É preciso consciência cultural para combater a pirataria

por Rodrigo Badaró de Castro

Recentemente, o presidente do STJ, Ministro Edson Vidigal defendeu em encontro internacional sobre Propriedade Internacional a criação de varas especializadas no combate à pirataria, além de citar avanços como a criação de Delegacias Especializadas, reformulação do sistema aduaneiro e a apresentação de projeto de lei que aumenta as penas para os crimes contra a propriedade industrial, ainda em tramitação no Senado.

Com efeito, se não bastasse, a Receita Federal, preocupada com a exorbitante perda de arrecadação, implementou sistema de verificação para buscar supostos piratas. Em tempo, vimos ainda pressões de outros Estados Soberanos, com ameaças de tratamento diferenciado em questões aduaneiras, “listas negras”, tudo por causa deste “tumor” que assola nosso Brasil, a pirataria.

Em conseqüência disso, sentimos e notamos alguns esforços para se evitar a banalização de um dos Direitos mais nobres dos cidadãos, que é o Direito de Criação, assim como do Direito de uma livre e sadia concorrência, alvo principal dos efeitos nefastos da pirataria.

Em primeiro plano, nos deparamos com uma forte manifestação de repúdio à pirataria e com propostas de combate feitas pelo Governo e por diversos segmentos da sociedade, o que originou beneficamente a concretização da CPI da Pirataria, que mostrou ao público as diversas faces desse crime e as lesões por ele geradas, resultando na importante implementação do Conselho Nacional de Combate a Pirataria. Assim, notamos que do ponto de vista institucional as providências estão sendo tomadas. Todavia, uma pergunta jaz: Como afinal diminuir e combater a pirataria??

Pois bem, é imperativa a conscientização de que a pirataria não é engraçada, conforme ouvimos muitas vezes em rodas de conversas, em dizeres cotidianos, a afirmação vangloriosa de um cidadão que diz ter um “personal muambeiro” ou possuir filmes e jogos que sequer estão nas lojas etc… Em outra esfera, muitos parecem estar sob o efeito psicológico da fácil obtenção de vantagem financeira perante os consumidores “corretos”, ou seguem algum mecanismo de satisfação interna para “punir” determinada indústria que praticaria preços supostamente elevados.

Ora, é imprescindível uma mudança cultural da população, pois, nos dizeres de Cícero “Minha consciência tem maior peso sobre mim do que a opinião do mundo inteiro”, e é imprescindível principalmente uma demonstração do Judiciário de que, conforme o sonho do pragmático clichê, o “crime não compensa”. Destarte, pergunto onde está a consciência do Brasileiro e o medo da atuação do Estado? Digo isso, mesmo e principalmente para os usuários de produtos piratas, como CDs, DVDs, softwares, roupas, eletroeletrônicos etc… pois são estes os fomentadores do crime.

Com efeito, não podemos esquecer que são várias as campanhas que tentam sensibilizar a todos de que o simples gesto de se comprar um produto pirata traz prejuízos bilionários ao Estado além de perda de postos de trabalho formal, conforme vários estudos já registraram. Se não bastasse, é evidente que este simples ato é o combustível de uma teia criminosa gigantesca e internacional. Assim, por mais óbvio que soe, somente quando o cidadão sentir que, ao pagar mais barato por um produto pirata estará promovendo um possível caos social, é que poderá ter a “dor de consciência” necessária para barrar o ímpeto consumista de ganho em detrimento de produtos originais.

Por outro lado, mesmo que seja notória a exemplar atuação do Superior Tribunal de Justiça, tanto do ponto de vista institucional como pelo reflexo de inúmeros julgamentos com imposição de condenações rigorosas, são preocupantes algumas decisões do Judiciário. Ou seja, é com nitidez solar que percebemos a afronta aos Direitos Autorais no Brasil. Na prática, por mais antiga que seja a sua proteção e por mais completo que seja o seu arcabouço legal, ele vem sendo por muitos banalizados, premiando-se aqueles que sempre estiveram no limite da legalidade, pois ao se decidir que um contrafator, mesmo que usuário, seja somente condenado ao pagamento por eventual produto usado ou criminalmente compelido a prestar breves esclarecimentos, estaremos sepultando o caráter punitivo e colocando no mesmo patamar aqueles que possuem consciência e os que não.

A pirataria no Brasil somente será efetivamente diminuída quando concomitantemente ao combate institucional, houver uma mudança cultural que somente pode ser feita por meio de programas de educação, campanhas educativas e orientação social e principalmente uma atuação firme do judiciário a fim de coibir tamanha afronta. Contudo, embora tenhamos consciência da falta de conhecimento e de educação que assola nosso Brasil, e isso deve ser ponderado, o que mais impressiona e entristece é que são justamente as camadas mais afortunadas da sociedade e pessoas jurídicas que afrontam os Direitos Autorais, maculando o preceito lógico segundo o qual quem dispõe de conhecimento e educação teria, em tese, uma conscientização formada e uma avaliação sedimentada dos efeitos da pirataria.

Assim, essas pessoas fazem parte considerável deste cenário como usuárias contínuas de produtos piratas, certamente se respaldando no sentimento de impunidade hoje existente e na total desconsideração da proteção à criação e propriedade intelectual.

Por fim, é importante cada um fazer seu papel no intuito de refletir e provocar nos outros uma reflexão acerca dos males de todos os “pequenos” atos. E que nossa nobre Justiça alicerce a tenha o condão punitivo demonstrando que o Direito da Criação é essencial não somente no presente, mas primordialmente no futuro, pois é a proteção que estimula a criação e o desenvolvimento, justificando investimentos financeiros e intelectuais.

Todos nós já criamos ou podemos vir a criar um dia. Registremos, pois, que ainda na era antes de Cristo, Mecenas, ministro do Imperador Otávio Augusto, virou protetor dos intelectuais e suas obras. Busquemos nosso Mecenas interior e que o Judiciário defenda com rigor tão nobre direito, punindo os que não tenham a capacidade de domar sua consciência.

Revista Consultor Jurídico

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