Autor: Pedro Raposo Jaguaribe (*)
O presente artigo visa abordar os principais aspectos legais relacionados à incidência ou não das contribuições do PIS e da Cofins sobre as bonificações/descontos comerciais recebidas pelos contribuintes de seus fornecedores.
Por se tratar de controvérsia ainda não assentada no mundo jurídico, o presente trabalho não visa esgotar o assunto, esboçando apenas a posição defendida pelo autor.
Atualmente a tônica dos diálogos se resumem na conjuntura econômica nacional, arrecadação insuficiente e gastos exorbitantes. Com a economia instável, os contribuintes buscam remodelar seus negócios. Para tanto, a busca por práticas comerciais para fidelizar e cativar clientes, reduzindo custos de operação se tornam cada vez mais necessários.
No que tange aos comerciantes varejistas, a bonificação, prática comercial muito difundida, vem se tornando alvo da Fazenda Nacional, por entender que a mesma possui natureza de receita para fins de incidência do PIS e da Cofins.
Ocorre que as bonificações recebidas pelos comerciantes representam, em verdade, desconto fornecido pelo fornecedor na ocasião da venda, não podendo serem consideradas como receita para fins de incidência do PIS e Cofins, como pretende a Fazenda Nacional.
Isso porque a bonificação consiste em uma política de relacionamento comercial pelo qual o fornecedor entrega ao adquirente uma quantidade de itens do produto vendido maior do que a quantidade contratada, sem acréscimo no preço de aquisição. A prática, além de estimular a fidelização entre as partes, fomenta a relação com um parceiro comercial qualquer, se tornando de extrema importância para o setor varejista, como uma forma de estratégia comercial.
Atualmente as contribuições para o PIS e Cofins estão disciplinadas nas Leis 9.718/98, em seu regime de apuração cumulativo e nas Leis 10.637/2002 e a 10.833/2003 no regime não cumulativo, tendo o legislador ordinário determinado como hipótese de incidência de tais contribuições o faturamento mensal da empresa, assim entendido como a totalidade das receitas auferidas pela pessoa jurídica.
Ocorre que, para podermos compreender o alcance da tributação, importante analisar o real conceito de “receita”, que podemos encontrar no CPC 30, aprovado pela Deliberação CVM 597/09, que assim dispõe:
“A receita é definida como aumento nos benefícios econômicos durante o período contábil sob forma de entrada de recursos ou aumento de ativos ou diminuição de passivos que resultam em aumentos do patrimônio líquido da entidade e que não sejam provenientes de aporte de recursos dos proprietários da entidade”
Portanto, receita pode ser considerado como algo que integra o resultado do período, ou seja, quando terceiros efetuam um pagamento de uma transação ou assumam o compromisso de efetivá-lo em decorrência de uma venda ou prestação de serviço[1]. Um efetivo acréscimo patrimonial.
Assim, não podem ser integrados ao conceito de faturamento para fins de incidência do PIS e da Cofins, por exemplo, as despesas ou custos operacionais que não se caracterizem como um efetivo ingresso de receita para a pessoa jurídica e sim uma mera recomposição patrimonial.
As bonificações, quando recebidas do fornecedor por um ato de mera liberalidade, sem estar condicionada a nenhum evento futuro, caracteriza uma redução do preço de aquisição dos produto, ou seja, no final o custo de aquisição do produto somado com as bonificações recebidas acaba sendo reduzido, aumentando a margem de lucro do comerciante varejista.
Isso porque o seu impacto ocorre no custo da mercadoria de quem recebe, ou seja, se o comerciante varejista comprou de seu fornecedor 10 unidades de um produto qualquer ao custo de R$ 10,00, mas recebeu 12 unidades, em verdade, o custo unitário cai de R$ 1,00 para R$ 0,83.
Assim, como a bonificação não constitui receita para o vendedor, a mesma não poderia ser considerada receita, integrando a base de cálculo do PIS e da Cofins. Ademais, conforme acima demonstrado, não houve ingresso de novos recursos na sociedade que representassem um acréscimo patrimonial, mas sim uma redução no valor do custo da mercadoria.
Por se tratar de uma redução do custo de aquisição, as bonificações devem ser excluídas da receita bruta para fins de determinação da base de cálculo do PIS e da Cofins. Este é inclusive o entendimento da Receita Federal que dispõe em sua Instrução Normativa 51 de 03.11.1978 que “A receita líquida de vendas e serviços é a receita bruta das vendas e serviços, diminuídas das vendas canceladas, dos descontos e abatimentos concedidos incondicionalmente e dos impostos incidentes sobre as vendas”.
De acordo com essa Instrução Normativa, as bonificações em mercadorias são consideradas como parcelas redutoras do preço de venda quando não dependerem evento posterior a emissão da nota fiscal, ou seja, devem ser excluídas da base de cálculo das contribuições para o PIS e Cofins.
Entender que o recebimento de bonificação constitui receita, além de desarrazoado, é ilegal. Isso porque a essência do fato bonificação ou desconto comercial, identificando sua natureza jurídica, determina seu registro em conta redutora de custo, excluindo, por conseguinte, a receita.
Nesse mesmo sentido, receita e faturamento para fins de incidência das contribuições para o PIS e Cofins são conceitos jurídicos-substanciais e não contábeis, de tal modo que essas contribuições somente alcançam o que efetivamente for receita ou faturamento.
Assim, na esteira dos artigos 109 e 110 do Código Tributário Nacional, e considerando a legitimidade das Deliberações CVM 575 e 597, de 2009, baixada sob o pálio do artigo 177 da Lei 6.404/76, as bonificações e/ou descontos incondicionais obtidos não compõe a receita para fins de cálculo do PIS e da Cofins.
Por fim, conclui-se que o que deve ser tributado é a receita da pessoa jurídica e não outra grandeza que a ela não se amolde em termos de sua definição, conteúdo e forma. Significa dizer que o recebimento de mercadorias em bonificação implica em mera redução do respectivo custo unitário de aquisição e, redução de custo não equivale a receita, não podendo ser fato gerador do PIS e da Cofins.
Autor: Pedro Raposo Jaguaribe é especialista em Direito Tributário e Finanças Públicas pelo Instituto Brasiliense de Direito Público – IDP; LL.M (Masters of Law) pelo Instituto Brasileiro de Mercado de Capitais de Brasília – IBMEC; Membro da Comissão de Direito Tributário da OAB/DF; Membro do Grupo de Pesquisa de Direito Tributário da Universidade de Brasília – UnB; Advogado em Brasília.