Execução penal: o Direito do preso a obter um atestado anual em que conste sua pena a cumprir

Renato Flávio Marcão

Membro do Ministério Público do Estado de São Paulo.
Mestre em Direito Penal, Político e Econômico
Especialista em Direito Constitucional.
Professor de Direito Penal, Processo e Execução Penal (Graduação e Pós)
Coordenador Cultural da Escola Superior
do Ministério Público do Estado de São Paulo
Sócio-fundador e Presidente da AREJ – Academia
Rio-pretense de Estudos Jurídicos, e ex-Coordenador
do Núcleo de Direito Penal, Processo Penal e Criminologia.
Membro da Association Internationale de Droit Pénal (AIDP)
Membro Associado do Instituto Brasileiro de Ciências Criminais (IBCCrim)
Membro do Instituto de Ciências Penais (ICP)
Membro do Instituto de Estudos de Direito Penal e Processual Penal
Membro da Comissão Regional de Bioética e Biodireito da OAB –
São José do Rio Preto-SP
Autor do livro: Lei de Execução Penal Anotada (Saraiva, 2001)

SUMÁRIO: 1. Introdução: deveres e direitos do preso; 2. O Projeto de Lei 3206/00; 3. Sobre a necessidade de se assegurar tal direito por lei nova; 4. Conclusão.

1. Introdução: deveres e direitos do preso

Como atividade complexa que é, em todos os sentidos, a execução penal pressupõe um conjunto de deveres e direitos envolvendo o Estado e o condenado, de tal sorte que, além das obrigações legais inerentes ao seu particular estado, o condenado deve submeter-se a um conjunto de normas de execução da pena.
Referidas normas, traduzidas em deveres, representam, na verdade, um código de postura do condenado perante a Administração e o Estado, pressupondo formação ético-social muitas vezes não condizente com a própria realidade do preso.
Paralelamente aos deveres há um rol de direitos do preso.
A execução penal, no Estado Democrático e de Direito, deve observar estritamente os limites da lei e do necessário ao cumprimento da pena e da medida de segurança. Tudo o que excede aos limites contraria direitos.
Nos termos do art. 41 da Lei de Execução Penal, são direitos do preso: I – alimentação suficiente e vestuário; II – atribuição de trabalho e sua remuneração; III – previdência social; IV – constituição de pecúlio; V – proporcionalidade na distribuição do tempo para o trabalho, o descanso e a recreação; VI – exercício das atividades profissionais, intelectuais, artísticas e desportivas anteriores, desde que compatíveis com a execução da pena; VII – assistência material, à saúde, jurídica, educacional, social e religiosa; VIII – proteção contra qualquer forma de sensacionalismo; IX – entrevista pessoal e reservada com o advogado; X – visita do cônjuge, da companheira, de parentes e amigos em dias determinados; XI – chamamento nominal; XII – igualdade de tratamento, salvo quanto às exigências da individualização da pena; XIII – audiência especial com o diretor do estabelecimento; XIV – representação e petição a qualquer autoridade em defesa de direito; XV – contato com o mundo exterior por meio de correspondência escrita, da leitura e de outros meios de informação que não comprometam a moral e os bons costumes.
É bem verdade que o artigo 41 estabelece um vasto rol onde estão elencados o que se convencionou denominar direitos do preso. Quer nos parecer, entretanto, que referido rol é apenas exemplificativo, pois não esgota, em absoluto, os direitos da pessoa humana, mesmo daquela que se encontra presa, e assim submetida a um conjunto de restrições.
Também em tema de direitos do preso, a interpretação que se deve buscar é a mais ampla no sentido de que tudo aquilo que não constitui restrição legal decorrente da particular condição do sentenciado, permanece como direito seu.

2. O Projeto de Lei 3206/00

Discute-se no Congresso Nacional o PL 3206/00, que reconhece como direito do preso a obtenção de um atestado anual no qual conste a pena a cumprir, a ser emitido pelo juiz da execução. Tal proposta encontra-se sob relatoria do Deputado Ricardo Barros (PP-PR).

3. Sobre a necessidade de se assegurar tal direito por lei nova

Sem pretender estabelecer reflexões filosóficas mais profundas, é possível dizer, por aqui, de uma forma bastante singela, que a lei, como um dos instrumentos de pacificação social, deve ser feita para regular fatos e situações, visando resguardar direitos. Deve servir como um instrumento de Justiça, e para tanto deve ser editada quando necessária.
O descontrole na edição leis, muitas vezes desnecessárias e equivocadas, tem levado diversos juristas, com razoável freqüência, a tecer críticas as mais contundentes, fato já percebido não só pela comunidade jurídica, mas por toda a sociedade.
Em momentos de grave crise social, em que a insegurança pública não sai do debate e a todos perturba, é até normal que o Congresso Nacional busque com maior volúpia a produção de leis. Contudo, é preciso redobrar o cuidado para não cair no ridículo.
Com efeito, não nos parece haver necessidade, quiçá prioridade, em propor à discussão e votação, texto de Projeto de Lei que vise reconhecer direito do preso à obtenção de um atestado anual no qual conste a pena a cumprir, a ser emitido pelo juiz da execução.
Qualquer profissional ou estudioso que tenha mínima intimidade com a Lei de Execução Penal, e/ou contato com o processo de execução da pena, sabe ou deveria saber que com considerável freqüência se elabora, no apenso de liquidação de penas, a atualização da conta de liquidação, isso, várias vezes ao ano, e que a cada atualização o preso recebe (ou pelo menos deveria receber) uma cópia da conta de liquidação atualizada, onde consta não só o tempo de pena que lhe resta cumprir, mas a pena cumprida e extinta, eventual detração, remição, datas prováveis para obtenção de benefícios como progressão de regime, livramento condicional etc.
Sabe-se ainda que a execução penal reclama observância a princípios como o do contraditório, da ampla defesa, do devido processo legal etc. Daí decorre a indispensável presença de um advogado no processo executivo, atuando na defesa dos interesses do executado, ao lado do Ministério Público, que aqui atua como fiscal da Lei (art. 67 da Lei de Execução Penal).
E então surgem duas simples perguntas (onde caberiam centenas):
1. Qual a real necessidade da mudança pretendida?
2. Em que melhorará a vida do preso a elaboração de um texto de lei com a redação que se pretende?

4. Conclusão

Por acreditar que as conclusões adequadas já fora extraídas por cada um que passou os olhos sobre o texto acima, resta concluir com outra pergunta:
Será que não há mais nada de importante e inteligente para se fazer em termos de Lei?

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