Nova lei do ITD no Rio de Janeiro afronta proteção ao contribuinte

Autores: Roberto Bekierman e Jean Pontes (*)

 

Em 2016, os contribuintes do Estado do Rio de Janeiro estarão sujeitos a novas regras referentes ao Imposto sobre a Transmissão Causa Mortis e por Doação, de quaisquer Bens ou Direitos (ITD). De um modo geral, os comentários em relação às inovações introduzidas pela Lei 7.174/2015 têm dado exclusiva atenção ao novo regime de alíquotas progressivas, porém, uma disposição abusiva concernente a doações com reserva de usufruto ocorridas sob o regime da antiga legislação parece ter passado despercebida.

Como era de comum entendimento, até mesmo entre as autoridades fazendárias, instituição e extinção de usufruto constituíam dois fatos geradores distintos sujeitos à incidência do ITD. De acordo com a norma anterior, em ambas as hipóteses a base de cálculo era 50% do valor do bem ou direito (Lei 1.427/1989, artigo 11, inciso I).

A partir de 28 de março de 2016, entretanto, os contribuintes passarão a recolher o tributo somente na instituição do usufruto, sendo sua extinção hipótese de não incidência:

Lei 7.174/2015
Art. 7º – O imposto não incide: […]
III – na extinção de usufruto ou de qualquer outro direito real;

Destaca-se que o legislador optou por manter a redução da base de cálculo nos casos em que a instituição de usufruto não se der mediante sua reserva no momento de uma doação, como se percebe da transcrição do dispositivo abaixo:

Lei 7.174/2015
Art. 24. Na transmissão de bens imóveis ou de direitos a eles relativos, a base de cálculo é: […]
III – 50% (cinquenta por cento) do valor do bem na:
a) instituição de usufruto, uso e habitação; e

Pode-se afirmar, portanto, que houve esforço legislativo expresso em retirar a extinção de usufruto do campo de incidência do ITD.  Trata-se de sistemática já utilizada em outros Estados da Federação, a qual justifica a majoração de alíquotas prevista na nova lei.

Em regra, a fim de se determinar a constituição de um crédito tributário, aplica-se a lei vigente à época de ocorrência do fato gerador. No caso do ITD, por conseguinte, a extinção de usufruto somente poderia ser tributada se ocorrida sob a vigência da revogada Lei 1.427/1989, uma vez que, de acordo com a nova legislação, referido ato jurídico não mais dará ensejo a recolhimento tributário.

Ocorre, porém, que o legislador, afrontando os princípios constitucionais limitadores da tributação, inseriu também o seguinte dispositivo no ordenamento fluminense:

Art. 42. Por ocasião da extinção de direito real reservado pelo transmitente quando da transmissão da titularidade do bem, realizada anteriormente à produção de efeitos deste artigo, deverá ser paga a segunda parcela do imposto, em complemento à primeira parcela de 50% (cinquenta por cento), recolhida no momento da ocorrência do fato gerador. (original sem grifos)

Não há, nem nunca houve qualquer menção legal a parcelamento do crédito tributário de ITD ou qualquer hipótese de diferimento. Ao contrário, ocorria a incidência do imposto em dois momentos distintos, a instituição do direito real de usufruto e sua extinção. Ambas as hipóteses, como já ressaltado, tinham como base de cálculo metade do valor do bem ou direito. Inexiste qualquer argumento lógico capaz de sustentar uma falaciosa tese que defenda a ocorrência de um diferimento tributário e não de diferentes fatos geradores.

Entende-se, assim, que o artigo 42 da Lei 7.174/2015 extrapola o poder de tributar do Estado, uma vez que propõe o recolhimento ao Erário por conduta fática que não constitui relação jurídico-tributária: tornou-se ilegal e ilegítima qualquer tentativa de cobrança de ITD quando da extinção do direito real de usufruto. Muito provavelmente, tão apenas a via judicial será capaz de resguardar os princípios constitucionais capazes de frear a sanha arrecadatória do Fisco.

 

 

Autores: Roberto Bekierman sócio do escritório Fraga, Bekierman e Cristiano Advogados.

 Jean Pontes é associado do escritório Fraga, Bekierman e Cristiano Advogados.


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