Autor: Carlos Augusto Cezar Filho (*)
Há muito tempo, os contribuintes lutam no Poder Judiciário para fazer valer a afirmação de que uma multa fiscal, por exemplo, de 100% do valor do tributo acarreta o confisco, enfrentando posição contrária sustentada pelo Fisco e decisões conflitantes.
Para fins de esclarecimento, convém apontarmos três diferentes espécies de multa fiscal: temos a multa moratória, a punitiva e a agravada, sendo esta última o objeto do Recurso Extraordinário 736.090, em que o Supremo Tribunal Federal decidirá se a sanção no importe equivalente a 150% do tributo não pago, não declarado ou declarado de forma inexata enseja o confisco vedado pela Constituição Federal.
A multa moratória é a que simplesmente advém do não pagamento do tributo. Basta que o contribuinte não pague o tributo no prazo determinado pelo Fisco para que a multa moratória possa ser exigida.
Já a multa punitiva surge não em virtude do inadimplemento do tributo, mas do descumprimento de uma obrigação tributária acessória. Se o contribuinte deixa de pagar o tributo até o dia de vencimento, arcará com multa moratória. Por outro lado, se, mesmo honrando o tributo no prazo adequado, emite nota fiscal com dados incorretos, terá de suportar a segunda espécie de multa citada acima, isto é, a multa punitiva, por ter descumprido uma obrigação acessória.
A terceira espécie, consistente na multa agravada, que é o alvo do julgamento do STF no recurso mencionado, tem a ver com atos dolosos. Melhor explicando: a multa agravada tem como fundamento a prática de atos eivados de má-fé do contribuinte, o que ocorre nos casos de sonegação fiscal, podendo chegar, se nos pautarmos exclusivamente na lei, a 150% do tributo que não tiver sido pago.
O órgão máximo da Justiça no Brasil dirá se tal percentual de multa, em relação às hipóteses de sonegação, fraude e conluio, tem a capacidade de exercer o confisco, onerando o contribuinte com penalidade que se torna extremamente gravosa.
O STF entendeu ser a questão relevante sob os pontos de vista jurídico e econômico para a sociedade, de modo que a decisão a ser proferida venha a configurar um importantíssimo precedente passível de ser adotado pelos julgadores do país.
Hoje podemos encontrar decisões segundo as quais uma multa moratória de até 20% do tributo pago a destempo não ofende o princípio da razoabilidade.
Quanto às multas punitivas, de acordo com alguns tribunais, a sua fixação em montante não superior a 30% do tributo é igualmente considerada razoável.
Por sua vez, há decisões de segundo grau que admitiram a possibilidade de aplicação de multas agravadas de 150% do tributo por conta de atos de sonegação. Defendeu-se nos julgamentos que um percentual tão elevado como esse serve para reprimir aqueles que empregam artifícios contrários aos interesses fiscais e da coletividade.
O sentido que será tomado pelo STF é desconhecido, até porque em pesquisas na jurisprudência se alcançam alguns julgados reconhecendo a suficiência da multa de 75% para se prevenir a sonegação.
Assim, de um lado os contribuintes esperam que a corte suprema indique ser confiscatória a multa de 150% nas situações em que constatada a sonegação. De outro há o Fisco, que aguarda a ratificação do percentual em comento, ou seja, do percentual que ele assevera ser indispensável à coibição de condutas dolosas destinadas a impedir ou retardar o conhecimento do fato gerador do tributo pela autoridade fazendária ou a obstar a própria ocorrência desse mesmo fato.
Longe de querer avalizar medidas que provocam intencionalmente prejuízo ao erário e, por via oblíqua, à população, devemos consignar: os que se posicionam favoravelmente à multa de 150% precisam considerar os reflexos de tamanha penalidade sobre o contribuinte. Têm que estar cientes de que empresas geram renda e emprego, contribuindo para o desenvolvimento nacional, de maneira que o fechamento de mais locais de trabalho, suscetível de ser ocasionado por carga tributária pesada, seja eleito como um dos pontos dignos de discussão paralela ao que será julgado pelo STF.
Afinal, o estímulo à atividade econômica está garantido na Constituição, e não podemos exaltar somente o intuito de arrecadação do Fisco.
A punição dos sonegadores é relevante. Porém, não há de ser vista como fator apto a sepultar sumariamente as empresas.
O ideal é punir a sonegação e, simultaneamente, intimidar o sonegador, sem que a intimidação, entretanto, culmine na desproporcional expropriação de bens do contribuinte ardiloso. Não temos de fulminar o sonegador.
Enfim, se o que o STF define possui força de orientar juízes, é com muita cautela que o recurso em ênfase deve ser julgado. Com certeza, a ponderação e a prudência não serão abandonadas, haja vista a seriedade do tribunal, restando aos cidadãos comuns, aos advogados e à administração pública acatar o que for consolidado.
Autor: Carlos Augusto Cezar Filho é advogado do Bella Martinez Advogados.