Nepotismo no Brasil – Não é possível vencer um problema cultural com leis

por Roberto Wanderley Nogueira

A propósito do tema “Nepotismo” a ser vedado em boa hora no serviço público brasileiro por meio de Emenda Constitucional (PEC 334/96), observa-se, nada obstante, que essa questão tem gerado embates ideológicos muito incisivos que não se confundem com a moldura ética que deveriam revelar e, bem por isso, acabam camuflando emulações de todo tipo, inclusive pessoais, que nada têm de republicanas.

Depois de mais de 500 anos de existência formal do Brasil chega-se à invariável conclusão de que não é possível vencer um problema de ordem cultural por meio de leis e decretos.

No plano do Judiciário da União, aliás, a vedação data de 1996 (Artigo 10, Lei 9.421/96) e, nada obstante, muitos parentes continuam em cargos comissionados sob o argumento de “direito adquirido”, gerando-se daí uma grave distorção no serviço público judiciário entre Juízes prestigiados e outros não. No Supremo, há uma vedação solene à prática do “Nepotismo” a partir de seu Regimento Interno. Resta avaliar se parentes dos Ministros do Supremo atuam em cargos comissionados em outros órgãos do próprio Poder Judiciário ou até mesmo noutros órgãos dos demais Poderes da República, pelo que a vedação solene não estará formalmente violada, mas sim o espírito que ensejara a inscrição da norma regimental vedatória ao “Nepotismo”.

Convém, portanto, definir o conceito de “Nepotismo” e o seu alcance institucional sem risco de violação a direitos fundamentais da própria cidadania, a exemplo da criação de uma categoria inferior de cidadãos baseada, preconcebidamente, na simples relação parental e até mesmo conjugal dos personagens envolvidos nesses quadros.

Pense-se também e, sobretudo, que especiais indicações de parentes podem ser obtidas em órgãos públicos diversos do Poder de onde promana a autoridade. O “troca-troca” pode ser, pois, inter-institucional e, nesse caso, já não se teria como cogitar da hipótese nepótica. Seria um desvario de moralidade duvidosa, ante o preconceito que revela, fazer a norma alcançar tais hipóteses abertas pela sua própria natureza.

Enfim, o problema da troca de cargos e funções comissionados entre parentes de autoridades envolvidas nessa relação sempre acontecerá e não há lei ou norma constitucional que possa impedir essa prática, na realidade, como acima mencionado.

A melhor solução é, portanto, uma vez estabelecido o preceito proibitivo em exame nos termos da Constituição, regulamentar uma parcimoniosa liberação para que a prática nepótica, quando julgada necessária (motivo de confiança, competência e indisponibilidade demonstradas), seja possível dentro de limites rígidos, excepcionalíssimos e, pois, socialmente aceitáveis.

Do ponto de vista antropológico, a tragédia moral que acerca o tema “Nepotismo” no serviço público brasileiro é, sem dúvida, o seu abuso. Abuso que, aliás, não sucede em países melhor desenvolvidos social e politicamente em que tampouco se conhece uma proibição constitucional desse tipo. A proibição é em si mesma um prosaísmo que reflete o estágio de nosso desenvolvimento social em que soluções éticas fincadas no sentimento jurídico da cidadania carecem de expressão normativa especial para ser posta em prática e tornada eficaz, ante o propósito de se evitar justamente os abusos como resultado dos desvios de conduta funcional.

Tudo é uma questão de bom senso e bom senso não se estabelece por meio de norma jurídica ou comando constitucional.

Desse modo, deve-se desconfiar assim do silêncio quanto ao enfrentamento do problema do “Nepotismo” no serviço público como de seu combate açodado e sem ponderação de parte daqueles que ainda não tiveram a chance de também se locupletar do expediente em comento findo.

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