A sociedade limitada precisa ou não alterar seu nome empresarial por força do novo Código Civil? Essa é uma das questões mais discutidas nos últimos tempos.
Isso acontece porque existe certa controvérsia sobre o alcance da disposição do Código Civil que determina que a denominação da sociedade limitada deva, obrigatoriamente, designar o objeto da sociedade (artigo 1.158, parágrafo 2º do novo Código Civil).
Qual o correto caminho a perseguir, em face da pendência, considerando que no próximo dia 11 de janeiro de 2004 esgota-se o prazo para que a sociedade limitada, constituída na forma da lei anterior, se adapte ao novo diploma (artigo 2.031 do novo Código Civil)? Será necessário que a sociedade limitada, pré-existente ao atual Código Civil, cuja denominação social não designe o seu objeto, tenha de alterá-la para se adequar à nova lei?
A questão envolve aspectos de ordem prática e teórica.
A modificação da denominação da sociedade limitada, como se sabe, é formalizada por alteração de contrato arquivada na Junta Comercial — o que de per si não implica ônus extraordinário para a empresa — seguida — e aqui é que os problemas se avolumam — da atualização de todos os registros da sociedade perante os órgãos em que ela estiver inscrita.
Assim, minimamente, a sociedade limitada que alterar sua denominação terá de atualizar seus registros perante a Receita Federal, a prefeitura do Município e a Previdência Social.
Tudo isto, ressalte-se, na melhor das hipóteses.
Imagine-se sociedade limitada que, por força de seu objeto social, esteja inscrita na Secretaria da Fazenda como contribuinte do ICMS, registrada em órgão de classe, sujeita ao controle direto dos agentes fiscalizadores do meio ambiente e que dependa de autorizações, aprovações, permissões e licenças diversas para que possa operar regularmente — o que não é raro na vida empresarial, expedidas por dezenas de repartições públicas.
Se tiver de alterar sua denominação, ela estará fadada a ocupar improdutivamente, por muito tempo, parte substancial dos seus recursos e energias em tarefas burocráticas menos nobres, no lugar de se dedicar ao negócio empresarial que gera riquezas e empregos. Muitos meses, provavelmente, terão de ser dedicados pela indigitada sociedade limitada à confecção de novos impressos, registros, carimbos, cartões, notas fiscais, guias, papéis, licenças e assemelhadas.
Assim, em nome do bom senso e da cautela, esse assunto, a alteração do nome, merece desde logo algumas reflexões jurídicas de relevo e de repercussão imediata no cotidiano empresarial.
Isso porque a nova lei civil dispôs que a sociedade limitada pode adotar firma ou denominação e que apenas a denominação é que deve designar o objeto social.
É de notar, desde logo, que a expressão “firma” e a expressão “denominação” tem conteúdos e significados jurídicos bastantes distintos, embora, no linguajar comum, sejam ambas empregadas — erroneamente — como se tivessem o mesmo sentido.
A expressão “firma”, empregada pelo novo Código Civil, às vezes nomeada “razão”, “firma social” ou “razão social” em outros diplomas legais, é o nome empresarial composto do nome de sócio ou de sócios, pessoas físicas, de uma sociedade limitada, tais como “João da Silva Limitada” ou “Souza e Peixoto Limitadas”.
A sociedade limitada que tem “firma” não está obrigada a se adaptar ao novo Código Civil para incluir no nome empresarial a designação de seu objeto social. A designação do objeto social é obrigatória, disse o legislador, apenas quando se tratar de denominação.
Esse entendimento de que não há nada a ser adaptado em relação à firma da sociedade limitada é válido e correto tanto para a pré-existente ao novo Código Civil como para aquela constituída depois do início de sua vigência.
A expressão “denominação”, também designada “denominação social”, a seu turno, é o nome empresarial composto de expressão de fantasia, seguido ou não do nome de sócio quotista e com a designação – antes facultativa e agora obrigatória – de sua atividade.
Assim, antes do advento do novo Código Civil era admissível, a título de ilustração, que uma sociedade limitada adotasse a denominação de “Casa da Alegria Limitada” e que outra preferisse ser denominada “Jarará Limitada”, sem a designação do objeto social. Se referidas sociedades houvessem sido constituídas já na vigência do novo Código Civil teriam elas, no entanto, e a título de ilustração, de adotar, respectivamente, a denominação de “Casa da Alegria — Espetáculos Circenses Limitada” e “Jarará Transporte de Cimento Limitada”, com a designação do objeto social de cada uma.
A sociedade limitada, portanto, constituída depois da vigência do novo Código Civil e que adote denominação como nome empresarial terá, sem a menor dúvida, de designar o objeto social.
Resta no entanto, examinar a questão das sociedades limitadas constituídas anteriormente à vigência do novo Código Civil e que tenham adotado denominação como nome empresarial, sem designação do objeto social.
Terão elas de alterar sua denominação para designar o objeto social?
Em nosso entender, nesta situação, nada há que adaptar ou modificar em relação à denominação das sociedades Limitada.
Isto porque, referidas sociedades limitadas — regularmente constituídas antes da vigência do novo Código Civil — têm direito ao uso do nome empresarial que ostentam, adrede registrado e acolhido pelo Registro do Comércio, direito este que não pode ser desconstituído pela legislação superveniente.
Lei nova, como se sabe, não prejudica direito adquirido.
No plano superior do direito constitucional, a proteção ao nome da empresa, em razão do interesse social, é a todos assegurada por força do disposto no artigo 5º, inciso XXIX, da Lei Maior.
O que significa em conclusão, que a sociedade limitada cujo nome empresarial for uma “firma”, em nenhuma situação, tenha ela sido constituída antes ou depois da vigência do novo Código Civil, será obrigada a designar o objeto social; a sociedade limitada cujo nome empresarial for uma “denominação”, será obrigada a designar o objeto social se constituída após 11 de janeiro de 2003, estando desobrigada deste encargo se constituída antes daquela data.
Luciano Amaral Jr. é mestre em Direito pela PUC-SP, advogado em São Paulo, especializado em consultoria jurídica empresarial.