O TRATAMENTO NACIONAL ENTRE OS PRESTADORES DE SERVIÇOS NO MERCOSUL

O TRATAMENTO NACIONAL ENTRE OS PRESTADORES DE SERVIÇOS NO MERCOSUL
Robson Zanetti*

Resumo: O presente artigo aborda a questão do tratamento nacional entre os prestadores de serviços no Mercosul com base no Protocolo de Montevideo sobre a prestação de serviços.

O Protocolo de Montevidéu sobre a prestação de serviços no Mercosul aborda em seu artigo 5 a questão referente ao tratamento nacional.
O artigo 5, parágrafo 1º, estabelece que os Estados Partes não poderão adotar um tratamento “não menos favorável” do que aquele que outorga a seus próprios serviços similares ou prestadores de serviços similares. Este “tratamento não menos favorável” implica, no mínimo, um tratamento igual.
O tratamento nacional deve ser realizado em proveito daquelas pessoas que desejam se estabelecer em um dos países partes do Mercosul, fazendo com que estas pessoas não sejam tratadas de forma menos favorável com relação a nenhuma outra pessoa de nacionalidade de um destes países ou de um residente permanente.
A essência do tratamento nacional consiste em uma igualdade de direitos e obrigações entre os beneficiários da livre prestação de serviços de um dos Estados Partes. A igualdade estabelecida no Tratado de Assunção é uma igualdade econômica formal e não real e desta forma os Estados recorrem ao princípio da proporcionalidade para garantir as pessoas de um dos países partes do Mercosul o mesmo tratamento.
A igualdade de tratamento estabelecida no Protocolo de Montevidéu sobre a prestação de serviços garante a estas pessoas direitos e obrigações específicas que dizem respeito ao acesso as atividades econômicas e seu exercício com obrigações de reciprocidade.
A igualdade de tratamento no Mercosul não é a mesma do que a estabelecida no direito comunitário europeo, aqui, não existe a obrigação de reciprocidade e nem a cláusula da nação mais favorecida, enquanto no Mercosul existe. Desta forma, quando no direito comunitário europeo uma regra referente a prestação de serviços não é respeitada por um dos Estados membros, um outro Estado membro não terá o direito de desrespeitá-la.
O direito do Mercosul visa uma igualdade formal e não real, conforme estabelecido no artigo 5, parágrafo 2 do Protocolo de Montevideo sobre a prestação de serviços ao estabelecer que:
” Todo Estado Parte poderá cumprir o disposto no paragrafo 1 outorgando aos serviços e prestadores de serviços dos demais Estados Partes um tratamento formalmente idêntico ou formalmente diferente ao que outorga aos seus próprios serviços similares e prestadores de serviços similares. ”
O tratamento formalmente idêntico ou formalmente diferente não obriga os Estados membros a dar um tratamento real entre os prestadores de serviços no Mercosul, conforme expressamente estabelecido no artigo 5, paragráfo 2:
” Os compromissos específicos assumidos em virtude do presente artigo não obrigam os Estados Partes a compensar desvantagens competitivas implícitas que resultem do caráter estrangeiro dos serviços ou prestadores de serviços pertinentes “.
A regra do tratamento nacional, conforme estabelece o artigo 5, parágrafo 4 do Protocolo de Montevideo sobre a prestação de serviços implica a eliminação de todas as discriminações entre estrangeiros e nacionais, de tal forma que todas as pessoas fiísicas e jurídicas de um dos países parte do Mercosul sejam tratados da mesma forma sob o ponto de vista formal, ao estabelecer que:
” Considerar-se-á que um tratamento formalmente idêntico ou formalmente diferente é menos favorável se ele modifica as condições de concorrência em favor dos serviços ou prestadores de serviços do Estado Parte em comparação com os serviços similares ou os prestadoress de serviços similares de outro Estado Parte. ”
Esta igualdade de tratamento instaurada não é absoluta porque ela consiste na assimilação do estrangeiro ao nacional com relação a submissão as regulamentações internas sob o ponto de vista formal e não real. É bom lembrar que a igualdade de tratamento não se refere a supressão de restrições.
A liberdade de prestação de serviços consiste na interdição de toda discriminação e determina uma obrigação positiva de igualdade de tratamento, mas esta regra não é suficiente para assegurar a realização da liberdade de prestação de serviços porque muitas vezes as condições de acesso as várias atividades independentes são diferentes, como por exemplo, aquelas que dizem respeito a formação e qualificações profissionais, as quais devem ser coordenadas, sob pena desta liberdade não se realizar de forma efetiva.
A aplicação do tratamento nacional se demonstra insuficiente para a realização da liberdade de prestação de serviços quando um Estado Parte exige de uma pessoa de um outro Estado Parte que este possua um diploma nacional, certificado ou formação prática que o venha a impedir de prestar seus serviços no Estado Parte de acolhimento.
Em cada Estado Parte é necessário que as pessoas interessadas em prestar seus serviços o prestem nas mesmas condições que os nacionais do Estado em questão. Esta regra tem que ser completada pela coordenação progressiva das regras regulando o acesso destas pessoas as atividades não assalariadas, fazendo com que elas obtenham o reconhecimento de seus diplomas, certificados e outros títulos.
Se assim não o for, estaremos esquecendo que, para as profissões independentes, a regra do tratamento nacional não é suficiente por si só para garantir de forma plena a liberdade de prestação de serviços em virtude das diferenças relacionadas a natureza dos diplomas e das qualificações profissionais que devem ser adquiridas.
O tratamento nacional aplicado a liberdade de prestação de serviços no Mercosul é orientado pelas regras clássicas do direito internacional e este tratamento é formal e não real. Assim, nenhum Estado Parte está obrigado a tomar qualquer atitude que seja, para implicitamente inserir uma pessoa beneficiária da livre prestação de serviços em seu território, basta que o Estado respeite o que está estabelecido formalmente nos acordos.
Notas:
Protocolo sobre a prestação de serviços no Mercosul. Decisão nº 12/98. www.mre.gov.br
Sobre a noção de discriminação, ver Van Hecke G. La notion de disrimination, in Les aspects juridiques du Marché commun, p. 127 e s.; Wybo M., Discrimination et Marché Commun.
Cerexhe, Étienne. Le droit européen: la libre circulation des personnes et des entreprises. Bruxelas: Nawelaerts, 1982, nº 5, p. 11.
PEREIRA, Ana Cristina Paulo. Mercosul: o novo quadro jurídico das relações comerciais na América Latina. Rio de Janeiro: Lumis Juris, 1997. Tese apresentada junto a Universitè de Paris 1 ( Panthéon-Sorbonne ) no ano de 1996, pgs. 40 e 41; o artigo 2 do Tratado de Assunção estabelece que ” O Mercado Comum será fundado na reciprocidade de direitos e obrigações entre os Estados Partes ” e o artigo 3, parágrafo 1 do Protocolo de Montevideo sobre a prestação de serviços estabelece a cláusula da nação mais favorecida. CMC. Dec. nº 12/98, www.mre.gov.br
Sobre as relações entre a liberdade e a igualdade, ver Louis J.V. Observations sous CJCE, 21 de junho de 1974, J.T., 1974, p. 549 e s.
Gérard Druesne, Remarque sur le champ d´application personnel du droit communautaire: des ” discriminations à rebours ” peuvent-elles tenir en échec la liberté de circulation des personnes?, Rev. Trim. Dr. Eur. N° 3, juillet-sept. 1979, p. 429 e ss.
* Mestre e doutorando em Direito Comercial pela Universitè de Paris 1 ( Panthéon-Sorbonne ). Especialista em Direito Comercial pela Università Statale di Milano.
E-mail: robsonzanetti@hotmail.com

Autor: Robson Zanetti Fonte: Infojus

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