A Lei nº 9.711, de 20 de novembro de 1998 alterou o artigo 31 da Lei nº 8.212, de 1991, que passou a prever o seguinte:
Art. 31. A empresa contratante de serviços executados mediante cessão de mão de obra, inclusive trabalho temporário, deverá reter onze por cento do valor bruto da nota fiscal ou fatura de prestação de serviços e recolher a importância retida até o dia dois do mês subsequente ao da emissão da respectiva nota fiscal ou fatura, em nome da empresa cedente da mão de obra, observado o disposto no § 5º do artigo 33.
§ 1º O valor retido de que trata o caput , que deverá ser destacado na nota fiscal ou fatura de prestação de serviços, será compensado pelo respectivo estabelecimento da empresa cedente da mão de obra, quando do recolhimento das contribuições destinadas à Seguridade Social devidas sobre a folha de pagamento dos segurados a seu serviço.
§ 2º Na impossibilidade de haver compensação integral na forma do parágrafo anterior, o saldo remanescente será objeto de restituição.
§ 3º Para os fins desta lei, entende-se como cessão de mão de obra a colocação à disposição do contratante, em suas dependências ou nas de terceiros, de segurados que realizem serviços contínuos, relacionados ou não com a atividade fim da empresa, quaisquer que sejam a natureza e a forma de contratação.
§ 4º Enquadram-se na situação prevista no parágrafo anterior, além de outros estabelecidos em regulamento, os seguintes serviços:
I – limpeza, conservação e zeladoria;
II – vigilância e segurança;
III – empreitada de mão de obra;
IV – contratação de trabalho temporário na forma da Lei n. 6.019, de 3 de janeiro de 1974.
§ 5º O cedente da mão de obra deverá elaborar folhas de pagamento distintas para cada contrante.
Como muitas empresas mantém contratos onde há o fornecimento de serviços, passamos a tecer os comentários abaixo.
TERMINOLOGIA.
Utilizaremos a seguinte terminologia para esclarecer o assunto:
estabelecimento: o lugar onde os serviços são executados;
prestador: a empresa contratada para executar os serviços;
tomador: a empresa para a qual os serviços são prestados;
QUAIS OS SERVIÇOS QUE ACARRETARÃO A RETENÇÃO?
Pelo texto da lei, todos os serviços em que há o fornecimento de mão de obra no estabelecimento do tomador. O fornecimento deve ser contínuo, ou seja, o contrato deve ser contínuo, não havendo necessidade de haver a disponibilização de pessoal todos os dias. O critério a ser usado para distinguir as situações é um só: se os serviços são executados no estabelecimento do prestador ou no do tomador. Se forem realizados no estabelecimento do tomador, a retenção será devida. Esse é o caso dos serviços de manutenção de elevadores, que não são possíveis de executar nas dependências ou no estabelecimento do prestador.
Essa situação abrange contratos como os seguintes, além dos já discriminados na lei:
manutenção de elevadores e equipamentos (como por exemplo de computadores, aparelhos e centrais de telefone, veículos, máquinas etc), quando os serviços forem prestados no estabelecimento do tomador. Os serviços de manutenção, quando prestados no estabelecimento do prestador, não estão abrangidos pela retenção. Assim, se o prestador conserta uma máquina ou veículo em seu estabelecimento, não haverá retenção (é o caso das oficinas mecânicas e de computadores);
serviços de desenvolvimento de software, quando prestados no estabelecimento do tomador. Se o tomador adquirir software, mas não houver nenhum serviço de manutenção ou desenvolvimento dos programas prestados em seu estabelecimento (é o caso de programas de computador chamados de prateleira), a retenção não é devida;
quaisquer outros contratos onde o prestador encaminha ao estabelecimento do tomador as pessoas (empregados) que executarão os serviços.
Não haverá retenção:
em contratos de assessoria;
em contratos firmados com advogados que prestam serviços em seus próprios escritórios. Se os advogados contratados trabalharem nas dependências da empresa, a retenção é cabível;
em contratos de assistência técnica e manutenção de bens e equipamentos (incluindo softwares), quando o prestador executa os serviços em seu estabelecimento.
COMO FICAM AS PRESTAÇÕES DE SERVIÇOS EM QUE HÁ FORNECIMENTO DE PRODUTOS OU MERCADORIAS.
Em todos os contratos de prestação de serviços é possível a utilização de bens, que são consumidos na execução dos trabalhos.
Para que a retenção não incida sobre as mercadorias fornecidas, é aconselhável que o prestador emita duas notas fiscais, correspondendo uma às mercadorias (onde incidirá o ICMS) e outra aos serviços (na qual incidirá o INSS e o Imposto sobre Serviços – ISS). Apenas sobre o valor destas últimas é que haverá a retenção.
Todavia, é necessário analisar cada caso concreto, pois poderá haver conflito entre o INSS e a fiscalização do ICMS em relação a tais operações. Um exemplo disso é a contratação do fornecimento de uma máquina industrial montada: sobre o valor total da operação incidirá o ICMS, não havendo que se falar em serviços de montagem quando a máquina é comprada pronta, instalada, caso em que a responsabilidade pela sua confecção é inteira do prestador. Outro exemplo é a compra de um elevador: se o bem é entregue ao comprador montado, não há retenção de INSS.
Caso o prestador não emita duas notas separadas, a retenção recairá sobre o valor da única nota fiscal que emitir, caso refira-se ou tenha como elemento preponderante a prestação de serviços.
QUANDO DEVE SER FEITA A RETENÇÃO?
O prestador presta serviços num período (que pode ser mensal). Depois de prestados, emite a nota, podendo a emissão desse documento ser feita logo no mês seguinte ao em que os trabalhos foram executados. Se isso acontecer, o valor retido será recolhido ao INSS pelo tomador somente no dia dois do mês subsequente ao da emissão da nota fiscal.
Entretanto, é aconselhável tomar os seguintes cuidados: se o prestador emitir a nota fiscal dentro do mês em que os serviços são prestados, a retenção será feita logo no dia 2 do mês seguinte, possivelmente antes mesmo do pagamento do saldo devido ao prestador dos serviços.
Para um planejamento tributário adequado, é aconselhável que seja observado o seguinte procedimento:
o prestador emite a nota fiscal no primeiro dia do mês subsequente ao em que os serviços forem executados;
o tomador paga o valor devido (o saldo da nota fiscal) ao prestador na data ajustada no contrato, efetuando a retenção da contribuição, mas recolhendo o valor ao INSS somente no dia 2 do mês seguinte;
mesmo assim, o prestador, ante o destaque na nota fiscal da retenção, poderá efetuar a compensação das contribuições devidas com a retida no mesmo mês em que fizer o pagamento de sua folha de salários.
Exemplo: uma empresa de limpeza e conservação presta serviços ao tomador no mês de fevereiro de 1999, emitindo a nota fiscal no dia 1º de março e destacando o INSS retido. O tomador paga o saldo da nota fiscal ao prestador na data descrita no contrato, recolhendo o valor devido ao INSS no dia 2 de abril de 1999. Ao fazer o pagamento de seus empregados no 5º dia útil do mês de março, o prestador dos serviços, de posse da nota fiscal com o destaque da contribuição retida pelo tomador, compensará o valor que foi retido com a contribuição social a cargo de seu estabelecimento. Se o prestador emitir no mês de fevereiro a nota fiscal de serviços, o tomador terá que reter e que recolher no dia 2 de março o valor respectivo.
O VALOR DA RETENÇÃO DEVE SER ACRESCIDO AO VALOR DA NOTA?
Não é acrescido, mas descontado o valor retido do total da nota ou fatura. A situação é equivalente à do Imposto de Renda Retido na Fonte.
Assim, se os serviços contratados somam R$ 10.000,00, a retenção será de R$ 1.100,00, pagando-se ao prestador o saldo de R$ 8.900,00.
Havendo o emprego de materiais, com a emissão de nota fiscal relativa a eles, a retenção incidirá apenas sobre os serviços.
Exemplo:
Valor dos serviços: R$ 10.000,00
Valor das mercadorias: R$ 2.000,00
Total: R$ 12.000,00
Retenção do INSS:
Base de cálculo: R$ 10.000,00
Alíquota: 11 %
Valor: R$ 1.100,00
Valor líquido a pagar ao prestador:
Saldo da nota de serviços: R$ 8.900,00
Valor das mercadorias: R$ 2.000,00
Total: R$ 10.900,00
O QUE FAZER SE O PRESTADOR NÃO DESTACAR O VALOR DA RETENÇÃO?
Nesse caso o tomador dos serviços promoverá a retenção independentemente do destaque, inserindo nas vias da nota fiscal ou fatura que ficarem em seu poder as informações pertinentes a esse fato.
Poderá pedir ao prestador que forneça uma carta de correção, mantendo-a em seus arquivos para controle.
E SE O PRESTADOR SE RECUSAR A RECEBER O SALDO DEVIDO?
A saída para esses casos é uma medida judicial chamada consignação em pagamento, consistente numa ação onde o tomador dos serviços propõe o pagamento em juízo do valor devido.
Se a medida não for usada, o tomador dos serviços corre o risco de, pagando o valor integral da nota fiscal de serviços ao prestador, ser cobrado pelo INSS da quantia correspondente à retenção, acrescida de juros, multa e correção monetáira.
Como se trata de retenção, é possível também abertura de inquérito policial para apurar crime de sonegação fiscal.
E SE O CONTRATO DE SERVIÇOS NÃO PREVIU A RETENÇÃO? ELA PODERÁ SER REPASSADA AOS PREÇOS DOS SERVIÇOS?
Como se trata de tributo que recai sobre fatos praticados pelo prestador dos serviços, o seu repasse não é possível. Noutras palavras, é o prestador quem assume o encargo financeiro decorrente dessa retenção.
De qualquer maneira, é de se ter em conta que as despesas com o pagamento das contribuições sociais que recaem sobre a folha de salários são do prestador e não do tomador dos serviços. Este último, por sinal, nem terá interesse em discutir o assunto pois as retenções afetam unicamente o prestador dos serviços.
Por isso, o repasse não é possível.
E SE A RETENÇÃO FOR MAIOR QUE O VALOR DEVIDO?
O prestador dos serviços poderá compensar as contribuições retidas com as devidas ao INSS em razão do pagamento de salários aos seus empregados.
Como a lei não faz distinção, essa compensação atingirá tanto as contribuições descontadas dos empregados como aquelas de responsabilidade da própria empresa.
Entretanto, há contribuições que são arrecadadas no interesse de outras entidades, como o salário educação e as contribuições devidas ao SESI, SESC, SENAC, SENAI etc. A retenção não poderá ser compensada com os valores devidos a esses órgãos, pois o INSS não tem a disponibilidade desses recursos.
Se a retenção for superior ao valor devido, a diferença terá que ser devolvida pelo INSS. Pelo texto da lei, não será possível acumular essas diferenças para depois compensá-las com outras contribuições no futuro.
De qualquer maneira, se existirem débitos relativos a outras contribuições a cargo do INSS, será admitida a compensação com os mesmos, eis que o INSS não promoverá a restituição a devedores inadimplentes.
SE A EMPRESA EMPREGAR POUCA MÃO DE OBRA NOS SERVIÇOS QUE CONTRATAR, NÃO HÁ COMO ESCAPAR DA RETENÇÃO?
O uso de novas tecnologias e também a busca da eficiência causará esse tipo de distorção, onde algumas empresas ficarão sujeitas a uma retenção bem maior que o valor das contribuições efetivamente devidas.
Nesses casos, a saída é ingressar com medida judicial, onde pode ser pleiteada a concessão de liminar ou de antecipação de tutela, para o fim de a retenção ser feita dentro dos valores efetivamente devidos (com base nas folhas de salários individualizadas) ou para que os tomadores dos serviços da empresa interessada não promovam o desconto e retenção.
SE A EMPRESA UTILIZAR OS MESMOS EMPREGADOS EM TODOS OS CONTRATOS QUE POSSUI COM SEUS TOMADORES, COMO IRÁ ELABORAR FOLHAS DE PAGAMENTO DISTINTAS?
O INSS não regulamentou essa situação.
É aconselhável que a empresa prestadora de serviços confeccione várias folhas de pagamento, embora com os mesmos empregados, distribuindo entre os tomadores de seus serviços o valor da remuneração paga aos trabalhadores. Noutras palavras, fará cada folha com um pedaço da remuneração do empregado que trabalha em mais de um estabelecimento.
SE O PRESTADOR DE SERVIÇOS POSSUIR CONTRATOS ONDE A RETENÇÃO É INFERIOR AO VALOR DEVIDO, MAS, SIMULTANEAMENTE, TIVER OUTROS EM QUE A RETENÇÃO É MAIOR? PODE COMPENSAR ESSES VALORES?
A compensação é feita não entre cada contrato, mas tomando-se em conta a soma de todas as retenções, realizadas por um mesmo cliente (que toma serviços em vários estabelecimentos) ou vários, em confronto com a soma de todos os valores devidos em dado mês.
Assim, pode acontecer que uma empresa possua um contrato onde há apenas um empregado, correspondendo a retenção a uma cifra muito maior que a devida, e, simultaneamente, ela também preste serviços a outro estabelecimento onde a folha de pagamento é maior, mas pelo mesmo preço. Compensará, então, as somas dessas importâncias.
Exemplo:
estabelecimento tomador
valor da retenção sobre a nota fiscal de serviços
valor das contribuições sobre a folha de pagamento
saldo
devedor ou
credor
A
R$ 1.000,00
R$ 1.500,00
R$ 500,00 devedor
B
R$ 1.300,00
R$ 1.300,00
R$ 00,00 –
C
R$ 2.000,00
R$ 1.400,00
R$ 600,00 credor
soma
R$ 4.300,00
R$ 4.200,00
R$ 100,00 credor (*)
(*) valor a restituir
E SE O INSS NÃO RESTITUIR OS VALORES RETIDOS EM QUANTIAS SUPERIORES ÀS DEVIDAS?
Nesse caso a empresa terá a opção de compensar essas importâncias com as de outras contribuições devidas, mesmo em atraso.
Se inexistirem contribuições em atraso devidas ao INSS, a saída será ingressar com ação de repetição de indébito.
Tanto a restituição como a compensação deverão ser feitas com atualização monetária, hoje calculada de acordo com a variação da SELIC.
É VÁLIDA ESSA RETENÇÃO?
Pelo que se percebe, a lei está alterando tanto a base de cálculo quanto o fato gerador das contribuições sociais devidas ao INSS. Pelo texto do artigo 195, inciso I da Constituição Federal, a base de cálculo dessas contribuições corresonde à folha de salários, ao passo que o fato gerador acontece, por consequência, com o pagamento dos salários às pessoas que mantém vínculo empregatício com a empresa. A lei está adotando como base de cálculo o valor da nota-fiscal de serviços, que é faturamento, e, como fato gerador, o pagamento ao prestador dos serviços, quando o correto é o pagamento de salários aos empregados deste.
Por isso, é viável a discussão a propósito da constitucionalidade desses dispositivos que previram a retenção das contribuições sobre valores de notas fiscais de serviços.
A retenção estaria correta se obrigasse o tomador dos serviços, de posse da folha de pagamento do prestador, a recolher a contribuição ao INSS.
Autor : José Rubens Hernadez