Autor: Douglas Belanda (*)
A sociedade demonstra indignação e repúdio quanto atos ilegais cometidos por políticos e detentores de poder, em sentido geral. Fato é que, com o advento da tecnologia e mídias sociais, os acontecimentos tomam grandes proporções (fato excelente), trazendo discussões sadias e maior publicidade de fatos perante as sociedades e formadores de opinião.
Importante salientar que tal vertente da tecnologia somente auxiliará nossa sociedade ao longo do tempo, fato incontroverso. A informação e o direito devem estar presentes no seio social, para que assim possamos nos desenvolver como sociedade e país. Sem dúvidas, estamos no caminho correto ao acompanhar de perto a evolução em todos os diferentes segmentos da vida.
Fico feliz quando observo nos mais diversos lugares ótimos cidadãos citando o nome de juízes, desembargadores e ministros, bem como, demonstrando certo conhecimento quanto ao modo de votar de um ente do legislativo e daí por diante.
Por tal abordagem, em 2011 tivemos a aprovação de um excelente texto de lei (em vigência), afeto a cadastro positivo de consumidor (seja Pessoa Física ou Jurídica), através do advento da Lei 12.414, de 09 de junho de 2011. Ao abalizar tal texto junto ao direito, notamos diversos aspectos positivos em que pese parte da sociedade não concordar, ensejando até mesmo ação judicial (sem possibilidade de dano moral, via Supremo Tribunal Federal e conforme trataremos no artigo).
Mas, o que significa tal lei perante os consumidores e o direito brasileiro? Abordaremos nos detalhes e, ainda, a sua legalidade no direito processual civil vigente.
Todos que laboram no ramo empresarial tem plena noção sobre o custo da inadimplência no país e nas relações comerciais ou preço final de um produto e serviço. Por óbvio que imprevistos acontecem na vida de qualquer ente (seja pessoa física ou jurídica), entretanto, a precaução e o zelo na economia devem ser regras latentes para todos, justamente para evitar tais problemas.
A máxima de não dar um passo maior que a perna é real e, em tal ponto, o direito e publicidade de atos deve seguir os acontecimentos sociais, justamente para blindar as empresas e cidadãos prudentes e facilitar a vida dos consumidores.
Reforço que, nosso anseio como jurista é fortalecer a economia, a democracia e os conceitos de justiça e preservação dos direitos humanos.
Para legitimar o ato da publicidade dos consumidores com bom padrão de consumo e cumprimento das obrigações (pagar o devido nas aquisições de produtos e serviços), foi sancionada em 2011 Lei 12.414, que dentro de outros aspectos, busca organizar o mercado consumidor no país e proteger as empresas que vendem serviços e produtos, justamente para blindar as respectivas quanto a possíveis inadimplências e, não menos importante, facilitar a tomada de decisões ao conceder créditos ou vender produtos e serviços. Em tal visão, trazemos o disposto no Artigo 1º da referida Lei, que diz:
“… Art. 1º Esta Lei disciplina a formação e consulta a bancos de dados com informações de adimplemento, de pessoas naturais ou de pessoas jurídicas, para formação de histórico de crédito, sem prejuízo do disposto na Lei no 8.078, de 11 de setembro de 1990 – Código de Proteção e Defesa do Consumidor.
Parágrafo único. Os bancos de dados instituídos ou mantidos por pessoas jurídicas de direito público interno serão regidos por legislação específica.
…”
A preocupação latente da sociedade é quanto publicidade de atos negativos (demonstrativo de inadimplência), todavia, esse fato é irreal, dado que a publicidade do cadastro positivo não legitima a exposição de qualquer consumidor inadimplente, mas tão somente concede as empresas e consumidores maior segurança jurídica nas atitudes voltadas a área comercial, explicitando os bons pagadores no ambiente empresarial privado.
Novamente, a sociedade mais do que nunca busca justiça e direitos regulares nas relações sociais em geral e, por tal sentido, o cadastro positivo só soma ao Direito Material e Formal e na busca de uma sociedade melhor e mais interligada aos direitos e deveres. Ora, se sou organizado e tenho por hábito quitar meus compromissos na íntegra, por qual razão me incomodaria com tal cadastro? Não faz muito sentido em simples análise.
Note que, a publicidade de tal cadastro só é permitida com a autorização expressa do consumidor (Lei 12.414), vejamos:
“… Art. 9ª O compartilhamento de informação de adimplemento só é permitido se autorizado expressamente pelo cadastrado, por meio de assinatura em instrumento específico ou em cláusula apartada.
…”.
De acordo com o Código de Defesa do Consumidor (Lei 8.078 de 11.09.1990), especificamente no artigo 43 § 4º, os atos de banco de dados e cadastros de informações são legítimos face interesse global:
“… § 4° Os bancos de dados e cadastros relativos a consumidores, os serviços de proteção ao crédito e congêneres são considerados entidades de caráter público.
…”.
Unindo o texto legal com o Código de Defesa do Consumidor, fechamos o raciocínio quanto a tal validade de existência do cadastro positivo na sociedade brasileira. A regularidade de manutenção dos cadastros positivos é de interesse público, sendo que a legalidade na consulta (mediante contraprestação pecuniária — nos casos de empresas que prestam tais serviços), é factível e correta mediante o trabalho que efetuam com êxito. Em tal sentido:
“…os bancos de dados de consumidores assumem postura de divulgação aleatória e continuada a terceiros, haja vista que a função precípua de seus arquivos é consumada com a prestação da informação a terceiros interessados. Desta forma, o arquivista dispõe seus arquivos a todos aqueles interessados nos dados neles constantes, independentemente do motivo da consulta…”[1]
O simples fato de constar no rol de cadastro positivo não enseja danos morais, justamente pela ausência do dano. O Supremo Tribunal Federal, através do saudoso mestre Teori Zavascki, já se pronunciou sobre a inexistência de danos morais face ocorrência no mundo real de tal cadastro e, ainda, referida legalidade nos autos do ARE 867.326 RG/SC, vide infra a aula emanada:
“… Merece acolhida a alegação de inocorrência de dano “in re ipsa” se não houver prova da negativação do crédito do consumidor consultado, conforme já aludido na primeira parte do voto, no sentido de que “o desrespeito aos limites legais na utilização do sistema credit scoring, configurando abuso no exercício desse direito (art. 187 do CC), …. pode ensejar a ocorrência de danos morais nas hipóteses de utilização de informações excessivas ou sensíveis (art. 3º, § 3º, I e II, da Lei n. 12.414/2011), bem como nos casos de recusa indevida de crédito pelo uso de dados incorretos ou desatualizados.”
No caso, não tendo sido afirmada pelas instâncias ordinárias a comprovação de recusa efetiva do crédito ao consumidor recorrido, não é possível o reconhecimento da ocorrência de dano moral.
Assim, deve-se reconhecer a violação pelo acórdão recorrido, nesse tópico, do disposto no artigo 333, II, do CPC, provendo-se o recurso especial para julgar improcedente a demanda indenizatória, com inversão dos encargos sucumbenciais, ressalvada a concessão na origem do benefício da assistência judiciária gratuita.
Ante o exposto, após não conhecer do agravo regimental e dos embargos declaratórios interpostos no curso do processamento do presente recurso representativo de controvérsia, voto no sentido do parcial provimento do recurso especial para julgar improcedente a demanda indenizatória, com inversão dos encargos sucumbenciais, ressalvada a concessão na origem do benefício da assistência judiciária gratuita. É o voto.
6. Diante do exposto, manifesto-me pela inexistência de repercussão geral da questão suscitada….”.
Face nossa explanação, é assertivo e salutar reforçar que dar enfoque aos consumidores adimplentes não enseja dano moral e, pelo contrário, facilita os trâmites comerciais e atividades da sociedade em geral. Em conjunto, ocasiona a melhora da prestação jurisdicional, ao diminuir o volume de ações com pedidos análogos e descabidas quanto reparação de danos que efetivamente não ocorreram.
Com isso, aumentamos a segurança jurídica e diminuímos o custo da máquina estatal, aumentando exponencialmente o retorno ou decisão dos processos judiciais levados ao crivo do nosso estimado Poder Judiciário.
Reforçando o entendimento que com frequência exponho, cabe aos operadores do direito a consciência de somente demandar o nosso Judiciário quanto a direitos feridos, e não eventual suposição de direitos, fato que presenciamos algumas vezes.
Autor: Douglas Belanda é advogado corporativo em São Paulo. Especialista em Contratos e Operações Bancárias (FGV/SP), Processo Civil (Fadisp), Direito Aeronáutico (UFABC) e Acordos para Representantes de Empresas pela (UnB).