Os Automóveis e o Trânsito

Ricardo Rodrigues Gama

A circulação de veículos preocupa todos os governos e recebe tratamento legal contínuo. Muitas são as funções dos veículos motorizados, como transportar pessoas e cargas, servir à competição(corrida de veículos), e até mesmo ser utilizado como carrinho de venda de lanches.
Na França, com a criação de uma polícia de trânsito, as primeiras normas foram os Decretos de 10 de março de 1899, de 10 de setembro de 1901, e a Lei de 17 de julho de 1908. Uma das regras era a de que a velocidade desenvolvida pelo veículo, por onde transitassem pedestres, deveria ser equiparada a do caminhar. Indubitavelmente, com o surgimento dos automóveis, pela diversidade, a convivência entre eles e os pedestres sempre esteve cercada de disciplina legal. De início, poder-se-ia parecer que os abusos seriam só dos motoristas, mas hoje já se sabe que o pedestre deve seguir as regras para não ser responsabilizado pelo atropelamento.
A evolução dos veículos não é acompanhada pelo ordenamento jurídico, o qual traça normas quase-sempre ultrapassadas. Talvez fosse melhor dizer que as normas regulamentadoras estão sempre em estágio de aperfeiçoamento. Num determinado momento mostra-se a lei mais rígida e, noutros, por falsos motivos, menos rigorosa. O código de trânsito em vigor no Brasil reflete bem o que estamos a dizer, porque uma lei frágil foi abandonada para o nascimento de uma lei distante da realidade brasileira em vários aspectos. A exigência de equipamentos do veículo, por exemplo, foi absurda e sempre está recebendo reparos.
Ainda sobre a evolução, todas as descobertas tecnológicas encontram nos veículos um emprego certo. Com isso, a melhoria de motores, suspensão e demais componentes, imprimiu velocidades inimagináveis ao automóveis criados com formas rudimentares. E, com essa rapidez, o corpo de leis não manifesta qualquer identidade. Por outro lado, não se pode negar que é difícil escolher a melhor norma para tratar de um tema sempre em mutação.
Pela estatística, nem mesmo com os avanços tecnológicos e com as constantes mudandas das leis, as mortes no trânsito são reduzidas ou deixam de acontecer. E, pelo que tudo indica, o futuro pode ser mais catastrófico do que a amarga realidade. Não basta apresentar dados, pois os indicadores sempre estão a acusar o crescimento dos acidentes de trânsito.
No Poder Judiciário, as indenizações por acidente de trânsito tratam de vários assuntos, como o reconhecimento do direito, a extensão do prejuízo e até a incidência de juros e correção monetária sobre estes. Em especial, o juiz criminal aprecia as questões relacionadas à ocorrência de delitos no trânsito.
Além dos equipamentos, os dispositivos automobilísticos ganham resistência e evoluem o conjunto, tudo visando o conforto e segurança dos condutores de veículos, dos passageiros e até de pedestres. Os automóveis têm motores que desenvolvem velocidades surpreendentes, sistemas de freios de grande precisão, pneus que subsistem a duras provas, dispositivos de proteção em caso de acidentes(air bag), fárois potentes, aerodinâmica futurista…
O trânsito não depende somente dos veículos, mas de muitos outros elementos. Além do veículo proporcionar segurança ao condutor, passageiros e pedestres, é preciso que as condutas de todos eles sejam coerentes. Em verdade, trata-se de um sistema, no qual os resultados positivos dependem da boa atuação de cada um deles. No Brasil, como em muitos outros países, os princípios básicos de educação no trânsito são violados. Educação do condutor, dos passageiros e dos pedestres. Equivocadamente, as autoridades estão preocupadas só com a elevação do valor das multas, pensando que somente esta medida é capaz de diminuir ou por fim aos acidentes estupidos, os quais matam muitas pessoas no dia-a-dia. Com as principais propostas de alteração do atual Código de Trânsito Brasileiro, vê-se, de forma clara, a possibilidade de redução do valor das multas e o abrandamento das medidas administrativas decorrentes da infração de trânsito. Isso não é absurdo, pois, como pensam os legisladores, os erros podem ser corrigidos devidamente com novos aplicativos. Com isso, pode-se vislumbrar soluções futuras ou será estabelecido um ciclo vicioso sem saída lógica e inteligente. Para essa postura legislativa distante da realidade.
As vítimas do trânsito adquirem deficiências físicas permanentes e têm problemas psicológicos duradouros. As fraturas são traumatismos que levam muitas vítimas à incapacidade até para desenvolver as atividades mais simples do cotidiano.
E as mortes em acidentes de trânsito, como resolver este problema? Esta questão perpetua-se sem resolução; registre-se que os acidentes com morte sempre estão em crescimento. A imprudência tem sido sempre indicada como a motivação constante da colisão de veículos e atropelamentos. Diante de tantos assassinatos ocorrentes na violência urbana, a morte não é mais vista como algo excepcional, mas uma ocorrência normal. Não há dúvida que houve a banalização da vida, fazendo alguns acreditarem que a morte acidental seja normal. O motorista que não segue as normas de trânsito e dirige de forma imprudente, sem medo de errar, contribui para a piora da qualidade de vida de todos. Igualmente, os passageiros e os pedestres devem seguir as normas de proteção. No trânsito, basta ponderar que as normas servem para proteger todos os envolvidos. No transporte urbano dos grandes centros, o desrespeito dos passageiros choca qualquer ser vivente. O pedestre impulsivo e descuidado pode, além de pôr a sua vida em risco, marcar a vida do motorista do carro que lhe atropelar.
O transporte de cargas revela as suas faces e acusa a extensão dos prejuízos a serem causados. As mercadorias devem ser conduzidas de um local para outro de forma adequadas, não podendo causar qualquer prejuízo a ninguém. Nas estradas brasileiras, as cargas perigosas ocupam lugares destacados pelo desrespeito às normas básicas para evitar acidentes. Falta prudência dos condutores, proprietários das cargas e da fiscalização.
Por outro lado, as rodovias brasileiras são as grandes responsáveis por muitos acidentes fatais. Muitos morrem em virtude da falta de manutenção das rodovias e até pela sinalização deficiente. O problema existe, todos sabem, mas ninguém toma providências.
A corrupção dos agentes administrativos que deveriam fiscalizar o trânsito impressiona qualquer cidadão. As ações destes agentes devem ser de duas ordens: educativa e repressiva. A ação educativa não é muito difundida e praticada pelos agentes administrativos do trânsito. Não há uma preocupação direta das autoridades em desenvolver uma ação educativa, a qual seria dirigida ao apredizado, à prevenção e conscientização dos envolvidos no trânsito. A predileção pela ação repressiva mostra uma face sórdida da administração e de seus agentes. A arrecadação de valores a título de multa reforça os cofres públicos e em nada contribui para a melhoria do trânsito. O dinheiro das muitas não é investido em campanhas ou qualquer tipo de ação educativa. Com relação aos agentes, o ato de aplicar multa é quase-sempre externado com o excesso e o abuso de poder, sem fazer alusão às atitudes covardes e corruptas de alguns agentes. O cidadão precisa ser respeitado para aprender a respeitar; nada melhor do que receber esta lição do agente administrativo. Para, ao menos, coordenar as idéias e apreender as coerências no tratamento humano. Ainda que o agente seja honesto, a falta de preparo dele compromete a abordagem e, na maioria das vezes, submete o motorista à humilhações desnecessárias.
Quem são os responsáveis pelas barbáries do trânsito? São somente os condutores de veículo, os passageiros e os pedestres. E as normas deficientes que nos apresentam os Legisladores e o Executivo, acompanhadas da escassez de ações educativas. Acentuando que a sinalização e o estado das rodovias contribuem com o caos que se encontra o trânsito nacional.
O envolvimento dos automóveis no trânsito é uma realidade e não há como desfazer isso. A convivência entre os automóveis, condutores, passageiros e pedestres, agentes administrativos, reclama regulamentação coerente e o Legislador, com o atual Código de Trânsito Brasileiro, está em débito com a sociedade.

Ricardo Rodrigues Gama
Professor da Faculdade de Direito do CREUPI – Esp. Sto do Pinhal-SP.
Professor da Faculdade de Direito Padre Anchieta de Jundiaí-SP.
Professor da Faculdade de Direito da ITE – Bauru-SP.
Professor da Faculdade de Direito de Marília-SP.
Mestrando pela PUC de Campinas-SP.
Advogado

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