Durante a faculdade, depois de um lauto almoço no bandejão, ficamos conversando em vários amigos. Falávamos da magistratura, de carreiras jurídicas. Listamos algumas coisas que, pelo nosso conhecimento, todos nós sem pais advogados ou com familiares no meio, poderiam impedir a entrada de alguém na magistratura. Fomos falando e contando. Chegamos a uns dez impedimentos e a uma conclusão: a magistratura não queria e não gostava de ninguém. Tinha preconceito contra todos.
Hoje, já contando mais de dez anos de formado, mais de dez anos como juiz, vejo que a Magistratura não é tão preconceituosa. Não pode e não deve ser. É claro que um observador de fora pode listar restrições e preconceitos. Eu poderei rebater com casos concretos. A polêmica poderia nunca ter fim. O meu concurso, no entanto, registrou quase que um empate entre os sexos. Cinco delegados de polícia foram aprovados. Várias pessoas que tentavam há vários concursos também. Atrevo-me a dizer que selecionaram uma boa turma.
A pergunta a respeito do “juiz ideal” emerge da leitura de comentários a textos e sentenças publicados no sítio Consultor Jurídico. Os leitores trazem algumas visões curiosas a respeito do que deve ser o juiz. O que ele deve dizer e, principalmente, o que ele não deve dizer. Tais interpretações são baseadas no trabalho publicado, ou seja, sentenças, principalmente. Não levam em consideração a pessoa física, que prolata sentenças, despachos, decisões de mero expediente, atende advogados, preside audiências, colhe provas, informa agravos e mandados de segurança. Não avaliam o juiz que vai e volta dirigindo seu carro ou que leciona. Não perguntam quantos filhos tem ou onde mora. Pode parecer exigir demais, mas quase sempre sabemos isso dos políticos, dos ministros do Executivo, dos deputados, senadores e governadores.
Alguns consideram que os juízes chegam muito novos e, assim, inexperientes. Discordo dessa visão e sei que isso rende um debate quase que interminável. Já cheguei a dizer que o juiz ideal seria alguém com mais de trinta anos, casado, com filhos, com boa formação jurídica e cultural (para não dizer erudito), que tenha viajado bastante pelo mundo e tenha boa situação financeira, de preferência com casa própria e tudo o mais. Isso é uma provocação. Não existe ninguém com esse perfil disposto a começar uma carreira no Interior, sem vitaliciedade e ganhando o salário atual. Seria interessante, como mera experiência, ver um concurso exigindo idade mínima de trinta anos. Na vida prática, no entanto, sabemos que não podemos fazer experiências com coisa séria, principalmente a pública.
Analisando a forma de seleção atual, com uma prova teste, uma escrita e uma oral, antecedida de exames psicotécnicos, creio que é possível selecionar bem. A prova teste é necessária, considerando o grande número de candidatos e a exigência de uma correção ágil. É cruel, no entanto. O candidato tem que conhecer e saber com precisão o Direito. Deve ter uma boa confiança em seus conhecimentos. A prova escrita com questões curtas, tal como era quando fui selecionado, parece-me bem mais justa para o candidato. Esses tempos não voltam, no entanto.
Fica ainda em aberto a questão relativa ao “juiz ideal”. Não foi respondida. É possível que, partindo do ponto de vista dos leitores do sítio Consultor Jurídico, cheguemos à mesma conclusão que eu e meus amigos tivemos ao final do almoço mencionado acima: teríamos tantas restrições que seria impossível encontrar alguém com todos os requisitos desejados ou sem os impedimentos que seriam colocados.
José Tadeu Picolo Zanoni é juiz de Direito Auxiliar em São Paulo