Dada a oferta de cursos, Exame da OAB é mal necessário

Por Carlos Henrique Abrão

Os acesos debates em torno da obrigatoriedade do exame da Ordem dos Advogados do Brasil, após longa batalha, acenou o Supremo Tribunal Federal não haver ilegalidade ou inconstitucionalidade na exigência. Fato é que temos um número incontável de faculdades, e nem se diga de bacharéis, e uma boa parte não consegue chegar ao mercado quando o faz recebe remuneração inferior ou se submete a todo tipo de concurso aumentando o contingente de reprovados.

Apenas para que se tenha uma idéia, o último exame da magistratura em São Paulo apresentou quadro de inscritos em torno de 17 mil e apenas pouco mais de 1,5% atingem a reta final das provas orais. Haveria uma solução alternativa ao Exame da Ordem? Cremos que o primeiro passo seria enxugar o número de faculdades e selecionar, por região e município, aquelas que têm algum desempenho, ao menos regular, nas provas.

Acaso se quisesse suprir o exame da ordem, seria fundamental que OAB e Ministério da Educação fiscalizassem, juntas, os cursos e lhe atribuíssem notas. As que não fossem aprovadas, obviamente, ficariam durante dois anos no período de observação e, se não houvesse melhora, automaticamente fechadas. Com isso, pois, toda a faculdade que não conseguisse nota de aprovação, os seus alunos teriam que ser submetidos aos exames da OAB para que o mercado não se revestisse de um grave e grande desnível.

Dizem que o exame capacita ao exercício profissional, mas não é bem assim. Em nações desenvolvidas, somente após um estágio prolongado e um período de cinco ou mais anos de formado é que se pode postular perante a Suprema Corte. Entre nós é muito diferente, basta obter a carteira, e isso pode ser feito antes da formatura, para que logo após a colação de grau, o interessado possa advogar nas instâncias superiores de Brasília. Há muitos ainda que se submetem aos exames para aumentar a possibilidade de, no futuro, advogarem em todo o território nacional, sem qualquer barreira ou mediante livre concorrência.

Fácil ou difícil, o exame é mal necessário que se alista em razão da profusão de cursos que ganhou avanço a partir da década de 1970 e sobrepujou as expectativas, sem que o governo ou o órgão de classe fizesse movimentos na direção de reduzir os quadros de faculdades, algumas de fim de semana, outras de sofrível nível, e sem professores capacitados.

Na maioria dos casos, o que vale é uma cadeira de sentar e um quadro negro, pois os professores, propalados titulares, aparecem apenas nas aulas de abertura e de vez em quando durante os exames.

Mudou profundamente o quadro, com o mecenato de cursinhos e cursos outros que se propõem a todo tipo e sorte de aprovação, desde o exame da ordem até qualquer pretendido pelo interessado, com curso presencial ou não, bastando mensalmente pagar o valor do contrato.

E milhares de escolas de direito se fizeram nascer e implantar ao longo das décadas pelo Brasil Continental, tanto que hoje ninguém mais estranha que aquelas tradicionais não são as que mais aprovam nos concursos. Explica-se, elas apresentam, comparativamente, um menor número de pretendentes, o que é perseguido é apenas o diploma e nada mais.

Com ele os sonhos e também as frustrações contingenciam o mercado de trabalho. Salários sem piso da categoria dominam, e muitos formados trabalham como se fossem estagiários e não há, por assim dizer, um planejamento de cargo ou salário no viés da iniciativa privada.

Tidos como associados ou cooperados, na maioria das vezes, tem fruição de evitar ação trabalhista. Entretanto, o que é preciso fazer, e de forma sistemática, e, além disso, rápida, é um corte profundo em cerca de 30 a 40% das faculdades que não mostram apetite ou vontade de aprimorar os estudos. Não são todos, por certo, mas há provas com erros tão crassos de vernáculo que o mais tranquilo fica nervoso e irritado.

Transformaram os cursos de cinco anos de duração em técnicos com apostilas e DVD, vídeos e quaisquer outras ferramentas que permitam ao candidato ser um plus em relação à concorrência. Milhões são arrecadados com os exames feitos durante o ano, mas o nível das escolas, ao invés de melhorar, tende a piorar.

Fundamental que a OAB e MEC interviessem ao nível das escolas e lhes atribuíssem nota de aprovação ou reprovação, deixando que se encerrassem com a possibilidade de transferência em relação aos alunos. Teríamos, seguramente, mais de 75% delas que estariam em situação dificultosa, cujos alunos seriam obrigados a fazer prova e o exame da classe.

Os alunos bem preparados nada temem e acham até um bom teste para abrir as portas para os demais que ao longo dos anos virão. E encontrando essa vicissitude na qual perfazemos mais de um milhão de bacharéis, a maioria se aperfeiçoa no mercado de concurso, já que, na iniciativa privada, poucos ou só os melhores sobreviverão.

Este mercado, que não é diferente dos demais, precisaria de um controle maior e mais específico, talvez, e sem criticas, seja a razão principal do processualismo que vivemos atualmente, cujos processos levam mais de uma década. O mercado profissional terceirizado e que recebe de acordo com as petições e recursos elaborados, ainda que em massa, ou divorciados do contexto da lide.

Enxugar o mercado, eliminar os erros e corrigir o futuro parece ser o desafio maior, que a OAB e MEC juntos terão para que os cursos jurídicos retomem a credibilidade e, acima de tudo, coloquem no mercado profissionais de induvidosa qualidade.

Carlos Henrique Abrão é juiz convocado do TJ-SP e doutor em Direito pela USP.

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