“O ser humano e o princípio da inocência” é de autoria do secretário-geral do Conselho Federal da OAB, Marcus Vinícius Furtado Coelho e foi publicado hoje no jornal A Cidade, de Votuporanga.
“Informações transmitidas à mídia, a respeito de determinadas ocorrências policiais, podem ser veiculados sem que os jornalistas procedam em uma apuração mais apurada dos fatos. Em muitos casos, em fração mínima de tempo, o cidadão, que fora apresentado à autoridade policial como suspeito, tem sua face estampada em redes sociais, jornais e programas televisivos especializados, rotulado como condenado. O Art. 5º, inciso LVII da Constituição Federal, é muito claro: “Ninguém será considerado culpado até o trânsito em julgado da sentença penal condenatória”. O princípio da presunção de inocência está entre as principais garantias constitucionais do cidadão brasileiro, ao estabelecer que todo e qualquer acusado deve ser considerado inocente até a decisão final, contra a qual não caiba mais recurso, independente da acusação que lhe seja imputada. Uma das conseqüências mais sensíveis deste princípio é o deslocamento da figura do ser humano da condição de objeto do processo, para a condição de sujeito, gozador de direitos e obrigado a deveres.
Ou seja, ninguém pode ser considerado culpado antes da sentença final, que advirá após lhe ser garantida a ampla defesa e o contraditório, dentro do devido processo legal. O investigado de ato ilícito tem o direito de ser tratado com dignidade enquanto não se solidificam as acusações, já que, com o trânsito em julgado, se pode chegar a uma conclusão de que ele é inocente. Com segurança, pode-se afirmar que, por um lado, o processo penal existe para punir delinqüentes, por outro, para evitar que sejam punidos inocentes. Como são veiculadas pela mídia supostas práticas criminosas, geralmente de maneira imprudente e sensacionalista, em claro afronte à privacidade daqueles que são submetidos à persecução criminal. Com certa freqüência, há divulgação nos meios de comunicação, sobretudo nos programas sensacionalistas, da imagem de suspeitos acusados de conduta delituosa. Contudo, esquece-se que essas pessoas têm uma vida, um convívio social, a honra, o bom nome e a boa fama, como o sentimento íntimo, consciência da própria dignidade pessoal.
Em flagrante desrespeito a presunção de inocência, por vezes, em subserviência ao poder da imprensa, alguns agentes públicos vedam o acesso do advogado ao inquérito policial, mas na televisão mostram cópias dos depoimentos em primeira mão. A impressão que se colhe é a de que, apesar do STF afirmar a necessidade de fundamentação específica para a decretação de prisão processual, dado o princípio da presunção de inocência, prepondera à tendência de temperar o princípio, prestigiando-se a prisão diante da gravidade do crime imputado e quando há grande repercussão do caso na imprensa. Até mesmo a Declaração Universal dos Direitos Humanos, da Organização das Nações Unidas, em seu Art. XI assevera que “todo ser humano acusado de ato delituoso tem o direito de ser presumido inocente até que a sua culpabilidade tenha sido provada de acordo com a lei”. Igualmente, a jurisprudência de vários países com tradição democrática contempla o instituto da presunção de inocência, a garantir que o imputado não receba punição antes da sentença final”.
Votuporanga (SP), 15/11/2011 – O artigo O ser humano e o princípio da inocência