Por Carlos Henrique Abrão
Em tempos de crise e grande desigualdade social, vem à baila o tema que desafia a todos a respeito do imposto sobre grandes fortunas.
Apresentamos graves assimetrias provenientes dos modelos social, tributário e econômico, além de um perfil de concentração de riqueza, aliado à má distribuição de renda, cuja performance tributária azeda as relações entre pobres e ricos.
A globalização fez com que muitos brasileiros passassem a figurar no rol dos bilionários, mas, ao menos tempo, a ONU classifica o país como sendo o quarto pior em distribuição de riqueza e distanciamento entre as classes sociais.
Evidente que a tributação iníqua, que ataca assalariados e tantas atividades, que nada repercute, desestimula atividade produtiva, mais ainda quando enxergamos poucas perspectivas de melhora.
O imposto sobre grandes fortunas teria o escopo de atingir um número limitado de pessoas jurídica e física que pudessem ter capacidade contributiva e, assim, recolhessem aos cofres do governo importâncias relevantes para sairmos da crise e combatermos as desigualdades.
A linha de pobreza aumenta, pois não tivemos, na realidade, uma distribuição de renda, e sim de crédito para que as classes menos favorecidas pudessem consumir e, em contrapartida, aumentassem o endividamento, gerando incerteza e grau elástico de inadimplência.
A Constituição Federal disciplinou o imposto sobre grandes fortunas, mas, até hoje, a matéria está parada no Parlamento, sem avanços. É certo que várias nações que introduziram o modelo colheram mais resultados negativos do que positivos.
A França vem garimpando sua essência e o atual presidente, Hollande, mostra-se incentivador desse imposto para que os mais favorecidos pelo modelo efetivamente contribuam para redução das assimetrias.
Os grandes bilionários do planeta já acenaram favoravelmente e se dispuseram a colaborar, desde os agentes do mercado financeiro, como diretores e controladores do nicho de informática.
No Brasil, o imposto sobre grandes fortunas traria várias contribuições. A primeira, de formar um colchão permitindo uma economia de investimentos em setores abalados pela crise. A segunda, de fazer o inverso do modelo tributário fazendo com que os mais capazes colaborem com recursos elevados e, por fim, produzir um custo social adequado ao perfil do Estado moderno.
Em suma, o imposto sobre grandes fortunas sinaliza uma instigante proposta de atrair aos mais abastados em favor dos menos favorecidos, cujo papel institucional do Estado somaria esforços para distribuir entre todos, tratando desigualmente aos desiguais.
Em pleno século XXI, os níveis destacados pela ONU revelam despreparo no setor de saneamento básico, infraestrutura, habitação e condições básicas de higiene e saúde, somente estando à frente de três outros países em toda América, o que não dignifica o modelo e, muito menos, é auspicioso.
Como tributar grandes fortunas, eis o grande problema. Pelo valor que representam, pela especificidade de seus ganhos, ou, ainda, pela maleabilidade de sua atuação globalizada? Caberá ao legislador ordinário adotar o melhor mecanismo que implantará uma realidade, já que tantos tributos e impostos setoriais soçobraram no Brasil.
Temos hoje, em destaque, mais de 50 brasileiros que integram a relação de bilionários, com a perspectiva de colaboração efetiva para o modelo, além de grandes empresas que dependem dos demonstrativos financeiros e seus balanços.
Não é sem razão que muitos optam por ter domicílio tributário em países que não tributam mais fortemente, o que privilegia a administração da riqueza, sem quaisquer incidências mais elevadas.
Em muitos países desenvolvidos, o fato provocou a mudança, de tal sorte que preferem sair do país do que contribuir em impostos, colocando a mão no bolso.
A experiência precisa ser implementada no Brasil, antes tarde do que nunca, para ter uma latitude maior e contribuir decisiva e definitivamente para redução das injustiças sociais.
Quando o Estado não consegue fazer seu papel de redesenhar as assimetrias, melhor se torna impedir novas e graves situações que geram violência, marginalidade e criminalidade, por meio da tributação de grandes fortunas, um remédio que pode servir de contributo à redução das desigualdades sociais inaceitáveis no território pátrio.
Carlos Henrique Abrão é desembargador do Tribunal de Justiça de São Paulo.