O precatório como forma de garantia

Adriano Tadeu Troli

Só quem tem um precatório em mãos sabe como é difícil recebê-lo. Em alguns casos, a espera pode levar até uma década, sem contar o tempo que a ação levou para ser julgada. Ocorre que nos últimos tempos o Poder Judiciário passou a considerar a utilização dos precatórios em ações de execução fiscal a título de penhora, com decisões de alguns magistrados que são verdadeiras pérolas jurisprudenciais.

Uma delas associou a Fazenda do Estado de São Paulo a “um veterano jogador de cartas, contumaz estelionatário, que, por emitir cheques sem fundo para pagamento de suas dívidas de carteado, aceitava cheques de qualquer pessoa, menos os de sua emissão, quando vencedor e credor nas mesas de baralho”.

Isso demonstra uma tendência do Judiciário em buscar inovar nas decisões para que os precatórios sejam pagos, ainda que de maneira indireta, numa indicação de um novo caminho para tentar combater a ineficiência do poder público em honrar com suas dívidas.

Na prática, significa um avanço para os credores, que a partir de agora têm a opção de “negociar” seus precatórios para que sirvam como garantia em processos movidos pelo próprio ente público devedor do crédito.

Vale destacar que para este tipo de negociação não há qualquer vedação imposta ou falta de amparo legal, desde que sejam os precatórios originários de decisões judiciais transitadas em julgado e estejam devidamente inscritos perante a Fazenda municipal, estadual ou federal.

Dessa forma, podem ser livremente negociados, inclusive como lastro para operações financeiras, o que faz com que muitos credores comercializem seus títulos no mercado com o deságio exagerado de até 70% do valor original do crédito devidamente atualizado, uma vez é melhor receber o valor menor do que esperar infinitamente pelo pagamento no processo. A negociação é realizada através de um contrato de cessão de crédito ou por escritura pública.

Para se ter idéia do atraso no cumprimento dos pagamentos dos precatórios pelo Estado de São Paulo, a dívida atual é de aproximadamente R$ 15 bilhões, sendo que não foram quitados ainda os precatórios alimentares do ano de 1998.

Sendo assim, a comercialização dos precatórios no mercado também aparece como uma boa opção quando se percebe que não há qualquer interesse da Secretaria da Fazenda em criar mecanismos para reduzir suas dívidas ou mesmo aceitar os precatórios como forma de quitação de débitos.

Uma amostra disso é a recente determinação proferida pela Secretaria da Fazenda Estadual, através da CAT 46/06, que impõe multa de 100% do valor do crédito escriturado caso seja utilizado no pagamento mensal de tributos. Para que a compensação mensal fosse possível como forma de extinção do crédito tributário, seria mesmo necessária a autorização legal, conforme determina o artigo 170 do Código Tributário.

Logo, ao invés de ampliar a utilização dos precatórios para tentar solucionar o atraso no pagamento, o governo estadual demonstra que pretende fechar o cerco em torno dos contribuintes, o que poderá ser interpretado pelo Poder Judiciário através de novas ações como conduta inapropriada —acarretando em decisões inusitadas que poderão atribuir novas condições de utilização dos precatórios. Mas o fato concreto é que nesse momento existe disposição da Justiça em amenizar os impactos do calote do Estado.

—————————

Adriano Tadeu Troli é advogado especialista em direito processual civil e administrativo do escritório Innocenti Advogados Associados

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado.


Você está prestes a ser direcionado à página
Deseja realmente prosseguir?
Atendimento