O Apartheid Digital

Mario Antônio Lobato de Paiva

A inserção dos computadores no meio jurídico na década de 70 surgiu inicialmente em grandes escritórios com altos recursos vislumbrando a necessidade de aprimoramento de seu trabalho e maior presteza em seu serviços.
Com o tempo verificou-se que o computador era como uma espécie de epidemia proveniente do Primeiro Mundo que mudaria praticamente todo o sistema jurídico do país de forma instrumental (informática jurídica) e científica (Direito da Informática).
Chegamos ao ponto de acreditar que o presente e futuro do profissional do direito depende em grande escala de sua capacidade em assimilar as inovações tecnológicas aplicáveis ao e no direito. Uma questão de sobrevivência no mercado de trabalho.
Presenciamos hoje um mundo jurídico redesenhado onde não é mais tolerável a utilização das máquinas de escrever, pois a necessidade de celeridade no trabalho é fundamental para o bom desempenho do profissional.
Estamos diante de um verdadeiro apartheid digital nos mesmos moldes da segregação racial ocorrida na África do Sul quando colonizadores de origem inlgesa e holandesa após a guerra dos Boeres (1902) passaram a definir esta política só que a separação dá-se entre aqueles que se utilizam e os que não se utilizam dos aparatos eletrônicos em seu ofício.
Portanto, dependemos dos meios eletrônicos para a realização de um trabalho eficaz e não podemos nos dar o luxo de ficarmos alheios as transformações ocorridas no campo da informática. Para que tenhamos uma pequena idéia prática expomos o seguinte caso corriqueiro de um indivíduo que chega a seu escritório de advocacia e solicita informações sobre o andamento processual de sua lide na Justiça Comum. Aquele advogado que não detém conhecimentos de acesso e navegação na internet terá que se dirigir ao Tribunal para verificar no Cartório ou terminal de consulta a informação, porém, aquele profissional que domina estes conhecimentos precisará apenas de alguns segundos para dar uma resposta rápida e segura a seu cliente que sairá satisfeito de seu escritório e não gastará mais nada por isso bastando apenas acessar o site do Tribunal respectivo.
Poderíamos ainda exemplificar diversos casos como o acima relatado, porém preferimos apontar algumas soluções viáveis para a diminuição desde abismo que provoca a segregação e impede muitas vezes o desenvolvimento cultural.
Uma de nossas proposições seria a de que a utilização do computador deverá ser obrigatória nos cursos de Direito através disciplina informática jurídica permitindo que o estudante tenha acesso já nos bancos das faculdades aos recursos tecnológicos-jurídicos existentes na rede de informação mundial.
Nos concursos públicos deverá ser exigido conhecimentos técnicos de digitação, pesquisa na jurisprudência, acesso a internet, etc.. para cargos de nível médio e superior relacionados a atividade jurídica. E aqueles privativos do bacharel em direito deverão ser exigidos conhecimentos mais significativos que compreendam a informática jurídica e o Direito da Informática.
A OAB, Tribunais de Justiça, Promotorias, Defensorias Públicas e demais instituições afins por sua vez deverão inserir em seus exames questões práticas e teóricas envolvendo as disciplinas acima referidas como forma de colocar no mercado profissionais mais aptos a desenvolver seu mister.
Aqueles que já encontram-se em atividade e não tem familiaridade com o computador recomendamos com urgência a reciclagem e aprendizagem não só dos funcionários mas também e principalmente, daqueles que comandam a atividade, e de preferência, com um profissional especialista no assunto.
A questão da idade é praticamente irrelevante já que, depende exclusivamente da força de vontade daquele que almeja aprender. Além disso conhecemos vários profissionais que ultrapassaram os sessenta anos de idade a exemplo do Ministro do STJ José Augusto Delgado e que tem mais habilidade do que nós no manuseio e administração de seus 18 (dezoito) computadores.
Outra questão que não pode ser desconsiderada é a realidade econômica do profissional. Por isso o orçamento das Universidades, Seccionais da OAB, Tribunais, enfim todos os órgãos de administração da justiça devem destinar parte de seus recursos para a compra de computadores, bem como o treinamento de seus membros para o manuseio dos mesmos. Concomitantemente, devem as seccionais da OAB estabelecer convênios com Bancos para a abertura de crédito aos profissionais que desejem aparelhar seu escritório com aparatos tecnológicos que permitam maior desenvoltura de sua atividade.
Acreditamos que com essa proposições será possível diminuir a ignorância digital e ao mesmo tempo conscientizar todos os leitores que vivemos hoje um verdadeiro apartheid digital que segrega o profissional que não tem conhecimento nenhum na área da informática e nem sequer sabe digitar suas peças daquele que possui o domínio do computador. Referido desconhecimento pode levar o profissional competente ao insucesso pela demora e ineficiência na redação de uma sentença, petição de denúncia ou parecer pela injustificável demora.
Por isso cabe a nós o alerta a todos para que levem mais a sério esta realidade jurídico-virtual sob pena de verem seus sonhos profissionais irem embora ou, pior ainda, o de prestar um serviço de má qualidade acentuando ainda mais a morosidade e contribuindo para a realização de injustiças.

Mário Antônio Lobato de Paiva é advogado em Belém; sócio do escritório Paiva & Borges Advogados Associados; Professor (pós-graduação em Direito de Informática) da Universidade Estácio de Sá em Minas Gerais; Sócio-fundador do Instituto Brasileiro da Política e do Direito da Informática – IBDI; Membro do Instituto Brasileiro de Direito Eletrônico; Presidente da Comissão de Estudos de Informática Jurídica da OAB-PA; Conferencista; e-mail: malp@interconect.com.br.

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