Dissídio de comum acordo: a antítese da Emenda 45

por Edson Martins Areias

Refletindo sobre esta antítese estampada, assumi a presunção de minha própria ignorância. Assim, acorri ao Aurélio e vi estampados no verbete dissidir os sinônimos divergir, dissentir. Vi também que o vocábulo dissídio procede do latim dissidiu.

Ato seguinte, encontrei no Vocabulário Jurídico de Plácido Silva, atualizado pelo brilhante jurista Nagib Slaibi Filho e pelo renomado Geraldo Magela Alves, a remissão ao instituto de Direito laboral.

Malgrado não haja no texto consolidado definição explícita do que seja dissídio — omnis definitio periculosa est — é desnecessário grande esforço para inferir o óbvio. Dissídio guarda o mesmo significado de dissidiu que os dicionários (britânicos) Collins e Oxford traduzem por desacordo, digressão, discussão, dissensão, desarmonia.

Pois bem, reflitamos sobre a nova redação dada ao parágrafo 2o do artigo114 da Carta do Brasil pela Emenda Constitucional 45:

“Recusando-se qualquer das partes à negociação coletiva ou à arbitragem, é facultado às mesmas, de comum acordo, ajuizar dissídio coletivo de natureza econômica, podendo a Justiça do Trabalho decidir o conflito, respeitadas as disposições mínimas legais de proteção ao trabalho, bem como as convencionadas anteriormente.”

A antítese vernacular — comparável à bondade maligna, à coragem covarde e ao anjo diabólico — implica excluir da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça a direito dos trabalhadores. No plano individual, equivaleria dizer que alguém só pudesse ajuizar ação indenizatória mediante a aquiescência do réu.

O único caminho que restará a alguns trabalhadores será o da greve, nos termos do parágrafo 3o da referida emenda :

“Em caso de greve em atividade essencial, com possibilidade de lesão do interesse público, o Ministério Público do Trabalho poderá ajuizar dissídio coletivo, competindo à Justiça do Trabalho decidir o conflito.”

Sabemos que a Ajufe — Associação dos Juízes Federais do Brasil ajuizará Ação Direta de Inconstitucionalidade em relação ao caput do artigo emendado. Do mesmo modo, sobejam razões para que as confederações de trabalhadores guerreiem o malsinado parágrafo 2o que , infelizmente, tramitou indene ante os olhos de competentes juristas e congressistas, quiçá tontos com a fúria reformista.

Quanto ao dissídio de comum acordo, saudosos os tempos em que os patrícios do J.J. Canotilho não tinham tantos motivos para nos glosar.

Revista Consultor Jurídico

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