E os homens? Continuam sendo discriminados…

Nove anos se passaram desde que, indignada, escrevi um artigo sobre a discriminação dos homens no Direito de Família.

Como nada mudou, pergunto-me: por quê?

Tento analisar a questão. Olho para trás e vejo que as conquistas dos grupos homossexuais foram inúmeras na seara do Direito. Nem precisa ser um profissional da área para saber. Basta assistir televisão, ler jornais ou revistas, pois suas conquistas são amplamente noticiadas. Obtiveram o reconhecimento de suas uniões afetivas, do direito à partilha de patrimônio, da pensão alimentícia entre si, da herança, da adoção, etc… Isto é: andaram muito e para a frente, na direção de uma sociedade mais justa e com menos preconceitos. Ainda bem!

Perfilho a opinião de uma querida amiga, expoente do Direito de Família, que afirma terem as relações familiares progredido muito nos últimos anos, de modo que, atualmente, privilegiam muito mais o “afeto” e bem menos as conveniências sociais e econômicas, muitas vezes eivadas de hipocrisia.

As mulheres também andam a passos largos na história de suas conquistas. Seguem ampliando os seus espaços e direitos. Em destaque, temos aí a Lei Maria da Penha, que, se não trouxe às mulheres vítimas de violência, ainda, um efetivo benefício, já suscitou a discussão do tema com amplitude nacional em vários grupos e em todas as mídias.

Poderia, ainda, falar de outros grupos, algumas minorias bem articuladas e com representação, mas não é esse o objeto do artigo. Pretendo analisar outra questão: os homens no Direito de Família.

Os homens continuam exatamente no mesmo lugar em que estavam há 9 anos.

Continuam sendo discriminados nas questões de Direito de Família. Que o digam os seus advogados, eu, inclusive, que temos de trabalhar o dobro ou o triplo para defender seus direitos nas Varas de Família.

Exemplos práticos:

Ação de guarda, promovida pelo pai contra a mãe de uma criança de 4 anos, vítima de descaso e agressão, com pedido liminar de alteração amparado em exames médicos, que constataram agressão, depoimentos de quem a testemunhou, tudo somados a um laudo psico-social favorável ao pai. Ainda assim, o Juiz da causa não concedeu a transferência da guarda provisória ao pai! Houve necessidade de recurso, que, graças à prova e ao bom senso, concedeu a imediata transferência da guarda em decisão monocrática.

Outro caso:

Mais uma ação de guarda, em que o pai requer a guarda provisória, também em liminar, da filha de 15 anos que foi morar com ele há dois meses. A menor, anteriormente, residia com a mãe e mais dois irmãos, tendo o pai o dever de alimentos. A menina em questão, por motivos graves, foi residir com o pai. Este, então, requereu-lhe a guarda e também pensão, que deveria ser paga pela mãe.

Na verdade, o pai pediu que fosse transferida a guarda, bem como o dever de pagar alimentos, eis que a menor saiu da guarda da mãe, passando para a guarda do pai.

Eis a decisão liminar: a guarda provisória foi deferida ao pai (já que de fato já existia há dois meses), no entanto, foi indeferida a pensão!

Interposto recurso ao Tribunal, com pedido liminar tivemos outra vez o predomínio do bom senso e a pensão foi fixada em decisão monocrática.

Mais um caso:

O cliente me procurou depois da realização da primeira audiência num processo de divórcio direto litigioso. Indignado, disse que se sentiu desassistido pelo seu procurador. Na consulta, fico sabendo que o cliente queria pleitear a guarda do filho de 5 anos, ao que foi veementemente desaconselhado pelo advogado, sob alegação de que teria apenas 1% de chance de consegui-la, “porque a guarda é sempre das mães”.

Esses são casos recentes, em que não vislumbro outra motivação, senão o PRECONCEITO. Primeiro, em relação à transferência da guarda provisória ao pai, mesmo com ampla prova; a seguir, em relação aos alimentos que devem ser pagos pela mãe, e, por último, um advogado que sequer tenta pedir a guarda do filho para o pai.

Resumindo, pai serve para sustentar, mas não para cuidar. A mãe, ao contrário, só serve para cuidar, não precisa sustentar. Tem-se de noticiar ao mundo que este paradigma mudou!

Tenho conversado com meus clientes, até para tentar entender o que se passa. Em palestras, ciclos de estudo, seminários, sempre levanto esta questão. Mas a única coisa que me ocorre é que os homens estão perdidos numa nova condição, decorrente da revolução social promovida pelas mulheres. Por não saberem bem qual o seu novo papel, o seu lugar no mundo, na sociedade, no lar, não se articulam, e, por isso, seus anseios e direitos não têm visibilidade.

Isso tem de mudar! Se quisermos uma sociedade mais justa, mais equilibrada e harmônica, homens e mulheres devem ser tratados da mesma forma, principalmente na esfera da Justiça de Família.

Os homens “de bem” têm de fazer sua revolução. Reivindicar seus direitos, levantar suas bandeiras, reunirem-se nas praças, nas associações, e mostrarem ao mundo, à sociedade e aos julgadores que eles também podem ser ótimos pais e guardiões de seus filhos. Para isso, necessitam da contribuição material (pensão) da mãe e de tudo mais que decorre naturalmente da condição de guardião.

Quando já temos julgamentos que concedem a adoção (e guarda) de crianças a casais de mulheres e de homens, também é tempo de se tratar de forma equânime a pais e mães, a homens e mulheres, quando pleiteiam a guarda de suas crianças, sem preconceito. Assim, se a indicação da guarda for para o pai, que ele possa receber da mãe a pensão alimentícia que vai somar esforços para o bem estar material do filho.

Sei que a batalha judicial defendendo interesses dos homens na esfera do Direito de Família é árdua e desanimadora. Vivo isso no meu dia-a-dia.

Tanto o advogado como o cliente têm de ter isso em mente. Serão muitos os pedidos negados e os recursos interpostos no sentido de reverter tais decisões, uma insistência absurda sobre assuntos que, se fossem pleiteados pela mulher, certamente seriam deferidos sem pestanejar.

Mesmo assim, há que persistir. Uma sociedade será mais justa quando nela não mais existirem preconceitos, na qual as pessoas possam ser tratadas com igualdade de direitos e de obrigações. É uma realidade difícil de alcançar, mas, ainda assim, essa busca deve nortear os objetivos de todos aqueles que desejam um mundo melhor, mais harmonioso e com mais justiça!!

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Eliana Giusto
Advogada em Caxias do Sul (RS). Membro do Instituto Brasileiro de Direito de Família (IBDFAM).

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