O Interrogatório e suas mudanças

José Carlos Teixeira Giorgis (*)

A Lei nº 10.792/2003, que entrou em vigor em 1º de dezembro do ano passado, além de promover modificações na Lei de Execução Penal, como nos regimes disciplinares, isolamento, cadastro nacional de vagas, construção de presídios e cumprimento e progressão das sanções, também acresceu algumas mudanças no interrogatório judicial, muitas derivadas da reiteração jurisprudencial, outras oriundas da pregação doutrinária, e que estão causando alguma polêmica no cenário jurídico brasileiro.

O Código de Processo Penal vem se mantendo hígido há mais de sessenta e três anos, passando por alguma maquiagem, aqui ou ali, sem afetar sua substância ou estrutura, constituindo-se a substituição de alguns padrões do interrogatório judicial como uma reforma acentuada.

Em primeiro lugar, o acusado que comparecer perante a autoridade judiciária, será qualificado e interrogado na presença de seu defensor, constituído ou nomeado (artigo 185), garantia que antes não se fazia presente, mas que estava implícita no da ampla defesa, incluindo-se um parágrafo no dispositivo para acolher a possibilidade de que o ato seja realizado no próprio estabelecimento prisional, garantida a segurança do juiz e dos auxiliares, em sala própria, com presença da defesa e publicidade do ato, ou, caso falte àquela garantia, a solenidade retorna ao foro(§1º).

Como já vinham praticando vários magistrados, especialmente em infrações de competência do tribunal do júri, o juiz deve assegurar o direito de entrevista reservada do acusado com seu defensor, antes de tomar o depoimento, exatamente para preparar sua versão (§ 2º).

Em obediência a cânone constitucional, após a qualificação e ciência do teor da acusação, o juiz informa o acusado o seu direito de permanecer calado, enfatizando-se que tal silêncio nem implicará em confissão, quanto mais em elemento de convicção negativa a influir na consideração da defesa (artigo 186, e § único), o que, diga-se, já constava em artigo apartado desta prova.

Ao ordenar as perguntas habitualmente feitas ao depoente, a prescrição alterada informa que o interrogatório contém duas etapas, sobre a pessoa do acusado e sobre o fato, nada mais fazendo que digitar lição dos manuais, eis que na primeira fase se trata dos antecedentes e passado do agente e após, sua participação no evento delituoso (artigo 187, anterior artigo 188).

Em inovação relevante, que não era seguida por muitos julgadores, embora se tratasse de respeito ao contraditório, agora se comanda ao juiz que, findo o interrogatório, as partes devem ser indagadas sobre a existência de algo que não fora devidamente esclarecido, formulando as perguntas correspondentes se assim achar pertinente (artigo 188), superando posição conservadora que entendia a inquirição como ato presidencial absoluto, onde somente o magistrado perquiria.

Desnecessariamente se repetem as providências a tomar para o interrogatório do mudo, do surdo e do surdo-mudo, onde não houve transfiguração relevante (artigo 192 e incisos), como também quanto à intervenção do intérprete para quem não fale a língua nacional (artigo 193), providências quanto à falta de assinatura ou analfabetismo (artigo 195) e possibilidade de realizar-se outro interrogatório a qualquer tempo, agora, de ofício ou a pedido fundamentado de qualquer parte, isso sim exercício de direito do acusado.

Como se vê, embora as boas intenções, a cirurgia não foi invasiva, permanecendo na epiderme desta importante prova, salvo uma ou outra injeção endovenosa.

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