Ofendículos

Por Eudes Quintino de Oliveira Júnior,
advogado (OAB-SP nº 35.453), reitor da Unorp

O homem, desde sua origem, impregnado pelo DNA de sua natureza, carrega importante informação a respeito dos direitos que compõem seu arsenal protetivo, sem necessidade de buscar qualquer auxílio legal interpretativo. Assim é que a noção do justo e correto surge com o próprio homem, pois o que assim for considerado é salutar para a vivência harmônica e serve de diapasão para o regramento social.

É a regra do direito natural que, após passar por todas as etapas de aprovação, vem a ser materializada em normas contidas no direito positivo. Pode-se dizer que é um direito que transcende todas as regras impostas pelo homem pois tem como sustentáculo princípios universais imutáveis que jamais poderão ser confrontados, pois giram em torno da essência e da dignidade do ser humano.

O direito codificado é um conjunto de regras firmado em uma convenção social que visa atender a um critério de justiça estabelecido pelo próprio homem, ser gregário que é. Mas tais valores socioculturais, obrigatoriamente, devem carregar os padrões mais singelos e simples da convivência humana, com seus direitos e obrigações, que foram catalogados pelo homem desde seus primórdios.

O direito de defesa insere-se neste rol. Compreende-se aqui a defesa de qualquer direito consagrado legalmente, que pode ser a vida, liberdade, patrimônio e outros, desde que seja para repelir uma agressão injusta, atual ou iminente, com a utilização moderada dos meios necessários. A legítima defesa não se caracteriza pelo legítimo ataque e sim pela franquia concedida pelo legislador para que o cidadão repila a agressão na defesa do seu bem juridicamente tutelado.

Uma questão que frequenta com certa assiduidade o interesse popular é saber se a colocação de ofendículos, assim entendido os obstáculos ou qualquer tipo de engenho utilizado para impedir o acesso em residência, como, por exemplo, a instalação de sistema mecânico de defesa à base de eletricidade em cercas dispostas em muros, é prática que se enquadra no âmbito da legítima defesa.

Não há nenhuma dúvida que a propriedade é um bem jurídico e como tal deve ser defendida pelo Estado, em sua função preventiva, ou até mesmo pelo proprietário. Não se exige do último que monte guarda e se posicione durante todos os dias e noites em situação de defesa, que compreende aqui a sua própria, a de seus familiares e de seu patrimônio.

Pode, sim, eleger mecanismos para evitar eventual agressão ao seu direito, desde que consentâneos ao bom senso e a moderação dos meios. Seria a chamada legitima defesa preordenada ou antecipada, que tem por objetivo repelir a injusta invasão. Parte da doutrina penal visualiza no ato exercício regular de um direito quando o defendente instala mecanismo e, se conseguiu seu intento, passa a caracterizar legítima defesa.

É óbvio que se o morador, valendo-se do pretexto de defender sua moradia, instalar uma cerca eletrificada com uma voltagem considerada mortal, extrapola o exercício de seu direito e responderá dolosa ou culposamente pelo excesso. A permissão concedida cessa com o objetivo pretendido, qual seja, o de impedir o ingresso na residência.

Exige-se do defendente que tome também a cautela necessária para alertar as pessoas a respeito do instrumento defensivo, pela afixação de placas escritas ou sinalizadas indicativas do perigo. Nem todas agem com o intuito criminoso, como a criança que pretende pular o muro para apanhar a bola que caiu no quintal da residência.

Desta forma, em nome da segurança, as pessoas quebram a estética de sua moradia, constroem muros altos e fincam cercas eletrificadas. Um verdadeiro casulo, antigamente chamado de lar.

eudesojr@hotmail.com

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