Indicação do presidente Donald Trump para a Suprema Corte dos EUA

Autor:  Leonardo Corrêa (*)

 

Há uma grande euforia entre os conservadores brasileiros quanto ao indicado para a Suprema Corte dos Estados Unidos, pelo presidente Donald Trump, para ocupar o lugar do finado justice Antonin Scalia. Ao anunciar o nome do judge Neil Gorsuch, o presidente americano disse que cumpria a sua promessa, pois seu escolhido guardaria relação com o controverso — mas, absolutamente brilhante — Scalia. Será, mesmo?

Antonin Scalia, de origem italiana, foi indicado pelo presidente Ronald Reagan. Passou pelas Confirmation Hearings (sabatinas) com votação unânime. Caso raríssimo, tão excepcional quanto seu currículo em que todas as notas de sua vida foram “A” – equivalente a um “10” no Brasil.  Independentemente de suas convicções, Scalia era profundamente respeitado e tinha uma cultura vastíssima. Mas, por óbvio, a consolidação de um justice e sua influência na corte levam tempo.

É muito cedo para saber, exatamente, como o judge Neil Gorsuch será percebido, nem, tampouco, como se comportará na corte se for efetivamente confirmado. Quando iniciarem as Confirmation Hearings, no Congresso americano, será possível ter uma impressão melhor sobre o indicado. Seria prematuro presumir que ele agirá na corte nos moldes de Scalia. Por exemplo, Sandra Day O’Connor e Anthony Kennedy, ambos indicados por Reagan, não corresponderam aos anseios do então presidente. Não fosse só isso, é preciso ter em mente que o processo de sabatina nos EUA é bem intenso. Todavia, a favor do indicado, vale dizer que o professor Stephanos Bibas, da University of Pennsylvania, o descreveu como “um dos melhores juízes dos Estados Unidos. Em mais de uma década como juiz e servidor público, ele conquistou uma reputação pelo brilhantismo, clareza, bela escrita e imparcialidade”.

Apenas para se ter uma ideia, o justice Clarence Thomas — indicado para a vaga de Thurgood Marshall — ficou em sabatina do dia 10 de setembro de 1991 até 15 de outubro do mesmo ano. Houve uma “guerra” e a votação final foi extremamente apertada: 52 votos a 48. Nesse episódio, a vida pessoal de Thomas foi revirada, havendo, inclusive, alegações não provadas de um suposto assédio sexual. O jogo é pesado!

Chegar a Suprema Corte é um exercício extremamente difícil e penoso. As sabatinas não são procedimentos meramente formais. Muito ao revés, há questionamentos intensos feitos — inclusive — pelos mais respeitados professores das universidades americanas, que também dão suporte aos senadores.

Notório saber jurídico é, apenas e tão somente, o primeiro passo. O candidato a uma vaga na Suprema Corte precisa ter uma vida impecável. Quem acompanhar as Confirmations Hearings verá questionamentos sobre diversos pontos, dentre eles a questão do aborto decidida no caso Roe vs. Wade, além de matérias tocantes ao Federalismo e a separação de poderes.

Enfim, conquanto os conservadores estejam empolgadíssimos, nada é certo e o judge Neil Gorsuch não está, a priori, sentado na cadeira do finado Antonin Scalia. Para tanto, ele precisará enfrentar — se se permite uma figura de linguagem — um verdadeiro purgatório. Sua vida será devassada. A alegria no rosto de sua consorte, no momento da nomeação, poderá ser convertida em lágrimas como ocorreu no caso do atual justice Samuel Alito, bombardeado com questionamentos pesadíssimos. Nada, portanto, está decidido. O jogo está apenas começando.

Vale acrescentar, ainda, que a negativa quando a indicação do chief judge Merrick Brian Garland — indicado, em 16 de março de 2016, pelo então [residente Barack Obama — pode ter um papel importante na sabatina do judge Neil Gorsuch. Os Democratas, provavelmente, dificultarão a aceitação do indicado.

Pois bem. Para terminar, é importante desconstruir a ideia de que há um novo Scalia. Nunca haverá um Justice como ele. Não só pelo fato de as pessoas serem diferentes, mas, principalmente, em razão das suas particularidades. Foi ele, por exemplo, quem inaugurou os duríssimos questionamentos aos advogados que realizam sustentações orais perante a corte. Foi ele, também, quem trouxe um pouco de arte e literatura nas decisões.

Não raras vezes, Scalia transcrevia frases de Cole Porter em seus votos. Além disso, o finado Justice era famoso pelas críticas aos colegas em suas opiniões vencidas. Apesar disso, Scalia — respeitando profundamente a sua posição na Corte – evitava comentários públicos sobre seus colegas. Falar simplesmente em um novo Scalia, dessa forma, é mero discurso populista, o que, de forma alguma, contudo, desmerece o ilustre indicado para a sua vaga na corte.

 

 

 

 

 

Autor:  Leonardo Corrêa  é advogado e LL.M. pela Universidade da Pensilvânia (EUA).


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