Paulo Sá Elias *
Em reportagem de Toni Marques no jornal “O Globo” (1), destaca-se que os laranjais brasileiros, assim como de outros países produtores serão monitorados por satélites norte-americanos para dar aos seus plantadores e distribuidores informações que países do mercado global não costumam oferecer. A notícia diz que o projeto ainda está em fase de testes. A reportagem faz referência a declaração dos norte-americanos de que o uso do satélite QuickBird destina-se ao mercado global, seja ao Brasil, China ou Israel. As fotografias detectarão o aumento da área plantada, inclusive na Flórida. O Departamento de Agricultura dos EUA tem um serviço que vem usando imagens de satélites desde 1982. É o único do mundo a usar tal tecnologia. São duas mil imagens por ano, de 120 países, de plantações diversas, diz a notícia.
As alterações que estão sendo provocadas na sociedade pelas recentes inovações tecnológicas são imensas e poderão provocar mudanças radicais nunca imaginadas em diversos campos do Direito. Um exemplo interessante é o sensoriamento remoto, a monitoração via satélite. Atualmente é possível conhecer muito a respeito de um lugar (incluindo até mesmo algumas informações sobre o subsolo) em razão das tecnologias disponíveis nesta área e em desenvolvimento. Sobre esse interessantíssimo tema, sugiro uma visita aos seguintes endereços na Internet:
a) http://www.spaceimaging.com/index_text.htm
b) http://fisher.lib.virginia.edu/class/lar514/lar514_eresources.html
c) http://earth.jsc.nasa.gov/
d) http://www.noaa.gov/
e) http://www.cdbrasil.cnpm.embrapa.br/
f) http://www.ball.com/aerospace/quickbird.html
g) http://www.fourmilab.ch/earthview
h) Interessante mencionar nesta lista, o projeto “ARARA” do Instituto de Ciências Matemáticas e de Computação (ICMC) da Universidade de São Paulo (Campus: São Carlos/SP). Sob a orientação do Prof. Onofre Trindade Júnior, a equipe da USP está desenvolvendo pequenas aeronaves não tripuladas, denominadas “aeronaves de reconhecimento assistidas por rádio e autônomas”, cujo objetivo é a substituição de aviões convencionais (tripulados) na obtenção de imagens aéreas, por modelos de escala reduzida, diminuindo com isso o custo de monitoramento de áreas agrícolas e sob controle ecológico. Eis uma aplicação interessante da tecnologia em referência. Importante ressaltar que o sistema do controle à distância é tema da dissertação de mestrado de Luciano de Oliveira Neris.
Há intensa discussão doutrinária sobre o sensoriamento remoto. O professor José Monserrat Filho (que estuda profundamente o assunto no Brasil) lembra (referenciando workshop realizado nos Estados Unidos) que a crescente expansão em áreas como as dos serviços comerciais de sensoriamento remoto, a complexidade das atividades comerciais, os efeitos sobre a cooperação internacional e científica, e a aplicação industrial dos serviços precisam ser considerados num processo de regulamentação apropriada. Destaca ainda que “é de suma importância a constatação de que estão surgindo restrições nacionais ao acesso aos dados de sensoriamento remoto. Este é um dos argumentos mais fortes em favor da criação de um tratado ou convenção sobre a matéria, que estabeleça, entre outros, os princípios e normas fundamentais de um sistema internacional seguro, permanente e amplamente reconhecido de acesso aos dados de sensoriamento remoto, a fim de impedir toda e qualquer limitação unilateral e arbitrária adotada pelos países que controlam as tecnologias e as principais redes do setor. (…) Vale citar o que relata Wulf von Kries (Towards a new remote sensing order?, Space Policy 16 (2000, pp. 163-166.): “O objetivo permanente da política dos EUA de sensoriamento remoto, desde o Landsat Act, de 1984, tem sido atingir um equilíbrio entre os imperativos da segurança nacional e os interesses comerciais domésticos. As restrições relativas à segurança foram sendo progressivamente reduzidas para permitir o envolvimento mais desenvolto do setor privado no sensoriamento remoto. No principal, as várias instâncias políticas do governo norte-americano têm sido reativas, e não proativas, buscando manter a competitividade comercial dos EUA no mercado emergente de sensoriamento remoto. Este enfoque introduziu mudança significativa no que diz respeito ao princípio do acesso sem discriminação aos dados, a pedra de toque da política espacial dos EUA. Enquanto o Landsat Act sustentava a exigência de distribuição de dados sem discriminação, entendendo que as empresas privadas de sensoriamento remoto não poderiam transformar os dados em propriedade, o Ato de 1992 sobre a política de sensoriamento remoto estabeleceu distinção entre os sistemas financiados por recursos públicos e privados, obrigando os operadores a tornar disponível (apenas) os dados primários aos governos dos países sensoriados e não mais a todos os usuários em potencial, nos mesmos termos.” Essa prática dos EUA simplesmente passou ao largo do princípio que reza que o Estado sensoriado deverá ter acesso aos dados primários e processados relativos ao território sob sua jurisdição, assim que forem produzidos, em base não discriminatória e a um custo razoável. O Estado sensoriado deverá ter acesso, também, em base não discriminatória e nas mesmas condições e termos, à informação analisada relativa ao território sub sua jurisdição, disponível nos domínios de qualquer outro Estado participante das atividades de sensoriamento remoto, levando-se em especial consideração as necessidades e interesses dos países em desenvolvimento.”
O sensoriamento remoto é tema de grande interesse para os operadores do Direito. Em capítulo de um livro (no prelo) que participamos na UNESP, lembramos do assunto. Falando sobre privacidade, bem como espionagem industrial, entra em cena (em razão de determinadas utilizações) o sensoriamento remoto, o entrelaçamento das informações de banco de dados, o intercâmbio entre sistemas armazenadores de perfis, dados estratégicos, financeiros, médicos, científicos, jurídicos, de crédito, pessoais, enfim, uma série de informações que poderão ser reunidas em só lugar oferecendo a possibilidade de se conhecer profundamente a respeito de alguém, de algum lugar, de determinado negócio, etc.
Nota de rodapé:
(1) http://oglobo.globo.com/oglobo/Economia/43460149.htm
Revista Consultor Jurídico.
Paulo Sá Elias é professor universitário de Direito, advogado, mestrando em Direito pelo programa de pós-graduação da UNESP (Franca/SP) e membro da Sociedade Brasileira de Direito Aeroespacial. Endereço pessoal: http://www.direitodainformatica.com.br