo processo de execução que somente alberga com intensidade os devedores recalcitrantes bem aquinhoados.
Lamentavelmente, não são nobres os propósitos da crítica formulada pela matéria veiculada pela revista inglesa The Economist contra o Poder Judiciário brasileiro. Pretende, na verdade, reiterar todas as manifestações dos organismos financeiros internacionais, especialmente do Banco Mundial e do seu Documento 319, cuja premissa básica consiste na tese do judiciário mínimo e previsível para os insaciáveis credores internacionais.
Não se cansam os agiotas internacionais de insultar os juízes e o judiciário para extrair vantagens logo em seguida, com reformas que possam subtrair a independência e atentar contra a visão social dos magistrados. Perseguem a instituição da malsinada súmula vinculante e de meios alternativos de solução de conflitos, afastando, assim, o “incômodo” Poder Judiciário da análise dos seus rentáveis negócios e contratos.
O capital internacional, bem como seu agente de comunicação The Economist, responsável pela fome e miséria de boa parte do povo brasileiro, portanto, não é detentor de autoridade moral para lançar-se na aventura de arauto da modernidade reformista do judiciário das economias dependentes.
É hora de tirar a máscara desta gente que, não satisfeita com a acumulação de riquezas, quer agora explorar os menos favorecidos sem qualquer atuação do Estado.Querem os “investidores estrangeiros” sacrificar o que realmente dignifica o Poder Judiciário no Brasil: a independência dos seus juízes e a louvável visão social e humanística que cada vez mais se faz presente nas decisões judiciais.
O Governo brasileiro é benevolente ao não discutir com profundidade a dívida externa e a sua forma de pagamento, tolerando os abusos praticados pelos segmentos representados pela revista inglesa contra os milhões de excluídos no país.
Grijalbo Fernandes Coutinho é juiz do trabalho em Brasília (DF) e presidente da Associação Nacional dos Magistrados da Justiça do Trabalho (Anamatra).