por Ivan Ricardo Garisio Sartori
Questão que tem afligido seriamente os Estados, mais precisamente seus Judiciários e jurisdicionados, é a da competência federal suplementar. Como a Justiça Federal não tem condições de assumir sua competência plenamente, por não ter efetivo e instalações suficientes, as Justiças dos Estados, mormente nas comarcas do interior, têm feito a vez daquela, processando e julgando causas previdenciárias, execuções da Fazenda Nacional e de autarquias, os embargos pertinentes, etc.
Tal suplementação competencial encontra espeque no art. 109, parágrafo 3o, da CF, e no art. 15 da Lei 5.010/66.
Todavia, o movimento de muitas das comarcas dos Estados, por conta desses feitos, chega a volumes impressionantes, mesmo nos juizados especiais estaduais, que, por formarem malha de ampla extensão, têm feito mais do que a própria Federal na esfera de competência desta.
Em Catanduva, tem o signatário informe de que há cerca de 2.000 feitos do âmbito federal em cada vara cível, que são três, totalizando 6.000 processos, afora as execuções fiscais, mais 2.000, aproximadamente, no montante global de 8.000 feitos.
Em Jacareí, sempre segundo informações fornecidas pelos respectivos juízes, há 3.000 revisionais previdenciárias e mais 3.000 execuções.
Em Botucatu, há notícia de que a Justiça Federal deixou de instalar vara local porque o expressivo volume de serviço tornaria inviável a providência, em iniciando a nova célula já completamente sufocada.
A situação não é outra nas demais comarcas do País, tantas as reclamações dos magistrados responsáveis por esse trabalho a maior.
Isso tem trazido desmarcados transtornos para os Estados, que se vêem assoberbados com esses feitos, os quais, a rigor, não são de sua competência, em prejuízo hialino aos processos de sua jurisdição, inclusive os que dizem com a cidadania, como as ações de estado e as alimentares, a par de outras tantas.
O pior de tudo é que a União não tem fornecido qualquer estrutura para tanto e nem remunera os juízes dos Estados por esse “plus” laboral significativo, em detrimento de princípios básicos que vedam o trabalho gratuito e o enriquecimento sem causa, enquanto prédios de foruns pelo Brasil afora, que acabam servindo à Federação, estão à mingua, sem estrutura, sem segurança e muitos em franca deterioração.
A omissão dos Tribunais de Justiça também merece relevo, porque nada se fez até agora para que a Justiça Federal assuma essa competência, que é sua, ou para que a União propicie estrutura bastante, a qual poderia vir em forma, e. g., da informatização e conservação dos prédios, por conta desse trabalho hercúleo.
O problema vem desde a criação da Justiça Federal e, a meu aviso, nunca foi abordado com firmeza pelos Tribunais dos Estados.
Resultado, o que era provisório passou a ser definitivo e os juízes dos Estados, verdadeiros curingas, seguem com suas comarcas emperradas, trabalhando além do limite de suas forças e graciosamente, para receberem toda a crítica por conta desse entrave.
É preciso mudar a mentalidade. Se a Justiça Federal existe, ela deve assumir plenamente sua competência, de modo a não inviabilizar as dos Estados, a custos elevadíssimos, quer social, quer político e moral, quer material.
Fica, então, o registro, na esperança de que as autoridades administrativas competentes se sensibilizem com o problema e passem, sem delongas, do projeto à ação, a exemplo da Justiça do Trabalho, que passou a retirar substancialmente suas causas dos Judiciários dos Estados, aí também servindo de curinga por muitos anos.
Ivan Ricardo Garisio Sartori é juiz do Tribunal de Alçada Criminal de São Paulo.