Decisão do STF sobre prisão em segundo grau é uma justa guinada

Autor:  Carlos Henrique Abrão (*)

 

A recentíssima decisão do Supremo Tribunal Federal, determinando a prisão do condenado em segundo grau, representa um passo histórico e relevante contra a escalada do crime do colarinho branco e, notadamente, da corrupção.

O garantismo constitucional da presunção de inocência tem sido utilizado com equívoco, e assim os usos e costumes pregam incessante e intermitentemente a premissa da culpa ou dolo submetido ao preceito da coisa julgada.

A justiça não é rápida a ponto de dar uma solução de culpado ou inocente de imediato e os julgamentos, com recursos que se eternizam, duram, em média, uma década, afora o número de habeas corpus impetrado em todas as instâncias, a fim de que se consiga uma repercussão no status libertatis do responsável.

A justa guinada não pode parar ou ficar nessas circunstâncias, devemos nos voltar para os crimes hediondos, contra a vida, latrocínio e contra os costumes. Discursos vindos dos quatro cantos do país noticiam que nunca o crime foi tão propalado e disseminado, nos mais variados segmentos da sociedade, em regiões do Brasil.

Defendemos que nos crimes contra a vida o julgamento se faça de modo célere e também no latrocínio. Poucos dias atrás, uma turista estrangeira teve sua vida subtraída, de forma bárbara, por um meliante desqualificado que a esfaqueou. Vieram os familiares passar férias no país e voltam com um corpo desfalecido.

O Estado brasileiro de beligerância e, em grande parte, em colapso, fruto da crise econômica e do péssimo exemplo que vem das nossas autoridades, precisa de substanciais mudanças.

Em casos dessa natureza deveríamos ter um julgamento sob a forma de juri não solene e sim informal, ao qual caberia dizer apenas se é ou não culpado o acusado. E como não temos a pena máxima de morte, em vigor em alguns estados norte-americanos e outros países, a prisão perpétua seria uma boa alternativa, com o cumprimento nos primeiros cinco anos em regime fechado e o máximo isolamento, a fim de que se conscientize o criminoso de sua conduta e não mais volte a recalcitrar em detrimento de uma sociedade indefesa e que somente recolhe impostos.

Crimes bárbaros que atentam contra a vida não podem aguardar solene e indefinidamente um julgamento pelos tribunais do juri, mas sim mediante uma formação que apenas teria bom conhecimento sobre os fatos e pronunciaria o édito de culpabilidade.

Diante desses argumentos, ao juiz caberia, se menor fosse, a imposição de medidas de internação, e ao completar a maioridade, o alijamento da sociedade, para cessar, de uma vez por todas, a impunidade.

Nunca antes vimos tantas armas pesadas, clandestinas ou não, espalhadas pelo Brasil, num momento em que a população, por meio de plebiscito, votou a favor do desarmamento e não encontra patrulhamento, policiamento preventivo ou ostensivo.

Sair à noite nas grandes cidades é uma loteria. O cidadão de bem pode não retornar, deve ter carro blindado ou contratar uma escolta particular, como acontece com o transporte de mercadorias, bilhões de reais em que as quadrilhas organizadas invadem as fábricas, indústrias ou esperam nas estradas para, mediante fuzis, encontrarem facilmente a presa.

Temos encarcerados mais de 700 mil pessoas, e o argumento contra a decisão do Supremo Tribunal Federal é que o nosso sistema prisional estaria falido. E a reflexão perpassa esse exame pueril e simplista, pois que a sociedade não pode arcar com mais esse pesado ônus de ficar escancarada em plena luz do dia com o crime organizado.

A vida é um bem o qual não se respeita no Brasil, daí os constitucionalistas e garantistas de plantão virem a público dizer que os direitos humanos foram destratados e que a Carta Política rasgada. Nada mais incorreto, inaceitável e destoante da vida política da nação.

São os nossos políticos que roubam o dinheiro público, subtraindo da população o serviço essencial, a exemplo da saúde, ensino, educação e transporte.

Indaga-se, pois, por que em relação aos mais pobres e humildades não se aplica, como forma de isonomia, tratamento desigual para os desiguais, o mesmo comando, a famigerada presunção de inocência. Em razão desse clamoroso princípio que privilegia a corrupção, o crime do colarinho branco, ambiental e assalto aos cofres públicos, a população brasileira tem se mostrado, ao longo de séculos, refém dessa carnificina das ruas, dos lares e dos ambientes frequentados. O desassossego chega a tal ponto que no Brasil, hoje, se mata mais do que na guerra da Síria, do Afeganistão ou qualquer país em constante atraso.

Se vier a medida adotada pelo STF, para banir a corrupção, tolher a roubalheira e incutir a moralização, merecerá elogios e aplausos de 200 milhões de brasileiros, os quais não encontram ressonância na representatividade ou na mudança do status quo.

O sucateamento do Estado brasileiro é, principalmente, fruto dessa mutilação provocada pelo crime continuado da corrupção, do ataque e desvios das licitações e contratos administrativos.

O sistema penal está em colapso, mas antes ele do que a sociedade e o cidadão de bem, talvez com a decisão da Suprema Corte, o executivo comece a cogitar da remodelação dos presídios, das parcerias público-privadas ou das privatizações, ainda incipientes.

O combate sem tréguas ao crime exige que o judiciário brasileiro se conscientize que o fim da impunidade é a marca indelével e característica de países desenvolvidos. A paz é fruto inesgotável da justiça, e se ela provier, começando dessa decisão, o Brasil estará liberto das mãos e dedos sujos dos corruptos.

 

 

 

Autor:  Carlos Henrique Abrão é desembargador do Tribunal de Justiça de São Paulo.


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