O Ministério Público:ônus da prova e a dignidade humana

Sergio Abinagem Serrano

PROMOTOR DE JUSTIÇA
TITULAR DA 13ª PROMOTORIA DE JUSTIÇA DE GOIÂNIA
ESPECIALISTA EM DIREITO PENAL, PROCESSUAL PENAL E CRIMINOLOGIA
MEMBRO DA BANCA EXAMINADORA DO CONCURSO PÚBLICO PARA INGRESSO NA CARREIRA DO MINISTERIO PÚBLICO GOIANO – 2004

INTRODUÇÃO
A DIGNIDADE HUMANA X PESSOA OBJETO DO PROCESSO

A Constituição Federal de 1988 elevou a dignidade humana como um dos princípios constitucionais do Estado Democrático de Direito, o que vale dizer que qualquer ser nascido de mulher é digno, não podendo o Estado negar-lhe esta condição: de ser humano.
Assim, não se pode permitir a pena de morte porque é negar-lhe o direito a existência, tratando-o como um objeto do processo a ser destruído; não se pode prendê-lo perpetuamente, pois é característica do ser humano ansiar pela liberdade e um dia voltar a usufruí-la, isto é, as penas corporais e capitais foram banidas, salvo a pena de morte em caso de guerra externa declarada.
O sistema de culpabilidade baseada na exigibilidade de conduta diversa, nega a condição humana ao acusado, transformando-o em um objeto do processo, em um ser ético e moral, sendo que a moral e a ética são incompatíveis com o Direito em um Estado Democrático, que não nega a existência de valores conflitivos na sociedade.
Em uma sociedade conflitiva como a nossa, industrializada, praticamente estagnada economicamente por décadas, com recessão, desemprego, falta de políticas básicas de moradia, de educação e de saneamento básico, além de uma péssima distribuição de renda, o discurso jurídico-penal tende a ser preventivo, com o intuito de atingir o indivíduo tido como “perigoso”, havendo uma intolerância contra os “maus criminosos”, que são os que perpetuam violência e grave ameaça às pessoas, notoriamente com o fim de alcançar o patrimônio móvel. Pouco relevante no Direito Penal Brasileiro é o de atingir, por exemplo, aquele que desviou o dinheiro público destinado a construir uma escola, fazendo com que muitos jovens, sem perspectivas, se tornassem “maus criminosos”(violentos).
No processo penal brasileiro, onde vigora o superado dogma da busca da verdade real, de origem totalitária, a pessoa humana é transformada em um verdadeiro objeto do processo, com prisões preventivas que visam muito mais uma antecipação de pena do que a segurança do Juízo, sob as estritas condições do artigo 312 do Código de Processo Penal.
Se o objetivo do Direito Penal é aplicar uma pena criminal e o processo penal brasileiro serve como forma de controle social dos mais pobres, a busca da “verdade” se torna um dogma intocável, pois todo fato típico e antijurídico que se prove a sua existência e, que tenha sido praticado por um indivíduo culpável, receberá indubitavelmente uma pena, sem qualquer análise se a conduta é socialmente relevante, se o resultado da conduta possui relevância social, se a construção da conduta típica não visa impor valores éticos e morais de um grupo ético-social e religioso dominante sobre os demais grupos minoritários. Como exemplos de imposição de conduta ética e moral de grupo religioso majoritário, temos as construções típicas dos crimes de “sedução”, de “adultério” e de “bigamia”, além da construção da ficção jurídica da “presunção de violência” nos crimes contra a liberdade sexual; além disto, possuímos o termo pseudo-moralista “mulher honesta” nos crimes de rapto; a punição pelo modo de vida como a “contravenção por vadiagem”, etc. Não verifica-se ainda, se há ou não violação do princípio da lesividade, da proporcionalidade, etc.
Transforma-se, dessa forma, o Direito Penal em um direito controlador dos excluídos e mantenedor do status social vigente, mesmo que injusto, fazendo dos operadores do Direito Penal, não em agentes políticos de um Estado Democrático de Direito, que é racional, mas sim, em colaboradores de grupos elitistas que querem a prevenção contra condutas que atinjam seus interesses, embora as elites perpetuem delitos muito mais graves do que os cidadãos de baixa renda, lavando dinheiro do crime organizado, apropriando-se do dinheiro público, sonegando grandes somas de tributos, utilizando-se da informática para a prática de delitos diversos, além de corromperem autoridades do Estado; insinuam-se na política partidária, passando a ocupar cargos importantes e valem-se de tais cargos para cometerem delitos vários, geralmente envolvendo cifras vultuosas!
Falar do ônus da prova do Ministério Público em um Direito Processual Penal Constitucional não é tão simples se atentarmos para o espírito democrático e para o senso do dever funcional que incumbe ao membro do Ministério Público, em face dos artigos 127, 129, I, da Carta Magna, respeitando-se, sobretudo, o artigo 1º, inciso III, da Constituição Federal.
Devemos desde já refletirmos, antes de buscarmos o ônus da prova, do que realmente temos que provar? Autoria? Materialidade? Existe o ônus da busca da verdade real? Já possuímos noção de qual seja o conceito de verdade? Provada a autoria e a materialidade, ensejará sempre a obrigatoriedade de pedirmos uma condenação e aplicação de uma pena?
São essas questões que tentaremos desenvolver de um modo simples em singelas páginas, a fim de contribuirmos com a defesa da dignidade humana e sobretudo na defesa do Estado Democrático de Direito.

TÍTULO I
A BUSCA DA VERDADE – UM SISTEMA ILEGÍTIMO.

O sistema de culpabilidade baseado na reprovabilidade da conduta do autor, qual seja, sendo o réu imputável e possuindo potencialmente a consciência da ilicitude, é exigível outra conduta do mesmo, isto é, exigi-se que o acusado obedeça a norma. Baseado em quê? Em sua liberdade. Mas essa liberdade em nada tem haver com sua conduta, pois esta é analisada antes da culpabilidade e da antijuridicidade. Na verdade, o fato de estar consciente e ter agido voluntariamente, nada tem haver com a exigibilidade de conduta diversa, mas sim com o próprio conceito de conduta. Então, em qual liberdade de agir que nos baseamos para exigirmos que tivesse o réu o dever de fazê-lo de forma diversa da praticada? Certamente que em uma liberdade moral e ética.
Nesse sistema(da reprovabilidade, da responsabilidade penal e da exigibilidade de conduta diversa), entende-se que o autor delituoso possuía motivos morais para convencer-se a si mesmo à obedecer a norma. Assim, todo agente que pratica um fato típico, antijurídico e culpável estará fadado a receber uma pena e a passar a ter um rótulo estigmatizante de “criminoso”, de “culpado”.
Em um Estado Democrático de Direito, com o preceito da dignidade humana, não se pode exigir moralmente que um cidadão aceite uma norma penal ou extrapenal como válida. Ao contrário, é característica do Estado de Direito Democrático a possibilidade do cidadão não aceitar a norma, sendo lícito que em uma suposição empírica, tanto em face da conduta de outros cidadãos, quanto em um monólogo, que a pessoa entenda que a norma não é válida.
O Estado Democrático de Direito entende e aceita o conflito social e de valores e faz tudo para diminuir tais conflitos, através do controle primário da criminalidade(lazer, educação, saúde, distribuição de renda e de oportunidade, empregos, etc.), deixando a intervenção secundária ou estatal em última ratio, pois sabe que o Direito Penal é simbólico, somente alcançando cerca de 5% da realidade criminal, devendo, então, priorizar a criminalização das condutas relevantes, tais como, a criminalidade difusa, como a do crime organizado e lavagem de dinheiro, ou o narcotráfico, além dos crimes cujas condutas são praticadas mediante violência ou grave ameaça à pessoa. É o Direito Penal Mínimo, ou abolicionismo moderado.
Se o Estado não promove socialmente o bem-estar de seu povo, então a democracia é meramente formal, ou uma expectativa de democracia, uma promessa para o futuro, com práticas reais de ditaduras, tais como o emprego da tortura, execuções sumárias por grupos de extermínio, etc.
Em um autêntico Estado Democrático de Direito(democracia real e não apenas formal), o cidadão somente é obrigado a obedecer a norma quando encontrar-se diante de uma situação fática em que esteja obrigado a obedecê-la, não porque encontram-se presentes todos os elementos da culpabilidade e ausentes quaisquer excludentes, mas porque deverá respeitar os demais cidadãos que aderem a norma, que a reconhecem como válida. Dessa forma, uma pessoa que desista de matar outra porque não encontra meios adequados para planejar e executar um crime de homicídio que torne o crime perfeito e, temendo por sua liberdade, não exterioriza a conduta típica, obedece a norma contida implicitamente no artigo 121 do Código Penal como qualquer outro cidadão que jamais pensou em matar alguém.
Em um Estado Democrático de Direito, o cidadão poderá pelos meios lícitos e válidos, lutar para que os demais cidadãos compreendam que a norma não deva mais prevalecer, seja através de discursos, de diálogos, manifestações escritas, seja através dos pleitos eleitorais, votando e sendo votado.
Cidadão, portanto, será aquele que participa dos processos de elaboração das normas, tendo a oportunidade de votar e de ser votado, de discursar e de externar suas opiniões(liberdade de expressão). Esse mesmo cidadão que em uma autocrítica, possui a liberdade de contestar a validade da norma, possui o dever de obedecê-la não por uma obrigação ética e moral, mas porque deve respeitar outros cidadãos que aceitam a norma, podendo por seus próprios e legítimos meios, convencê-los da ilegitimidade de um mandamento(conforme ensinamento de Klaus Günter, “A culpabilidade no presente e no futuro”, Revista Ciências Criminais, RT, Publicação oficial do IBCrim, ano 6, nº 24, 1998, pgs. 79/92). Caso delibere em violar a norma, o cidadão será uma pessoa deliberativa, comunicando à vítima e à sociedade que não aceita a norma como válida, estabelecendo-se, assim, um conflito entre a pessoa que deliberou violar a norma e os demais cidadãos que acatam a norma como válida.
Com essa definição de cidadão, entendemos que aquele que for totalmente excluído do processo de formação da norma, não tem o dever de observância, até mesmo por ignorá-la; lembrando-se que falamos da norma e não da ignorância da lei. Aliás, ZAFFARONI & PIERANGELLI, na obra “Manual de Direito Penal”, RT, diz que nos casos de exclusão social deverá haver a atenuante inominada do artigo 66 do Código Penal, a denominada co-culpabilidade(co-responsabilidade da sociedade), por inobservância dos direitos sociais dos cidadãos, nos termos dos arts. 6º a 11 da Constituição Federal.
A culpabilidade no Estado Democrático de Direito não deverá ser somente baseada no sistema de excludentes de elementos normativos (imputabilidade, consciência potencial da ilicitude e exigibilidade de conduta diversa), mas também(o ideal seria tão somente) constituída de um juízo de imputação subjetiva, onde o membro do Ministério Público atentará, independentemente do fato estar provado e de encontrarem-se presentes os elementos normativos da culpabilidade, se a norma é válida, isto é, se a pessoa deliberativa(que não aceita a norma e, em uma situação fática, a viola), ao atentar contra um bem jurídico protegido pela norma, não encontra respaldo nos demais membros da sociedade, isto é, se a sociedade já não retirou a validade normativa. Por exemplo: se a sociedade entende ou não que as normas que estão implícitas nas condutas típicas dos artigos 217 e 240 do Código Penal, ainda estão em vigor; se ainda protegem algum bem jurídico penalmente relevante. Havendo um consenso de que não estão mais em vigor, deverá o réu ser absolvido, devido ao fato de que ao deliberar violar a norma, o povo, único detentor do poder em uma democracia(art. 1º, parágrafo único da CF), de forma consensual ou pelo menos de forma majoritária, entende que ambas condutas já deveriam ter sido descriminalizadas por ausência de bem jurídico a ser tutelado pela norma penal, visto que o Direito de Família já consegue solucionar os conflitos advindos de tais condutas(a de seduzir uma jovem ou a de cometer adultério). Perceberá o membro do Ministério Público que não estará sendo um Promotor de Justiça, mas sim um órgão fiscalizador de “costumes morais” de grupos conservadores, caso persista na atitude de estigmatizar um cidadão que pratique condutas irrelevantes e que estará impondo ao réu valores éticos e morais em um Estado Democrático, onde aceita-se que grupos sociais possuam valores diferenciados e conflitivos.
Concluindo o exemplo, a lei continua formalmente em vigor, mas já não é relevante para a proteção do bem jurídico tutelado, não encontrando-se mais a norma vigente, revogada pela soberania popular, através do consenso, ou, pela vontade da maioria. Isto é, rotular um jovem ou uma pessoa como “criminosa”, estigmatizando-a no rol dos culpados, com todas as conseqüências maléficas daí decorrentes em sua vida, por sedução, adultério, bigamia, contravenções penais, etc., é transformá-la em uma pessoa ética e moral e não respeitá-la como um ser humano, causando um mal social muito maior à sociedade do que um benefício, pois ausentes em tais casos a necessidade da prevenção geral ou específica da pena, pois as pessoas cometem adultério(incentivadas até mesmo por novelas, filmes e revistas) e namoram, mesmo sendo menores de 18 anos, com a permissão dos pais, que permitem que suas filhas cheguem altas horas da noite, adentrem e circulem nos veículos de seus namorados, que depois serão estigmatizados como se criminosos fossem.
Seguindo por essa linha de raciocínio, não se pode esquecer que a pessoa que deliberou violar a norma(pessoa deliberativa), comunicou à vítima(agir comunicativo da pessoa deliberativa) que não aceita a norma como válida(art. 217 do Código Penal); a vítima aceitou consensualmente que igualmente não aceita a norma insculpida no artigo 217 do Código Penal como válida, não aceitando, inclusive, a norma paterna como válida(“permaneça sem manter conjunção carnal enquanto menor de 18 anos”). Dessa forma, há um consenso comunicativo entre autor e vítima. Se há consenso entre autor e vítima quanto à conduta, não há crime a ser apurado, mesmo que o fato encontre-se provado e seja formalmente típico.
A pessoa deliberativa, igualmente comunicou à sociedade, que a norma do artigo 217 não é válida. Hoje, as pessoas entendem que os jovens menores de 18 anos podem iniciar a vida sexual, alegando igualmente que é muito salutar para o seu desenvolvimento, desde que se previnam contra gravidez precoce, doenças sexualmente transmissíveis e a Aids. Assim, a norma(e não a lei) está revogada, pouco importando que a “verdade” encontra-se provada. E a lei não é o objeto de proteção da norma, mas sim, bens jurídicos relevantes.
Quando uma pessoa deliberativa viola a norma e esta é aceita como válida pela sociedade(como p. ex., arts 121, 157, 213, 214, 312, do Código Penal, etc.), deverá receber pena pelos fins preventivos desta. A prevenção geral para que a sociedade entenda que o bem jurídico é relevante e que possui valor social, encontrando-se de fato protegido pela norma(provocar a consciência normativa da sociedade); já a prevenção específica, tem por finalidade demonstrar à pessoa deliberativa, que o bem jurídico encontra-se protegido e a norma é válida e, que mesmo tendo direito de não acatá-la, não possui o direito de violá-la quando se vê faticamente obrigado a cumpri-la, por respeito aos demais cidadãos que aderem a norma e que são a maioria e, que através de sua conduta, houve um dissenso entre o seu agir comunicativo(não aceitar a norma como válida e violá-la) e os demais membros da sociedade, que não aceitaram a violação do bem jurídico, por ser este relevante para a vida social.
Não será o objetivo do Ministério Público Democrático, o de provar a verdade real dos fatos e buscar punir o autor por não aceitar a norma como válida, porque lhe era exigível outra conduta(o que é uma postura moral neokantista), mas sim, provar formalmente, nos autos, a existência e a autoria de um fato típico, antijurídico e culpável, bem como, que a norma protege um bem jurídico relevante e que encontra-se em vigor pela vontade da soberania popular. Jamais servir o órgão ministerial de proteção de quem possui bens móveis contra aqueles que não possuem bens! Ao contrário, o Ministério Público deverá equipar a Instituição de órgãos de investigação e de combate ao crime organizado, lavagem de dinheiro, desvio de dinheiro público e sonegação fiscal, a fim de que milhares de brasileiros tenham acesso a bens de consumo, acesso à educação, moradia, renda, etc. Aí sim teremos uma atuação relevante no Direito Penal, como já possuímos, por exemplo, na defesa dos direitos difusos e coletivos.

TÍTULO II
“VERDADES” APRIORÍSTICAS SOBRE A PRISÃO –

Quando nós, operadores do Direito, negamos a existência de valores conflitivos na sociedade, passamos a agir moralmente, conforme nossos valores e, atuando mediante nossas atribuições em uma instituição governamental, que deveria agir sempre racionalmente, acabamos impondo nossos valores éticos e morais aos acusados, durante o processo e após este, já na fase de execução penal. Nesta fase, são chamados de reeducandos. Ora, o termo reeducando é ideológico, pois seria o indivíduo que era educado, deixou de sê-lo e necessita de voltar aos valores que possuía anteriormente, como alguém que necessita passar por uma reforma íntima: era um homem educado, deixou de sê-lo, sendo necessário a prisão para reeducá-lo.
Na realidade, o réu recebeu os valores da sociedade em que vive(de consumo), introjectou que consumir é bom e traz bem-estar e felicidade e, vendo-se privado da capacidade de consumir, percebendo que a escola pública não fará com que consiga ascensão social, embora a vida toda ouviu que ascensão social é possível nesse tipo de sociedade(de capital e de consumo), passou, então, a buscar os bens de consumo através da grave ameaça e violência à pessoa humana. Assim, o autor de um delito, jamais foi educado com valores positivos(honestidade, seriedade, honradez, desprendimento dos bens materiais) e, agora, na prisão, não o será certamente. Não necessita de reeducação: a educação que recebera, em sua bolha social, de que os valores de consumo são corretos, foram essenciais para a formação de sua personalidade e que assumisse as atitudes violadoras das normas penais contra o patrimônio.
A prisão, igualmente, não será um local de educação(ou “reeducação”), visto que, trata-se de uma instituição totalizadora, onde o tratamento dispensado aos internos é massificado, com horários rígidos para acordar, dormir, ir ao banheiro, alimentar, ou ainda, sem direito a estar sozinho. Enfim, a prisão promove, de forma violenta, a destruição do “eu”.
A realidade prisional é tão diversa, que quem possui status entre os presos são justamente os mais violentos, isto é, quanto mais violento for, quanto mais demonstrar que é perigoso, o detento merecerá maior respeito dos companheiros de cela e de seu pavilhão; “ser do crime” é um status no mundo prisional. Dessa forma, a exteriorização de um comportamento gentil e educado nos presídios, sujeitará ao detento que quer “reeducar-se” a suportar a rejeição dos companheiros de cela e a sofrer violência psíco-física que o destruirá interiormente.
Na realidade quem é submetido a um regime institucional totalizador, tende a introjectar seus valores, até mesmo para poder sobreviver no mundo hostil em que se encontra, isto é, a repetir o comportamento padrão do local. Se para viver um pouco melhor é necessário aceitar a posição de um líder e de um grupo de cela, mesmo que para isso, tenha que se tornar agressivo para com outro grupo rival, certamente o fará, com o intuito de não ser massacrado pela subcultura delinqüente, dominante no ambiente. É essa subcultura, com regras definidas de violência, crueldade e desumanidade, que possui gestos e expressão corporal próprios e linguajar peculiar, que emerge dos sistemas prisionais, formando um novo tipo de sociedade, tratando-se da vida social prisional.
A aceitação do rótulo de delinqüente e do estigma de criminoso, levará o preso a repetir no interior da prisão e, quando fora dela, os valores que recebera e que introjectara quando no cárcere. Portanto, a prisão nos moldes atuais é um fator de produção de reincidência(fator criminógeno) e não de “reeducação” humana.
A reeducação, portanto, é um dogma, criado para negar o conflito social, a fim de ratificar a existência de uma sociedade burguesa virtuosa de valores éticos e morais consensuais.
O processo penal democrático não comporta nenhum “a priori”, prevenção baseada em “verdades” pré-concebidas e estereótipos, dogmas e deduções.
A prisão, portanto, não é para reeducar, mas sim para demonstrar à sociedade(prevenção geral) e ao autor do delito(prevenção especial) que o bem jurídico afetado é relevante e encontra-se protegido pela norma, criando-se uma consciência normativa na maioria dos grupos sociais, mesmo que conflitivos.
Sendo um fator de geração de delinqüência, a prisão somente deveria ser prevista para crimes graves contra a pessoa e os que causassem violação a bens jurídicos difusos e coletivos, de forma relevante, ampliando-se o leque das penas restritivas de direitos e alternativas, aumentando-se a competência originária para juizados especiais criminais, notoriamente nos crimes sem violência ou grave ameaça à pessoa, desde que atingissem bens jurídicos individuais.

TÍTULO III
O QUE É VERDADE?

Na Idade Média, quando imperou por séculos a Inquisição (de triste memória para a humanidade, cujos reflexos maléficos ainda persistem na cultura da sociedade brasileira, como o apoio à tortura, a importância pela busca da confissão do investigado e as prisões provisórias), a verdade era metafísica, ou seja, o pensamento abstrato de sacerdotes, ligados ao pensamento divino que representavam, era a mais pura verdade.
Sabiam os representantes de Deus na Terra, o que era ou não uma heresia, ou quando uma influência maléfica ou demoníaca dominavam as ações de um ser humano e o que deveria ser feito para purificá-los. O sofrimento físico e moral purificaria a alma.
Assim, tais absurdos tomaram conta do pensamento obscuro da sociedade à época, com extrema insegurança às pessoas.
O sacerdote investigador instaurava um procedimento que, sem o devido contraditório, chegava a uma conclusão, através de indícios, muito embora não confiáveis empiricamente, qual seja, sem que houvesse um respaldo da materialidade ou do que se pudesse contraditar. Daí a verdade metafísica, metapsíquica, fenomênica, enfim, abstrata e obscurantista.
Com o fim da inquisição, a denominada ciência(“a ciência”, como gostam de denominar os cientistas), com seus traumas por tantos séculos de obscurantismo, separou-se totalmente do pensamento abstrato. Seria agora verdade, o que se pudesse comprovar empiricamente, materialmente, isto é, o que se mede, o que se pinça, o que se vê, o que se comprova através dos cinco sentidos.
No Direito Penal, o positivismo de Lombroso e Ferri trazem para o Direito Penal a física mecanicista de Newton, o naturalismo de Darwin, a sociologia criminal e a criminologia, além da psiquiatria e psicologia forense. São as correntes materialistas e socialistas que invadem a cultura jurídica, influenciando o fascismo, o nazismo e o marxismo e, evidentemente, os Estados Totalitários latino-americanos.
Basta ver o artigo 13 “caput” do Código Penal Brasileiro que temos nitidamente a lei da física mecanicista, tentando explicar a conduta humana, suas causas, concausas e efeitos.
A explicação científica para o mundo, ou cientificismo faz do homem um ser determinista e, em muitos casos, perigoso, a ser combatido preventivamente, antes mesmo que se inicie as práticas de novos crimes.
O neokantismo traz de volta o valor da confissão, impondo valores éticos e morais ao Direito Penal. É o criminoso que reconhece que os valores são consensuais e que errou e, por isso, arrepende-se e confessa, tendo então sua pena atenuada(art. 65, III, alínea “d”, do Código Penal), em um claro reconhecimento do Estado à confissão espontânea e ao arrependimento(valor moral religioso).
Na aplicação da pena, conforme artigo 59 do Código Penal é de crucial importância a personalidade do agente e sua conduta social. Portanto, o modo de vida do agente delituoso, pesa na fixação da pena base, ou seja, não importa somente o que ele fez(o fato em si), mas igualmente o que ele é!
A periculosidade, aliada à moral e aos costumes, faz com o que o Estado Brasileiro veja agravante no fato do réu ser reincidente, conforme artigo 61, I, do Código Penal(culpabilidade do autor do fato e não culpabilidade do fato praticado pelo autor).
Dessa forma, se um fato empiricamente pode ser provado e a autoria é certa, mesmo porque o réu é confesso, a condenação será a conseqüência, sem maiores análises das presenças ou não dos fins da pena: prevenção geral e específica.
Países que puniram pessoas porque são perigosas causaram tragédias humanas, como a perseguição nazista a ciganos, homossexuais, deficientes físicos e mentais, testemunhas de Jeová(à época conhecidos na Alemanha como “leitores da bíblia”), judeus, eslavos, etc.
A busca da prova da autoria e da materialidade, não pode sobrepor-se à busca dos valores da dignidade humana. Se a presunção é de inocência pelo crime que se imputa a alguém, não se pode deduzir que essa pessoa irá voltar à delinqüir porque é pobre e por não possuir residência fixa ou porque não possui trabalho, mesmo porque vivemos em um país cuja maioria das pessoas são pobres e sem moradia, além de uma grande massa de desempregados. A prova da verdade que se busca, nada mais é do que a justificativa de exercermos o controle social dos excluídos, assim como, guardadas as devidas proporções, nazistas controlaram os seus “perigosos”.
Um fato não se encontra sobejamente provado porque há confissão e porque existe nos autos a materialidade. Resta-nos provar que o bem jurídico foi afetado de forma relevante pela conduta do autor e que estão presentes os fins da pena(geral e específico).
Como vimos, o pensamento abstrato obscuro da inquisição retornou com o valor probante da confissão, inundando o território brasileiro da odiosa prática de tortura, defendida e decantada por muitos cidadãos, notoriamente os de classe média, pois são as maiores vítimas dos crimes contra o patrimônio, como por exemplo, o furto e roubo(respectivamente, arts. 155 e 157 do Código Penal).
A visão inquisitorial ainda presente no inconsciente coletivo brasileiro, leva ao raciocínio de que a tortura é uma forma de correção do criminoso(purificação da alma), quando na realidade a tortura é a imposição da vontade do torturador sobre sua vítima, tratando-se da subjugação de um ser humano pelo outro, através da força bruta. A vontade do torturador para que o torturado confesse sobrelevará a verdade sobre o fato, pois o violado não suportará física e psiquicamente as formas de tortura a que estará sujeito, preferindo que o sofrimento cesse e, se para fazê-lo cessar a confissão é o único meio, confessará a prática do delito que se “investiga”( sobre a prática de tortura e a submissão do torturado, vide ELIO GASPARI, “Ditadura Envergonhada e Ditadura Escancarada”, editora Companhia das Letras, ano 2002).
Incrível que muitas vezes, o crime mais grave(tortura) é praticado para descobrir-se o delito menos grave, como o furto, que é cometido sem violência ou grave ameaça à pessoa.
A prova da existência do fato, de sua autoria e da materialidade acabam levando o réu a uma condenação, superlotando presídios, com muitas pessoas que sequer necessitavam cumprir uma pena criminal(por ausente o fim específico da pena), o que levou o sistema penitenciário a uma falência, somando-se evidentemente, à falta de investimentos no setor pelo poder público.
O próprio inquérito policial é resquício inquisitorial, sem contraditório e sem garantida à ampla defesa do indiciado, embora ser indiciado já seja um estigma na vida de um cidadão.
A final, o que é verdade? Trata-se de um conceito ôntico ontológico. A colocação de adjetivos sobre o que é verdade por si só, leva-nos a crer que o ser humano sequer possui um conceito pronto e acabado sobre a questão, pois se algo ocorreu e é verdadeiro, por que “verdade real”? Se não há como saber como tudo de fato ocorreu, como afirmar que o que se encontra nos autos reflete uma verdade? Daí afirmo, sem rodeios, que os juristas lidam tão somente com a verdade formal.
Para demonstrarmos que o dogma da verdade real é uma ficção neokantista, necessário façamos a diferenciação do que seja fato e releitura do fato. Por exemplo: “A” mata “B”(é o fato); a polícia inquire testemunhas, realiza perícias, colhe os depoimentos das pessoas supostamente envolvidas, etc. No caso, a polícia está realizando uma releitura do fato. Assim, o fato já ocorreu! Nenhuma autoridade estatal terá contato real com o fato, mas tão somente com a interpretação do que ocorreu. Basta esse raciocínio para ficar demonstrado a inexistência do ônus da prova de se buscar a verdade real, pois esta é uma ficção criada ideologicamente por países totalitários, com o evidente intuito de permitir-se ao juiz descer de sua inércia e imparcialidade, a fim de ajudar a “combater o crime”, auxiliando, muitas vezes, a acusação, em detrimento ao direito do cidadão de ser julgado por um magistrado totalmente isento e sobretudo um garantidor de sua liberdade e não o seu algoz!
O Ministério Público ao receber o inquérito policial e ofertar a Denúncia estará realizando a segunda releitura do fato; já o Magistrado ao sentenciar estará operando a terceira releitura do fato.
Os operadores do Direito Penal possuem contato com as versões sobre o fato, mas jamais com o fato em si. A vítima dirá na polícia ou em juízo que provocou o réu? O acusado que confessa um delito, dirá igualmente que planejara o delito por vários meses anteriores? São circunstâncias que não aparecerão nos autos, pois sempre as pessoas têm motivos para escondê-las. Até mesmo testemunhas compromissadas, seja por medo, receios, vínculos afetivos, valores morais sobre o fato ocorrido, ou até mesmo o simples nervosismo durante o depoimento em juízo, faz com que se coloquem na defensiva. E, se pararmos para uma simples reflexão, iremos entendê-los, pois o ser humano é assim mesmo, coloca-se na defensiva quando se vê ameaçado, seja essa ameaça real ou imaginária em seu psiquismo.
Dissemos anteriormente que o autor delituoso, que é um cidadão com todo direito de não aceitar uma norma em vigor como válida, ao deliberar violá-la perante uma situação fática, está comunicando à sociedade e à vítima que não aceita a validade do imperativo normativo. Ocorrendo a violação da norma, temos algumas hipóteses:
1) havendo consenso entre autor e vítima não haverá crime, pois a vítima igualmente é um cidadão que possui o direito de contestar a norma e aderir à comunicação do autor. Aqui não há busca de provas sobre quaisquer verdades. Em uma sociedade conflitiva, não será papel do Direito Penal impor ao réu valores éticos e morais, que a própria vítima não contesta;
2) há o consenso social que a norma não é válida, embora a lei encontre-se formalmente em vigor. Não há crime, pois a função do Direito Penal é tutelar bens jurídicos quando outros ramos do Direito Penal não possam fazê-lo. Não haverá crime também porque o poder emana do povo(art. 1º, p.ún. da CF) e, se consensualmente o povo entende que a norma não mais protege um bem juridicamente relevante, o estigma de criminoso não haverá que recair sobre o autor do fato, tão somente para impor valores morais de uma classe dominante ou religião majoritária, pois violaria sua dignidade humana(art. 1º, inciso III, da CF);
3) Majoritariamente ou consensualmente, a sociedade entende que a norma é válida, estabelecendo-se um dissenso entre autor e vítima e entre autor e sociedade. Esta será representada pelo Estado-Acusação(art. 129, I, da CF). Com a persecução penal estabelece-se o litígio, pois o direito de punir irá contrapor-se ao direito de liberdade e, como não existe a busca da verdade real no Direito Processual Penal de um Estado Democrático de Direito, a lide estará estabelecida e incumbirá ao Ministério Público, titular da ação penal, perante a verdade formal a ser demonstrada para o julgador (mero receptor de argumentos da acusação e da defesa), todo ônus da prova.
Agora podemos definir o que é verdade em um processo penal garantista: verdade é tudo o que comprovou-se licitamente nos autos em um processo-crime, pelos sujeitos processuais, através dos meios legítimos, cuja parte adversa, mesmo obtendo a oportunidade ampla de contraditá-la, foi incapaz de desconstitui-la formalmente.
Assim, afastando-se o dogma ditatorial da “verdade real” e claramente adotando-se a “verdade formal”, isto é, tudo o que é produzido perante o crivo do contraditório, podemos conceituar o que seja prova em um Estado Democrático de Direito, afastando-se, desde já, qualquer menção a “prova” ou “verdade” que não tenham sido produzidas na fase processual(no inquérito policial, portanto, há indícios, tão somente).

TÍTULO IV
CONCEITO DE PROVA NO PROCESSO PENAL DEMOCRÁTICO

Prova é tudo o que foi produzido através do devido processo legal, de forma lícita, sob o crivo do contraditório, na presença de um juiz imparcial, em obediência estrita às regras e normas materiais, processuais e constitucionais, cuja parte contrária, mesmo tendo a ciência e a oportunidade de contestá-la, não foi capaz de desconstitui-la, possuindo, cada uma das provas produzidas, valor relativo, sendo sempre analisada em conjunto com as demais provas existentes nos autos, sempre fundamentada pelo Estado-Juiz.
Diante dos conceitos de verdade e de prova no Estado Democrático de Direito, bem como, o disposto no artigo 129, I, da CF, resta evidenciado que o Inquérito Policial não faz prova, mas traz indícios, tratando-se de mera peça informativa e, sequer é essencial para oferta da Denúncia, nada impedindo ao Ministério Público de investigar uma notitia criminis ab initio, notoriamente nos delitos em que agentes do Estado estejam envolvidos ou naqueles em que a estrutura à disposição da Instituição é suficiente para iniciar e concluir investigações, tais como peritos, oficial de promotoria, etc.
Mesmo para os que dizem que a materialidade no inquérito é uma prova, como por exemplo, a afirmação de que o Laudo de Exame Cadavérico traz a certeza de que houve um homicídio, este mesmo laudo, por si só, não pode indicar a autoria.
Concluindo o presente título, entendemos que um Juiz verdadeiramente democrático sequer deverá ler o inquérito ao proferir a Sentença, salvo perícias e laudos que não foram refeitos sob o crivo do contraditório. Não deverá interessar-se se o réu confessou ou não o delito na fase inquisitorial. Não se interessará pelo que as testemunhas disseram na fase inquisitiva, etc., pois é evidente que, diante do disposto no artigo 129, I, da CF, o inquérito policial destina-se única e exclusivamente para formar a opinião do titular da ação penal sobre o delito que se apurou e se haverá ou não a oferta da Denúncia. É para isso que serve o inquérito e nada mais! A lei infraconstitucional é que ainda não adaptou-se à democracia, pois o atual Código de Processo Penal, remonta à ditadura do Estado Novo. Evidente que o Inquérito já pode ser remetido diretamente da Delegacia de Polícia para o Ministério Público, vez que o Juiz nada terá a fazer com os autos investigatórios, a não ser o clássico Despacho já timbrado pela escrivania ou nos carimbos já prontos: “Ouça-se o Ministério Público”.
O Magistrado democrático entenderá que não faz parte do tão propalado “combate ao crime”, pois se o fizer não julgará com imparcialidade o cidadão que está sendo acusado de uma prática delituosa. O juiz é sobretudo um garantidor do cidadão, não o seu algoz! Não tem que cobrir falhas da Polícia ou da atuação do Ministério Público, quando aplica, por exemplo, o artigo 384, em seu parágrafo único, do Código de Processo Penal. Tal artigo é inconstitucional, violando a exata separação dos papéis dos sujeitos processuais, notoriamente o disposto no artigo 129, I, da Constituição Federal, pois deixa sua imparcialidade, sua isenção e neutralidade, a fim de ajudar a acusação a denunciar corretamente, piorando a situação do réu, que após, será julgado pelo mesmo juiz que proferiu a decisão determinando a modificação do libelo. É inconstitucional, sobretudo, porque a pessoa humana possui o direito de ser julgada por um juiz totalmente isento da persecução penal e é essa a vontade do constituinte originário ao determinar exatamente quem é o titular da ação penal: a de conceder ao cidadão que deliberou violar a norma, um juiz que não toque na investigação e na persecução penal e que somente dirija o processo e o julgue, após ser o receptor dos argumentos formais das partes, pois onde há o dissenso, não há verdade, há versões! Portanto, a “verdade” é apenas formal. Já o direito de liberdade é indisponível(art. 5º, “caput” da CF) e não poderá ser violado por dogmas totalitários, como o da busca da verdade real.

Conclusão

Somente com a introjecção pelos operadores do Direito e pelos legisladores dos princípios democráticos e garantísticos, da dignidade da pessoa humana, forjando uma reforma global do processo penal, poder-se-á tornar o processo não um formalismo que toma tempo, dinheiro, lotam presídios e cadeias públicas desnecessariamente, mas sim um efetivo instrumento da vontade social de coibir fatos socialmente danosos, tornando efetiva a norma penal, com a proteção de bens jurídicos relevantes.
Abandonando-se dogmas superados como o da busca da verdade real, que não existe, bem como, deixar o entendimento de que basta provar a autoria e a materialidade de um fato típico, antijurídico e culpável para que seja imposta uma pena privativa de liberdade. Atentar para o fato de que, sempre que uma prova encontra-se nos autos, ali está presente a verdade formal e que somente os autores dos fatos típicos e antijurídicos relevantes, cujos fins da pena estejam presentes, tanto o geral, quanto o específico(culpabilidade como um juízo de imputação, que é subjetiva), deverão receber pena, criando-se uma consciência normativa na sociedade quanto aos bens jurídicos que encontram-se, de fato, protegidos pela norma.

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