Normas jurídicas empresariais: Nova teoria da empresa, novas perspectivas

Salambô França da Cunha Fagundes

SUMÁRIO

1. Pressupostos de reconhecimento das normas jurídicas
2. Normas jurídicas gerais e o mundo jurídico empresarial
3. Normas jurídicas empresariais
3.1 Objeto da norma jurídica empresarial
3.2 Finalidade das normas jurídicas empresariais

1. Pressupostos de reconhecimento das normas jurídicas

A norma jurídica, objetivamente analisada, é objeto de reconhecimento e observação da Ciência do Direito, cujo instrumento empírico-interpretativo, próprio da hermenêutica jurídica e espectro da Filosofia do direito, profliga a captação dos resultados da observação científica a partir da subsunção das normas aos fenômenos sociais.

As normas jurídicas, portanto, são proposições descritivas hipotéticas da fenomenologia factual, isto é, são descrições dos atos e fatos mutantes na sociedade. Desta forma, é a sistematização dos acontecimentos sociais no mundo fenomênico. Ademais, a norma jurídica é um elemento constitutivo do Direito.

Para a concepção do racionalismo dogmático ou positivismo racionalista de conceituar o direito e propor uma finalidade, consubstanciada na Teoria Pura do Direito de Hans Kelsen, a norma jurídica é subsumida a um juízo ou proposição hipotética descritiva (aspecto descritivo da norma), a qual sempre prevê um fato que a ela se acopla, auferindo uma consequência (aspecto imperativo da norma).

O que caracteriza uma norma jurídica é o fato de ser uma estrutura proposicional enunciativa de uma forma de organização ou de conduta.

Ainda para a teoria do direito puro, os enunciados normativos são imutáveis e suas conseqüências são previstas, já que a própria hipótese descritiva revela um dado comportamento que sofrerá, em contradita, o imperativo legal.

Destarte, a definição da norma encontra-se posto no ser, designado pela proposição jurídica, e no dever ser, o consequente do amoldamento da norma à realidade factual.

Tal teoria é um tanto estática, porquanto o Direito passa pelos períodos históricos, sofre as pressões da mutabilidade de uma determinada época vivenciada e repousa o mesmo, sem nada sofrer, sob o manto da verdade hipotética da norma, da sua intransponibilidade.

No âmbito cognicitivo, não há criação real mas epistemologia, o que faz o jurista não criar o direito, peculiar ao cientista do direito, consequentemente à hermenêutica jurídica, apenas faz dele um objeto de conhecimento.

Todavia, reportando-se ao Direito Comercial, ou, propriamente dito, às normas jurídicas empresariais, a condição estática do Direito é inconcebível, pois ele faz parte do mundo que está em constante transformação, o que permite que sua Ciência caminhe conforme as mutações de seu objeto de observação: o Mundo das relações humanas sobre o qual se insere o Direito, permitindo coadunar-se aos novos modelos axiológicos da sociedade para poder atingir sua finalidade precípua – a de regular a fenomenologia das relações.

Outrossim, o Direito é a exteriorização volitiva social, ele ora regula as relações, estabelecendo parâmetros para os quais elas devem ser exauridas, ora ele é criado ou renovado/reconstruído pelas novas concepções da sociedade, adequando o que já estava descrito a nova realidade, permitindo para o jurista utilizar-se de uma das correntes doutrinárias que explicam a existência do Direito num determinado período histórico, como preleciona A. L. Machado Neto, na obra Teoria Da Ciência Jurídica:

“Se o jusnaturalista teleológico exprime, no plano jurídico, a configuração hierárquica do mundo medieval e o jusnaturalismo racionalisra foi a expressão do mundo burguês em ascensão; o historicismo jurídico, a cobertura ideológica da contra-evolução no mundo, já o legalismo exegético, a repercussão ideológica da burguesia recém-instalada no poder social e político, e o sociologismo, a ideologia jurídica da burguesia já bem instalada no poder, a canonizar o fato como direito, o relativismo da teoria pura será o pensamento jurídico solidário com o período de transição e decadência da civilização liberal burguesa” .

O que, exemplificativamente, ocorreu na matiz comercial, com o advento da Revolução Industrial, foi a evolução dos institutos sócio-econômicos, como é peculiar ao espectro do Direito sofrer reconstruções, com as respectivas transformações culturais, além das econômicas. Tal adequação encontra-se em procedimento até hoje, cujo objeto é a empresa, por isso, uma nova ótica sobre o Direito comercial, desvinculando-se de seu retórico conteúdo conceptual, quanto ao conceito de comerciante, de atos de mercancia, enfim, adaptando-se tal conjuntura organizacional às novas ordens sócio-econômicas.

2. Normas jurídicas gerais e o mundo jurídico empresarial

A Ciência do Direito está em constante mutações a fim de solucionar hermeneuticamente, os problemas advindos da configuração fria da proposição descritiva legal, já que a mesma está acima do próprio direito positivo.
Logo, para melhor aplicabilidade conceptual do Direito Comercial ou a sua transformação para a nova Teoria da Empresa, há de se utilizar dos progressos da Teoria Geral do Direito, Epistemologia Jurídica e Filosofia do Direito com a finalidade básica de acoplar aos novos conceitos e preceitos dessa recente Teoria, e permitindo, com tais subsídios, o vislumbre das perspectivas circundantes a nova organização empresarial, quiçá, solucionando as problemáticas que sobrevirão.

Outrossim, o jurista-hermeneuta envereda-se ao concebimento da nova visão da realidade factual profligada pela sistemática jurídica, porquanto, utilizando-se da Lógica Jurídica e da Lingüistica do Direito, jungidas a um critério interpretativo e de concepção do Direito para estudar a fenomenologia que lhe descreve e, outrora, por ele reconhecida.

Portanto, o mundo jurídico empresarial proposto pelo autor da obra em análise, reconstruído pela nova Teoria da empresa, caracteriza-se não mais pelos aspectos conceptuais de Direito Comercial, já delineados, mas por aspectos dinamizadores de sua própria estrutura, concernentes à organização empresarial pela presença física do empresário jungido ao predicativo da determinação aos afrontes do risco econômico. O lucro, entretanto, é conseqüência daquela organização e não objetivo precipual de sua atividade mercantil, assim designada anteriormente. Hoje, com a manifestação dessa teoria, o ideal de luta é a sobrevivência empresarial, cuja verificação se dá pelo contexto onde se insere a empresa e como ela se é organiza de forma a dirimir suas deficiências frente às subversões político-econômicas.

3. Normas jurídicas empresariais

A determinação da matéria de comércio tem como pressuposto os fatos e relações sociais, pois, antes mesmo de serem fatos ou relações jurídicas eram fenômenos sociais, porquanto as normas jurídicas empresariais regulam relações sociais a serem juridicizadas, propondo uma construção do sistema jurídico-comercial.

Foi a partir da promulgação do Código Civil italiano em 1942 que se inseriu uma disciplina jurídica da empresa, definindo empresário e estabelecimento, assim, estabelecendo o conteúdo de sua atividade, esta sim organizada.

Assim, com os avanços na cognição empresarial conforme o desenvolver da Ciência Social, inerente ao aspecto teleológico, propôs-se uma noção de empresariedade abrangendo o fenômeno empresarial, consubstanciado numa organização complexa de pessoas constituída por: empresário, estabelecimento e atividade empresarial, e mais, pelo patrimônio empresarial e por um aspecto muito importante, a convergência de interesses, o que designa a própria empresa – unidade de produção congregando empresários e trabalhadores, subsumida a um conjunto orgânico de normas reguladoras, por conseguinte caracterizando-se por uma instituição.

As normas jurídicas empresariais estão voltadas para a criação de um regime jurídico específico: para os empresários, que se apresentam quase por completo com a regulação de direitos, obrigações, proteção e responsabilidades.

É interessante notar que, por derradeiro parcial, do explicitado ficou claro que a norma jurídica, ao mesmo tempo visa regular relações factuais, reconhecendo-as, transmudando-as em relações jurídicas, pela auferição normativa que lhes são atribuídas, é também criado ou é o próprio objeto de transformação das relações sociais, cabendo à Ciência do Direito com o instrumento da hermenêutica e epistemologia em observar, perquirindo, tais fenômenos sócio-econômicos mutantes.

Por conseguinte, o direito empresarial, consubstanciando-se na fenomenologia do Direito, ora a norma jurídica que o constitui reconhece a existência física caracterizada pela organização dos fatores econômicos para a produção e distribuição de bens e serviços, como também a mesma organização adota um regime destinado ao seu empresário, ao patrimônio empresarial e ao exercício dessa atividade, conglomerando os interesses, constituindo um espectro orgânico normativo visando regulá-los, o que é uma criação de Direito.

3.1 Objeto da norma jurídica empresarial

É representado por comportamento, organização e competências, a norma empresarial surge como a norma em lato sensu, cujo conteúdo são as relações decorrentes do exercício da atividade empresarial (pressupostos: profissionalidade, economicidade e a organização), sendo certo que as relações e o exercício da atividade empresarial implicam normas de organização e de competências.

3.2 Finalidade das normas jurídicas empresariais

As normas jurídicas empresariais visam regular a Empresa sob um nova ótica, cuja característica é de suma importância para a sua repercussão no Direito, que é a sua importância social. Substituindo o antigo comerciante e da falha teoria dos atos de comércio, pelo atual de empresário e de atividade.

Os motivos de regulação da nova perspectiva jurídico-comercial estão atrelados a adaptação das normas comerciais preexistentes ao novo momento sócio-econômico, pois, acopla-se mais à realidade; amplia a abrangência da matéria, alcançando outros modos do exercício das atividades, como a de serviços, separando a dicotomia civil ou comercial em várias de suas atividades; propicia maior flexibilidade e operacionalidade na elaboração e interpretação das normas. Conseqüência esta reflexa da modernização das estruturas normativas voltadas para a realidade econômica .

Sobre o conteúdo da matéria comercial analisada em âmbito atual, Luiz Antonio Soares Hentz delineia a respeito da Teoria do direito comercial como direito das empresas:

“A consideração do direito comercial como regulação das empresas baseia-se na idéia do comércio como uma organização. A dificuldade na conceituação reside na falta de um conceito jurídico de empresa. A definição que se dá a empresa decorre do seu conceito econômico, ou seja, uma organização voltada à produção de bens e serviços” .

Por derradeiro, a mensagem deixada pela obra e seu autor deixa-se claro da importância do reconhecimento pela sociedade das mudanças alcançadas por ela mesma, e, porquanto, da coadunação das normas já existentes aos novos fatos hipoteticamente concebidos. Da mesma forma, reportando-se ao espectro empresarial, o Direito Empresarial está estampado aos olhos dos cidadãos, apresenta-se intrínsico à vida do homem-empresário e suas relações, pois, é apenas um representativo social, vislumbra um momento de extrema organização institucional e de intensa influência econômica que auferi novas concepções jurídicas, assentando-se numa nova estrutura axiológica, e, por fim, reflete aquilo que a sociedade atual aclama e é refletido pela própria Ciência do Direito.

SALAMBÔ FRANÇA DA CUNHA FAGUNDES, 24, é advogada em Sertãozinho-SP, especializanda em Direito Tributário pelo Instituto Brasileiro de Estudos Tributários e mestranda em Direito Tributário pela Universidade Estadual Paulista – Unesp/Franca-SP.

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