O crescente número de ações reparatórias por erro médico no TJ-MG

Autor: Felipe Fagundes Cândido (*)

 

O Tribunal de Justiça de Minas Gerais revelou, em recente levantamento estatístico, que nos anos de 2013, 2014 e 2015 houve crescimento do acervo de ações na Justiça estadual envolvendo pedidos de reparação por erro médico.

A despeito do aumento no número de sentenças prolatadas em feitos de tal natureza, com a publicação de 224, 284 e 349 sentenças nos anos de 2013, 2014 e 2015, respectivamente, o acervo de ações pendentes de julgamento aumentou consideravelmente. No mesmo lapso temporal, ainda aguardando decisão, havia nada menos que 2.301 processos ao final de 2015.

A medicina não é ciência exata e, em razão de tal particularidade, somente em raríssimos casos a obrigação do médico é de resultado, quando assegura o sucesso de sua intervenção, ao passo que em regra sua obrigação é de meio, ou seja, de empreender toda sua técnica e capacidade no ato médico, sem, obviamente, assegurar o sucesso de sua atuação. E sendo obrigação de meio, a responsabilidade do médico só é averiguada mediante a comprovação de sua conduta culposa ou dolosa, sem a qual necessariamente não haverá responsabilidade dele em indenizar o paciente pelo eventual resultado de sua intervenção.

No entanto, alguns poucos médicos se escoram na ausência de garantia do resultado de sua atuação para se eximir da responsabilidade indenizatória em casos de insucesso da intervenção, mesmo quando agiram com culpa/dolo, confiantes nas dificuldades de comprovação da conduta ilícita no ato médico.

Em tal cenário, ainda é incipiente o número de pacientes que acionam o Judiciário em busca da reparação pelos danos sofridos e, mesmo assim, tais autores encontram dificuldades em comprovar a conduta culposa/dolosa dos médicos, especialmente pela necessidade de prova técnica (perícia) a comprovar não só a conduta ilícita do médico como o nexo de causalidade entre ela e os danos daí advindos.

Infelizmente, o corporativismo da classe médica contamina muitas vezes as perícias feitas nas ações judiciais, às vezes inconclusivas, contraditórias e incompreensíveis, tudo com o intuito de isentar de responsabilidade o profissional da medicina.

Em recente julgamento, o Tribunal de Justiça de Minas Gerais reformou sentença de improcedência dos pedidos formulados por um contador, submetido a uma cirurgia bariátrica desastrada que culminou com a paraplegia dos seus membros inferiores. Naquele acórdão, prolatado na Apelação Cível 1.0672.10.028979-8/001, o desembargador Sérgio André da Fonseca Xavier destacou o cuidado que o julgador deve ter ao apreciar os laudos médicos em ações de indenização por erro médico.

Naquele precedente paradigmático, em louvável e corajosa decisão, o TJ-MG valorou as outras provas dos autos (documentos e testemunhas), afastando as conclusões periciais, para condenar o médico cirurgião, o anestesista e o hospital a indenizar aquele contador em danos morais, estéticos e materiais, pelo resultado desastroso da intervenção cirúrgica.

Registrou-se naquele julgado que:

“Não é dado ao cirurgião ser tão prepotente e arrogante a ponto de realizar o procedimento sem que sejam tomadas as devidas precauções de segurança, e deixar de exigi-las conforme a lei que o rege, nem ao anestesista ser tão submisso e negligente, a ponto de sucumbir à determinação dada por profissional que não detém qualquer hierarquia em relação a si. No que se refere ao nosocômio, não é crível tamanha inocência e ingenuidade a ponto de acreditar não possuir responsabilidade quanto ao que acontece em suas dependências”.

Assim, o aumento do número de ações reparatórias envolvendo erros médicos revela a maior confiança dos cidadãos no Judiciário, cientes de que, apesar das dificuldades, é possível demonstrar a ocorrência de condutas ilícitas dos médicos, de modo a viabilizar a condenação desses.

 

 

 

Autor: Felipe Fagundes Cândido é advogado e mestre em processo coletivo pela UFMG.


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