por Walmor Alves Moreira
Tema central do Seminário Internacional Cidades Costeiras Sustentáveis, realizado recentemente em Florianópolis (www.prsc.mpf.gov.br), a gestão da orla marítima entra novamente no foco das atenções. Desta vez, com muito mais vigor em virtude da aprovação, após 16 anos de discussão, do Decreto Federal 5.300, de 7 de dezembro de 2004, que, enfim, regulamenta o Plano Nacional de Gerenciamento Costeiro.
Entre as muitas e importantes inovações está a que conceitua e estabelece limites terrestres para a ocupação da orla marítima, dotando a costa brasileira de uma linha de segurança física até então inexistente, que poderá conter a onda de privatização das praias brasileiras.
Tínhamos (e ainda temos) a proteger a orla, em termos físicos, os limites traçados pelos terrenos de marinha, cujo desconhecimento de seus marcos provoca inúmeras controvérsias. E, no plano dos ecossistemas naturais, os limites previstos para as áreas de preservação permanentes, como das matas de restinga e de manguezais, entre outros, os quais são diuturnamente desrespeitados pelos municípios, que historicamente vêm permitindo a ocupação ilícita em tais áreas, rendidos à pressão política e/ou econômica.
A nova lei estabelece um limite de 50 metros em áreas urbanizadas ou 200 metros em áreas não urbanizadas, contados na direção do continente, a partir do limite de contato terra/mar em qualquer de suas feições: costão, praia, restinga, duna, manguezal, lagunas, canais ou braços de mar, etc.
Como dito na exposição de motivos, adota-se um modelo de diagnóstico simplificado e fundamentado em conceitos paisagísticos, passível de ser realizado rapidamente, sem grandes levantamentos temáticos e pouca elaboração cartográfica. Enfim, uma metodologia viável graças à escala pouco extensa do espaço de intervenção.
O Brasil, assim, ingressa, com atraso, no rol de nações que adotam faixas de proteção da costa, como a Austrália, paradigma do Seminário acima mencionado. Já a França, Noruega, Suécia e Turquia prevêem o limite de 100 metros, enquanto na Espanha essa faixa pode variar de 100 a 200 metros. Entre nós, na América, temos a Costa Rica (país modelo de gestão costeira e ambiental, que recebe mais turistas que o Brasil), a Colômbia e a Venezuela com um limite de 50 a 200 metros, o Chile com 80 metros, e o Uruguai, com 250 metros.
A norma, de caráter urbanístico-ambiental é de aplicação imediata e cogente aos municípios e demais órgãos públicos, e resolve um dilema que se apresentava insolúvel no dia-a-dia dos balcões de licenciamentos públicos: qual o limite para construir na orla? Onde acaba a praia e começa a “Cidade”, ou as áreas passíveis de urbanização?
Agora, não vale mais invocar simplesmente o Plano Diretor municipal (a maioria deles defasados) para permitir ocupações ilegais na orla marítima sobre terrenos de marinha ou áreas de preservação permanentes. Há que se respeitar imediatamente os novos limites de proteção da costa, sem desculpa, sob pena de cometimento de crime e de improbidade administrativa. Cumpre à sociedade e ao Ministério Público fiscalizar o cumprimento da norma e cobrar a responsabilidade daqueles que a violarem.
Walmor Alves Moreira é procurador-chefe do Ministério Público Federal em Santa Catarina e foi procurador do estado de São Paulo.