por Gilberto Marques Bruno
Ao apagar das luzes do “tormentoso” ano de 2004, o presidente da República, valendo-se das atribuições que lhe são conferidas pelo artigo 62 da “maltratada” Decana Carta de Regência, adotou com força de Lei, a malsinada Medida Provisória nº 232.
Travestida na benevolência governamental da pífia correção da Tabela Progressiva do Imposto sobre a Renda incidente sobre os rendimentos das pessoas físicas, a MP 232, teve o condão de rememorar os tempos em que o Brasil viveu o regime de exceção, com a conhecida majoração do ônus tributário, que ocorria sempre que a sociedade estava a comemorar a chegada de um novo ano.
É lamentável o fato de que o governo atual está a impor à sociedade brasileira o dever de recolher cada vez mais aos cofres públicos, sem levar em conta que o ônus tributário pode custar a própria sobrevivência da nação.
Em outras palavras, a sociedade paga um preço elevado para alimentar a voracidade do Fisco, mas a contrapartida praticamente não existe. Até hoje com toda certeza, grande parte do povo brasileiro, está a aguardar o início do tão decantado “espetáculo do crescimento”, do “programa Fome Zero”, “dos milhões de empregos” e tantas outras promessas, que não saíram do papel.
É de causar extrema preocupação a leitura das alterações constantes na legislação tributária, que se encontram inseridas na Medida Provisória nº 232/2004, as quais, em última analise, sinalizam que no ano de 2005, o contribuinte terá menor renda e como tal, deverá ver o seu patrimônio financeiro, mais uma vez, ser utilizado para sustentar a máquina da administração estatal.
A propagada Justiça Tributária, cuja aplicabilidade deveria estar atrelada ao respeito e a fiel observância dos Princípios Constitucionais Tributários, que se encontram insertos na “Constituição Cidadã”, continua a ser relegada a um segundo plano, demonstrando a ausência de sensibilidade do Poder Executivo Federal.
Os absurdos constantes no texto da indigitada Medida Provisória, no meu sentir estão a abalar a paz e a ordem social, não só pelo fato de ampliar os nefastos tentáculos da excessiva tributação, mas também porque criam restrições absurdas aos recursos administrativos em se tratando de matéria de ordem tributária, sem que fosse levado em conta, o fato de que a Decana Carta de Regência, assegura o Princípio do Contraditório e da Ampla Defesa. Neste particular, permito-me repetir as palavras do Presidente da Seccional Paulista da Ordem dos Advogados do Brasil, Luiz Flávio Borges D’Urso, que afirmou que a MP 232 está a instituir a “Ditadura Fiscal”.
Ou então, como bem asseverou o Presidente da Associação Comercial de São Paulo, Guilherme Afif Domingos, “O governo aproveitou-se de uma demanda justa, a revisão da tabela de imposto de renda para os trabalhadores, e embutiu na MP um forte aumento de tributos para as empresas, de forma a manter sua arrecadação. Isso é absurdo. De setembro de 2003 até agora, tivemos um aumento de 63% no Imposto de Renda e Contribuição Social dos prestadores de serviço. Quem agüenta manter um negócio com tamanha tributação?”.
A hedionda e nefasta elevação em 8% da base de cálculo da contribuição social sobre o lucro líquido (CSLL) para as empresas prestadoras de serviços que optaram pelo regime de tributação incidente sobre o lucro presumido, para o insano patamar de 40% (quarenta por cento), se apresenta como verdadeiro ato de abuso, e que jamais poderia ser justificado pelo Fisco como necessário, especialmente pelo fato de que no ano de 2004, o Brasil bateu recordes de arrecadação tributária.
Tenho como certo, o fato de que o dilargamento da base de cálculo da CSLL, vai ocasionar significativa elevação carga tributária das pessoas jurídicas prestadoras de serviços, e o estimado crescimento do ônus tributário, na ordem de 25% (vinte e cinco por cento), representará o início do processo de execução e morte do setor de serviços no nosso país.
Repita-se: Onde está a Justiça Tributária, o tratamento igualitário aos contribuintes, o respeito a legalidade e tantos outros princípios de direito que deveriam ser respeitados em um Estado de Direito ?
Penso que a sociedade não pode calar diante de verdadeiros “atos de império”, e tem que se mobilizar para por termo a esta “fanfarrice tributária”!
É sabido e isto não se questiona, que dentro do Princípio da Legalidade, o Presidente da República pode nos termos da Constituição Federal, adotar medidas provisórias com força da Lei, as quais, serão submetidas de imediato ao Congresso Nacional. Mas para tanto, nos moldes do texto constitucional, mister se faz que se tratem de casos de relevância e urgência.
Nessa senda, é de se perguntar:
A adoção de medidas provisórias para assuntos de natureza tributária, dentre os quais, alterações na legislação tributária, restrição de direitos dos contribuintes e para majoração de alíquotas de determinados tributos e/ou contribuições, como no caso da MP 232, são relevantes e importantes para quem? A impossibilidade de retardamento da sua instituição, estaria lastreada em que justificativa ? As questões de ordem fiscal não deveriam seguir os exatos termos da Constituição Federal ? Teria o Poder Executivo se esquecido do Princípio da Legalidade que deve ser observado em se tratando de matéria de ordem tributária ?
Seriam os argumentos governamentais pautados na necessidade de amealhar mais recursos para os cofres públicos para ampliar os projetos sociais ? Ou estariam adstritos apenas e tão somente ao fato de que 97% (noventa e sete por cento) da receita proveniente da arrecadação tributária federal, é utilizada para prover, abastecer e sustentar o burocrático e deficiente aparelho estatal ?
Até onde se tem conhecimento, a atribuição constitucional de competência tributária compreende a competência legislativa plena, ressalvadas as limitações contidas na Constituição Federal, nas Constituições dos Estados e nas Lei Orgânicas do Distrito Federal e dos Municípios, conforme prescrito no artigo 6º do Código Tributário Nacional.
Neste particular, me parece que a Medida Provisória n. 232 de 30 de Dezembro de 2004, além de arbitrária, está a fazer letra morta inúmeros preceitos constantes em Lei, dentre os quais, o disposto no artigo 150 da Constituição Federal.
Pois, conforme prescrito no texto constitucional, tem-se que, sem prejuízo de outras garantias asseguradas ao contribuinte, é vedado à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios, exigir ou aumentar tributo sem lei que o estabeleça.
E não só isso. Tenho que a Medida Provisória, não é e nunca foi o instrumento legislativo adequado para tratar de questões de ordem tributária, especialmente se forem editadas para aumentar a arrecadação e restringir e/ou suprimir direitos fundamentais dos contribuintes.
Entretanto, ao que parece tais preceitos que deveriam ser respeitados pelo Poder Executivo, de sorte a assegurar a segurança jurídica e a estabilidade necessária para a preservação da paz social, como garantia à prevalência das Instituições Democráticas e do Estado de Direito, são, infelizmente deixados de lado em favor da “fanfarrice tributária”!
O que a sociedade espera, é que o Congresso Nacional tenha a sensibilidade de, ao apreciar a malsinada Medida Provisória, rejeitá-la, diante dos nefastos efeitos que podem atingir de morte os prestadores serviços, e que não se cale frente as absurdas e imorais medidas governamentais que visam apenas e tão somente elevar o pesado fardo que gloriosamente é suportado pelos contribuintes brasileiros !
Gilberto Marques Bruno é sócio do escritório Marques Bruno Advogados Associados em São Paulo, Tributarista e especialista em Direito Empresarial, Direito Público e Direito sobre Internet