Mudanças no CPC – Fique atento

Marco Aurélio Romeu Fernandes

Dando prosseguimento à política de implementação de mudanças parciais e sistemáticas no Código de Processo Civil, implementadas basicamente a partir dos anos de 1994 e 1995, mediante a edição de uma série de leis e conhecida como a “Reforma do CPC”, em dezembro passado duas novas leis foram promulgadas e que determinam o início de uma nova “reforma” do CPC ou, como preferem alguns, visam complementar aquela outrora iniciada. Tais mudanças passaram a vigorar a partir do final do mês de março passado, em face da vacatio legis de 3 (três) meses que fora fixada.

Buscamos neste momento, portanto, ressaltar aquelas que, segundo nossa opinião, caracterizam-se por sua maior relevância e provocam mudanças de postura do advogado.
Neste sentido, a Lei 10.352 de 26 de dezembro de 2001 determinou alterações nos artigos 475, 498, 515, 520, 523, 526, 527, 530, 531, 533, 534, 542, 544, 547 e 555, enquanto que a Lei 10.358, de 27 de dezembro do mesmo ano, provocou alterações nos artigos 14, 253, 407, 433, 575 e 584, criando, ainda, os artigos 431 A e 431 B, bem como revogou o inciso III do artigo 575. Tendo em vista que não temos, neste espaço, condições de esgotarmos o tema, passamos a identificar as principais situações:

– PRAZO PARA INTERPOSIÇÃO DE RECURSOS

– Art. 498 – Quando o dispositivo do acórdão contiver julgamento por maioria de votos e julgamento unânime, e forem interpostos embargos infringentes, o prazo para recurso extraordinário ou recurso especial, relativamente ao julgamento unânime, ficará sobrestado até a intimação da decisão dos embargos. Parágrafo único. Quando não forem interpostos embargos infringentes, o prazo relativo à parte unânime da decisão terá como dia de início aquele em que transitar em julgado a decisão por maioria de votos.

O novo conteúdo do artigo 498 determinou uma unificação no prazo para a interposição dos recursos extraordinário e especial contra acórdão unânime e acórdão não unânime, o qual é atacável por embargos infringentes. Considerando que, na prática, nada se decidia acerca do recurso especial ou extraordinário interposto contra a parte unânime do acórdão, enquanto pendesse o julgamento dos embargos oferecidos contra a parte não unânime, optou o legislador por permitir a apresentação de um único recurso especial ou extraordinário, ao final, sendo iniciada a contagem do prazo para tais recursos apenas quando da publicação do acórdão que julgar os embargos infringentes. No caso de não ser interposto, o prazo tem por termo inicial o dia em que transitar em julgado a parcela embargável (parágrafo único do art. 498).

– DO RECURSO DE AGRAVO

– Art. 523 …

§ 2º Interposto o agravo, e ouvido o agravado no prazo de 10 (dez) dias, o juiz poderá reformar sua decisão.

– Art. 526 ….

Parágrafo único. O não cumprimento do disposto neste artigo, desde que argüido e provado pelo agravado, importa inadmissibilidade do agravo.

– Art. 527 Recebido o agravo de instrumento no tribunal, e distribuído in continenti, o relator:

[…]

II – poderá converter o agravo de instrumento em agravo retido, salvo quando se tratar de provisão jurisdicional de urgência ou houver perigo de lesão grave e de difícil reparação, remetendo os respectivos autos ao juízo da causa, onde serão apensados aos principais, cabendo agravo dessa decisão ao órgão colegiado competente;

III – poderá atribuir efeito suspensivo ao recurso (art. 558), ou deferir, em antecipação de tutela, total ou parcialmente, a pretensão recursal, comunicando ao juiz sua decisão;

[…]

v – […] nas comarcas sede de tribunal e naquelas cujo expediente forense for divulgado no diário oficial, a intimação far-se-á mediante a publicação no órgão oficial;

No que refere ao recurso de agravo, as mudanças havidas foram diversas. De início, ao alterar a redação do parágrafo segundo do art. 523 (agravo retido), deixou claro o novo texto que o prazo outrora fixado o era para fins de efetivação do contraditório pela parte contrária, antes de eventual retratação. Da mesma forma, reiterou a aplicação do princípio da igualdade ao destinar, à parte agravada, o mesmo prazo de 10 (dez) dias para a apresentação das contra-razões de recurso. Duas outras relevantes alterações ainda foram trazidas em sede do recurso de agravo. A nova redação do parágrafo único do art. 526, relativo à comunicação da interposição do agravo, sob a forma de instrumento, perante o juízo a quo, vem dar solução à controvérsia surgida na doutrina e jurisprudência acerca da conseqüência do não atendimento ao prescrito no dispositivo.Notadamente, o desrespeito à regra que determina a juntada, no juízo recorrido, no prazo de 3 (três) dias, de cópia da petição de agravo, sem, contudo, fixar uma eventual sanção para seu desatendimento, provocou diversos entendimentos. Desde a posição mais branda, que manifestara nada decorrer da inércia, até a mais severa, que entendia estar o recurso, com tal omissão, desprovido de requisito de admissibilidade para seu conhecimento pelo tribunal. Passando, por evidente, por uma postura intermediária, que advogava a idéia de que a ausência da juntada de referida cópia no juízo de origem impediria, apenas, a prática de eventual retratação. Agora, o novo dispositivo adota a posição de que tal encargo é condição de admissibilidade do remédio recursal. Vem, ademais, apenas corroborar um dos objetivos de tal ato que é a de possibilitar ao agravado uma maior facilidade de acesso aos termos do recurso interposto a fim de viabilizar sua integral defesa. É evidente que não deixarão de surgir críticas a tal dispositivo em face da vinculação que fez à conduta da parte contrária como condição para considerar tal obrigação como um requisito de admissibilidade. Ao afirmar que a inadmissibilidade do agravo está condicionada à argüição e prova pelo agravado, o texto abre a possibilidade de eventuais questionamentos acerca de sua própria constitucionalidade. Melhor teria andado se, em definitivo, fixasse como regra tal obrigação com a conseqüência diretamente determinada. Outra inovação trazida no recurso de agravo foi a de permitir ao relator que converta o agravo interposto sob a forma de instrumento em agravo retido, desde que ausente a situação de urgência e risco de dano. Igualmente foi explicitada a possibilidade, que a jurisprudência já reconhecia, de o relator antecipar, total ou parcialmente, a própria pretensão trazida no recurso. Além de poder conceder efeito suspensivo ao agravo (art. 558) poderá o relator conceder-lhe, agora expressamente autorizado, o chamado “efeito ativo”. Por fim, ampliou a possibilidade de intimação do agravado por intermédio de publicação em diário oficial não só naqueles feitos que tramitam nas comarcas sede de tribunais, como também em todas aquelas cujo expediente forense seja objeto de publicação via diário oficial. Como, por exemplo, ocorre no caso de nossa comarca.

– DO RECURSO DE EMBARGOS INFRINGENTES

Ocorreram mudanças em diversos artigos referentes ao recurso de embargos infringentes. Destaca-se, porém, a volta ao sistema adotado pelo anterior CPC de 39, ao fixar que tal recurso poderá ser interposto apenas quando o acórdão não-unânime houver reformado a sentença. A justificativa, por óbvio, é que no caso de manutenção da sentença recorrida, haverá dois provimentos jurisdicionais no mesmo sentido e, portanto, não seria conveniente ofertar ao vencido novo recurso ordinário[1]. Na mesma ordem, quando interposto contra acórdão que julgou ação rescisória, faculta-lhe apenas na hipótese de procedência da mesma. Restringiu-se, também, a natureza da matéria embargável, fixando tal possibilidade apenas à matéria de mérito.

– DO AGRAVO DE INSTRUMENTO CONTRA DECISÃO QUE NEGA SEGUIMENTO AO RECURSO ESPECIAL OU EXTRAORDINÁRIO

– Art. 544 …

§ 1º O agravo de instrumento será instruído com as peças apresentadas pelas partes, devendo constar obrigatoriamente, sob pena de não conhecimento, cópias do acórdão recorrido, da certidão da respectiva intimação, da petição de interposição do recurso denegado, das contra-razões, da decisão agravada, da certidão da respectiva intimação e das procurações outorgadas aos advogados do agravante e do agravado. As cópias das peças do processo poderão ser declaradas autênticas pelo próprio advogado, sob sua responsabilidade pessoal.

§ 2º A petição de agravo será dirigida à presidência do tribunal de origem, não dependendo de pagamento de custas e despesas postais. O agravado será intimado, de imediato, para no prazo de 10 (dez) dias oferecer resposta, podendo instruí-la com cópias das peças que entender conveniente. Em seguida, subirá o agravo ao tribunal superior, onde será processado na forma regimental. […]

Duas grandes novidades. Dispensa o recolhimento de custas e despesas postais bem como autoriza que o próprio advogado, sob sua responsabilidade (civil, criminal e perante os órgãos disciplinares da própria OAB), dê como autênticas as cópias que fizer incluir em seu recurso de agravo.

– PROTOCOLO DESCENTRALIZADO

– Art. 547. […]

Parágrafo único. Os serviços de protocolo poderão, a critério do tribunal, ser descentralizados, mediante delegação a ofícios de justiça de primeiro grau.

Regula em definitivo a possibilidade da descentralização do protocolo de petições segundo a vontade dos tribunais. Sistemática, por sinal, já utilizada pelo próprio Tribunal Regional Federal da 4ª Região há algum tempo. O Tribunal de Justiça de nosso estado, por sua vez, implementou tal possibilidade, recentemente, mediante convênio com a Empresa Brasileira de Correios e Telégrafos, disponibilizando que a quase totalidade das petições possam ser protocoladas nas diversas agências dos correios mediante sistema próprio.

– PRAZO PARA JUNTADA DE ROL DE TESTEMUNHAS

– Art. 407. Incumbe às partes, no prazo que o juiz fixará ao designar a data da audiência, depositar em cartório o rol de testemunhas, precisando-lhes o nome, profissão, residência e o local de trabalho; omitindo-se o juiz, o rol será apresentado até (10) dias antes da audiência.

Outra importante alteração. A nova redação do artigo 407 concedeu ao juiz da causa a possibilidade de fixar o prazo para que as partes arrolem suas testemunhas e, no caso de não designação, tal prazo será de 10 (dez) dias antes da audiência. Visa tal dispositivo superar a constatação óbvia de que o prazo outrora fixado (de cinco dias) não era suficiente para a prática dos atos necessários para intimação de testemunhas, determinando com isso freqüentes adiamentos de audiências.

– REFORÇO DA ÉTICA NO PROCESSO

– Art. 14. São deveres das partes e de todos aqueles que de qualquer forma participam do processo:

[…]

V – cumprir com exatidão os provimentos mandamentais e não criar embaraços à efetivação de provimentos judiciais, de natureza antecipatória ou final.

Parágrafo único. Ressalvados os advogados que se sujeitam exclusivamente aos estatutos da OAB, a violação do disposto no inciso V deste artigo constitui ato atentatório ao exercício da jurisdição, podendo o juiz, sem prejuízo das sanções criminais, civis e processuais cabíveis, aplicar ao responsável multa em montante a ser fixado de acordo com a gravidade da conduta e não superior a vinte por cento do valor da causa; não sendo paga no prazo estabelecido, contado do trânsito em julgado da decisão final da causa, a multa será inscrita sempre como dívida ativa da União ou do Estado.

A inserção do inciso V e do respectivo parágrafo único ao art. 14, reitera a busca dos deveres de lealdade e probidade que devem servir de parâmetro e regular toda a atividade processual. Visa impelir que as partes e terceiros adotem conduta adequada ao cumprimento das ordens judiciais como elementos de exercício da efetiva jurisdição e consolidação da paz e segurança jurídica.

– NOVA HIPÓTESE DE DISTRIBUIÇÃO POR DEPENDÊNCIA

– Art. 253. Distribuir-se-ão por dependência as causas de qualquer natureza:

I – quando se relacionarem, por conexão ou continência, com outra já ajuizada;

II – quando, tendo havido desistência, o pedido for reiterado, mesmo que em litisconsórcio com outros autores.

[…]

Sem dúvida, a inserção da nova possibilidade, inscrita no inciso II, nada mais é do que uma continuação da busca pela lealdade e ética processual. Tem por escopo evitar a “chicane”, muitas vezes utilizada, da busca de uma distribuição conduzida. Com a inserção da hipótese referente a ações repetidas que versem idêntica questão de direito, “busca o dispositivo evitar a ofensa ao princípio do juiz natural, atualmente facilitadas nos foros das grandes cidades: o advogado, ao invés de propor a causa sob litisconsórcio ativo, prepara uma série de ações similares e as propõe simultaneamente, obtendo distribuição para diversas varas. A seguir, desiste das ações que tramitam nos juízos onde não obteve liminar, e para os autores dessas demandas postula litisconsórcio sucessivo, ou assistência litisconsorcial, no juízo onde a liminar haja sido deferida”[2].

Vale salientar, por fim, que diversos outros Projetos de Lei tramitam no Congresso Nacional visando alterar dispositivos do CPC. Seguindo a postura de efetuar pequenas e gradativas mudanças, o legislador compreende que se torna mais simples e facilitada a tarefa de aperfeiçoamento do diploma processual, ao contrário de uma reforma completa e integral, com a edição de um novo código que, certamente, enfrentaria fortes resistências. Como ocorreu, por sinal, com o novo Código Civil, que tramitou pelos corredores do Congresso por mais de 20 anos.

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[1] Exposição de motivos do Projeto de Lei 3.474/2000.

[2] Exposição de motivos Projeto de Lei 3.475/2000.

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