Legislação de patentes não protege espécies vegetais

por Tatiana Fonseca

A Lei de Propriedade Industrial 9279/96 determina que para um “objeto” ser protegido, este tem que obedecer às condições de patenteabilidade. Para isto, a idéia ou criação tem que ser materializada ou concretizada de tal forma que possa ser industrializada. E deve apresentar um avanço tecnológico no setor técnico a que se destina. Em outras palavras, deve ser um “objeto” concreto e ter aplicabilidade industrial, além de envolver novidade e atividade inventiva.

A Lei de Propriedade Industrial Brasileira (e até mesmo a de outros países) também determina que alguns tipos de criações não sejam considerados invenção e excluí de proteção alguns tipos de criações, as quais relaciona como não sendo patenteáveis.

Seres-vivos naturais não são patenteáveis

Na área vegetal, devemos levar em consideração as seguintes exclusões legais: o todo ou parte de seres vivos naturais e materiais biológicos encontrados na natureza, ou ainda que dela isolados, inclusive o genoma e o germoplasma de qualquer ser vivo natural ou os processos biológicos naturais, não são considerados invenções.

Da mesma forma, o todo ou parte dos seres vivos, exceto os microorganismos transgênicos que atendam aos três requisitos de patenteabilidade — novidade, atividade inventiva e aplicação industrial — e que não sejam mera descoberta, não são consideradas matérias patenteáveis.

Patente para processos de obtenção

Sendo assim, de acordo com a legislação de patentes, as variedades vegetais (cultivares) ficaram excluídas deste tipo de proteção, o que trouxe dificuldades para os centros de pesquisa e desenvolvimento em agricultura, uma vez que estes não poderiam receber o retorno de seus investimentos em pesquisa e desenvolvimento.

Por outro lado, os processos de obtenção de novas variedades vegetais podem ser protegidos por meio de uma patente. Mas este processo deve ser novo e possuir atividade inventiva, além de não poder ser um processo biológico natural.

Em decorrência da necessidade de criar um Organismo que garantisse a proteção de variedades vegetais surgiu a Lei de Proteção de Cultivares – 9456/97. Esta lei prevê a proteção e a definição de “cultivar”, “nova cultivar” e “cultivar essencialmente derivada”.

Por meio desta Lei, estimulam-se investimentos no desenvolvimento de novas variedades vegetais e impede-se a comercialização de variedades protegidas, por parte de terceiros não autorizados. Esta proteção abrange o material de reprodução ou multiplicação comercial da cultivar em questão, em todo o território brasileiro, pelo prazo de 15 anos.

A exceção recai sobre as videiras, árvores frutíferas, florestais e ornamentais, para as quais a duração é de 18 anos, ambos contados a partir da data de concessão do Certificado Provisório.

O critério da utilidade econômica

Na legislação de cultivares, não se exige invenção stricto senso. O critério relevante é a utilidade econômica. A novidade é apenas comercial, ou seja, é considerada nova a cultivar que não tenha sido oferecida à venda no Brasil há mais de 12 meses, em relação à data do pedido de proteção. Em outros países, esse prazo é de seis anos, para espécies de árvores e videiras, e quatro anos para as demais espécies.

Um requisito comparável ao da novidade das patentes é a diversidade. A variedade vegetal deve ser distinta de outras de conhecimento geral, seja por sua cor, resistência a pragas, entre outras características da variedade vegetal.

O critério de homogeneidade implica em que os vários exemplares de uma mesma variedade vegetal tenham similaridades suficientes entre si para merecer sua identificação varietal.

O critério de estabilidade implica em que, após várias séries de reprodução ou propagação, a variedade vegetal mantenha suas características descritas. Também é imprescindível que a variedade vegetal a ser protegida possua uma denominação própria, de acordo com os critérios legais.

A cultivar essencialmente derivada vem predominantemente da cultivar inicial ou de outra cultivar essencialmente derivada, sem perder a expressão das características essenciais que resultam do genótipo ou da combinação dos genótipos da cultivar da qual derivou.

A exceção é no que diz respeito às diferenças resultantes da derivação, sendo também claramente distinta da cultivar da qual derivou, por margem mínima de descritores, de acordo com critérios estabelecidos pelo órgão competente.

Espécies passíveis de proteção

Atualmente, apenas são aceitos pedidos de proteção para novas cultivares ou para cultivares essencialmente derivadas de espécies vegetais que tenham seus respectivos descritores mínimos (características da variedade) divulgados pelo Serviço Nacional de Proteção de Cultivares – SNPC.

Até o momento, as espécies passíveis de proteção são abacaxi, abóbora, algodão, alface, amarílis, antúrio, aster, arroz, aveia, bananeira, batata, brachiaria brizantha, brachiaria humidícola, begônia elatior, bromélia, café, calancoe, cana-de-açúcar, capim colonião, capim elefante, cebola, cenoura, cevada, cimbídio, cravo, crisântemo, estatice, eucalipto, feijão, gérbera, grama esmeralda, grama Santo Agostinho, guandu, hibisco, hipério, lírio, macieira frutífera, macieira porta enxerto, macrotyloma, mangueira, milheto, milho, morango, pereira européia frutífera, pereira porta enxerto, quiabo, rosa, solidago, soja, sorgo, trigo, triticale, videira e violeta.

A Lei de Proteção de Cultivares e a Lei de Propriedade Industrial, no tocante a patentes, são mecanismos nitidamente distintos de proteção à Propriedade Intelectual. Desta forma, o melhorista pode ter o resultado de sua pesquisa protegido através de uma patente de processo de obtenção da variedade vegetal; e/ou requerer ainda a proteção da própria variedade através da Lei de Proteção de Cultivares. Portanto, Proteção de Cultivares não é uma patente de novas variedades vegetais.

Revista Consultor Jurídico, 8 de Setembro de 2004

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