Lei de improbidade precisa se adequar às novas necessidades

Autor: Thaís Boia Marçal (*)

 

Momentos de grandes crises políticas, institucionais e econômicas podem ser traduzidos como oportunidades para se realizar rupturas de modelagens que não mostravam mais adequadas.

A análise da eficiência das opções legislativas muito se encaixa nesta logística. Com a Lei 8.429/201992 não foi diferente. Há 25 anos, mais precisamente em 2 de junho de 1992, era necessária que a resposta estatal a respeito de atos que violassem a probidade administrativa fosse pautada pela: (i) abertura semântica de conceitos; (ii) impossibilidade de acordos; (iii) lógica punitiva. Explica-se.

O Brasil vivenciava os seus primórdios democráticos após anos de ditadura militar instaurada. Era necessário que a resposta estatal para atos que contrariassem a legislação elaborada pelos representantes legitimamente pelo povo fosse respeitada. Daí justifica-se a tônica de impossibilidade de acordos em ações de improbidade administrativa. A postura da Administração Pública era refratária. Não se tinha como princípio a lógica consensual e dialógica.

Até mesmo atualmente, em um cenário de crise ética, acordos, equivocamente, são sinônimos de formas de ludibriar o interesse público em prol de interesses escusos. Contudo, é preciso partir de novo pressuposto, qual seja: a administração eficiente é consensual e dialógica.

A lógica adversarial, superada pelo CPC/2015, precisa ser superada na relação administração-administrado. É preciso que se norteie as escolhas administrativas a partir de interação ética e transparente entre atores públicos e privados. Técnicas de solução consensual de conflitos mostram-se muito mais restaurativas do que punições decorrentes de condenações judiciais, uma vez que, diversas vezes há frustração na execução dos valores a título de reparação ao erário e eventuais multa pecuniárias.

Não fosse o suficiente, diante de toda a alteração legislativa posterior a edição 8.429/1992, com destaque para a Lei Anticorrupção (Lei 12.846/2013), observa-se que a opção legislativa alterou-se para permitir que sejam celebrados acordos até mesmo no âmbito penal, permitiu-se que fossem celebradas transações.

Com isso, não soa sistemático ao ordenamento jurídico, que pessoas possam transacionar em matéria penal (última ratio do Direito). Enquanto que na esfera administrativa sancionadora, não seja possível atuação cooperada.

No tocante à tipicidade aberta em matéria de improbidade administrativa, nota-se que por uma interpretação histórica, era justificada sua existência. Contudo, no atual estado de coisas em matéria constitucional, com grande desenvolvimento em matéria de tutela dos direitos fundamentais, não se pode conceber que em prol da dinâmica das relações sociais, seja possível prever abstratamente condutas hábeis a violar a probidade administrativa. Em respeito às garantias constitucionais, em especial da segurança jurídica, é preciso que se tenha uma alteração legislativa, a fim de tornar os atos de improbidade previstos exaustivamente em preceitos legais. Com isso, garante-se a segurança jurídica daqueles administradores que precisam trazer inovações positivas para a gestão da coisa pública, limitando-se a margem de interpretação dos atos que seriam de fato lesivos ao erário como atos de improbidade administrativa.

Por fim, urge destacar que não adianta primar a atuação do Estado em lógica puramente repressiva. É indispensável primar pela subsidiariedade da sanção, seja penal, civil ou administrativa. É preciso que sejam empreendidos mecanismos que permitam a atuação preventiva por parte do Estado. Em matéria de improbidade administrativa, é preciso reforçar a atuação dos Tribunais de Contas no controle prévio, bem como incentivar a implementação de programas de integridade nas instituições públicas e privadas, de modo a mudarmos o enfoque da “improbidade administrativa” para a questão da “probidade administrativa”…

 

 

 

 

Autor: Thaís Boia Marçal é advogada e mestranda em Direito da Cidade pela UERJ. Especialista em Direito Público pela UCAM. Pós-graduada em Direito pela EMERJ.


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