Morosidade da Justiça é combatida sem se atacar raízes do problema.

Concebiam os romanos como sagradas e merecedoras de grande respeito às instituições que venciam as contingências do tempo e as exigências mutáveis do cotidiano. Aproximando-se dos dois séculos de vida consagrada ao Direito, a Justiça brasileira constitui um patrimônio que poucas instituições, sobretudo em país jovem e de conturbada vida política, podem ostentar com a mesma continuada eficiência e galhardia.

Portanto, em sua já longa caminhada pela senda do Direito, procura a Justiça brasileira assegurar o prestígio da lei, conferindo-lhe a mais alta penetração na inteligência da realidade social. Na análise mais profunda do comportamento humano, procura fixar as suas diretrizes dentro de uma sensibilidade jurídica que realça em todos os problemas judiciários a mais segura equanimidade.

Proclamada a República, em 1891, elevou-se o Judiciário à altura do poder político do Estado, outorgando-lhe a função do controle constitucional dos demais Poderes. Naquilo em que se ferisse a Constituição, ao Judiciário caberia declará-lo, e a ele lhe foi ela, a Constituição, confiada, para que a fizesse respeitar e guardar. Atribuiu-se, assim, ao mais inerme dos Poderes, mas ao mais estável, o controle formal do ordenamento político-jurídico da Nação, preso, naturalmente, ao critério da legalidade.

Compete ao magistrado, como bom missionário do Direito, a necessidade sempre maior de oferecer às suas elevadas funções a sublime inspiração das melhores virtudes humanas, pois só assim poderá realizar a sua vocação não importa com que sacrifícios, mas cumprindo a grandeza do próprio destino da Justiça. A magistratura, é importante acentuar, é a força de um idealismo e não simplesmente uma carreira despida de elevado objetivo.

Na largueza de vistas dos magistrados, ao interpretar as leis, inquirindo-lhes o seu real sentido à luz do contexto social e econômico em que irão vigorar, sabendo descobrir nelas o interesse público que procuram atender, muito dependerá o êxito de um programa de governo. Não há plano de governo que se possa cumprir satisfatoriamente sem a edição de leis e decretos novos, que criem as condições necessárias à sua execução. A conveniente e justa aplicação dessas leis será o fator ponderável para que o plano possa ser levado adiante. Ademais, na sabedoria dos julgados e na presteza de sua prolação reside um elemento decisivo da paz social.

É claro que qualquer medida de organização judiciária não eliminará, por completo, os defeitos que ora tornam tarda a aplicação da justiça, pois o problema reside, antes de tudo, na reformulação das leis processuais, com a simplificação do processo, nos casos de menor gravidade, bem como a possibilidade de mais flexível aplicação da lei federal às diversíssimas peculiaridades de cada Estado da Federação como lucidamente percebeu o Presidente da Suprema Corte de New Jersey, Arthur Vanderbilt, autor da obra clássica “The Challenge of Law Reform”.

O Judiciário, ao longo do tempo, tem contornado a inércia dos outros. Clamam pela rápida distribuição da Justiça, mas privam-no dos meios materiais para realizá-la. A morosidade da Justiça, diagnosticada como a maior “doença” do Judiciário, tem sido combatida, apenas, com aumentos periódicos e quantitativos de juízes e tribunais, sem que sejam atacadas as raízes do problema.

Afastado das preocupações econômicas que dominam as sociedades em geral e esquecido das preocupações administrativas dos governantes, a não ser em reformas e reestruturações parciais, não causa espanto não acompanhe o Poder Judiciário o mesmo desempenho dos demais poderes em seus êxitos e aperfeiçoamentos.

Se pretendemos um Judiciário altivo, independente, ágil e moderno, devemos assumir a responsabilidade de dar-lhe os meios para a realização da melhor Justiça, lembrando a advertência de Ruy Barbosa de que o eixo da democracia é a Justiça, eixo não abstrato, não fictício, não meramente formal, mas de uma realidade profunda que, falseando ele ao seu mister, todo o sistema cairá em paralisia, desordem e subversão.

Carlos Eduardo Thompson Flores Lenz é juiz federal do TRF da 4ª Região

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