Em todos os sistemas políticos democráticos, o voto é o instrumento de representação da vontade popular de maneira livre e individual. Ocorre que no Brasil essa representação da vontade popular, ou seja, a expressão do pensamento, do desejo da maioria da população, ainda não está inserida de uma verdade intencional porque, no seu âmago, está desprovida de conhecimento político e das propostas que a Nação está a exigir daqueles que a compõem e que a representam. Em suma, as campanhas políticas vêm e o seu “lero” é sempre o mesmo.
A grande maioria dos representantes escolhidos pelo voto, muitas vezes, mal sabe do seu papel na Instituição na qual vai exercer o seu mandato. Desconhecem o seu funcionamento e as regras para atuação eficiente de seu exercício de representação da vontade popular. É o velho ditado: “cada povo tem o Governo que merece”.
A visão do eleitor brasileiro com relação ao voto como instrumento do qual possa se utilizar na expressão de sua vontade, de seu desejo de acontecer e o atendimento às suas aspirações ainda não está nutrida de análise e informação que lhe dê conhecimento para bem exercer a sua opção no momento eleitoral. Fica, com isto, à mercê de propagandas bem elaboradas e de favores pré-eleitorais. A possibilidade do detentor do voto a uma má utilização desse instrumento é grande.
É bem verdade que tivemos nos últimos anos um grande avanço no exercício do direito de votar e escolher aqueles que vão nos representar no legislativo e no executivo. Está bem reduzida a equação do voto como moeda de troca de favores. Está em alta, no momento, o voto da contestação, das promessas e o emocional ante as desgraças que são postas na televisão e o seu salvador.
Mas ainda falta muito para o voto ser verdadeiramente a expressão das necessidades e dos desejos reais da população em relação as suas expectativas de qualidade de vida e avanço social. A não-observância disto tem como resultante o descompromisso político ideológico entre governantes e governados dada a natureza com que foi conquistado o voto. O voto inserido de consciência política aconteceu há pouco tempo na eleição francesa. O eleitor francês, ao perceber que a proposta apresentada pela extrema direita estava com chances de prevalecer no segundo turno e com isso ganhar as eleições, compareceu em massa para rejeitá-la, votando no opositor. Observe que não era o candidato o votado, mas sim, a proposta de governo do seu partido.
No mundo desenvolvido, os partidos políticos têm bem definidas as suas propostas de atuação e de comportamento ideológico. Cada qual defende perante a população aquilo que vai cumprir caso detenha o poder. Aqui no Brasil não há definição, qualquer que seja, e as alianças deixam de lado toda pregação ideológica e ajustam interesses tão espúrios que “nem a velhinha de Taubaté acredita”.
Para complicar mais ainda, o que se pode notar de maneira clara é que ocorre entre votante e votado, uma quebra de vínculo no momento em que o primeiro delega ao segundo, através do voto, a sua representatividade.
Isto está muito nítido nos acontecimentos de hoje. É preciso então criar mecanismos que possam gerar obrigatoriedade de compromisso no inter-relacionamento e mesmo na consecução de objetivos, não ficando à mercê dos votados (políticos), a vontade geral dos votantes (eleitores). Assim teríamos uma representatividade legítima dependente do consenso da sociedade, que tem no voto a sua expressão da vontade geral em conformidade com a qual deve o votado exercer o poder.
O declínio dos partidos e a decadência de seus líderes para a burocracia, a fragmentação de lideranças, o aumento do personalismo e a evaporação do apoio popular, são indícios suficientes de que está na hora de mudar, sejam as regras, as formas de agir e mesmo, o respeito ao voto. Os Poderes – Executivo e Legislativo, entretanto, têm que ter legitimidade para tal para promover tais mudanças.
Raphael Curvo
Advogado