Passadas as eleições na Ordem dos Advogados do Brasil – Seccional de Mato Grosso do Sul, é importante que se façam algumas considerações acerca do processo realizado, dos métodos utilizados e dos resultados obtidos. Essas avaliações não devem ter por objetivo – e não tenho essa pretensão – de julgar este ou aquele candidato, de condenar este ou aquele método, mas sim de, passado o calor da disputa, avaliar o que ficou, em termos de símbolos e de valores, para os advogados e para a sociedade. Afinal a política é feita de símbolos e nossa sociedade se organiza em torno de valores.
Esta reflexão se faz necessária porque a Ordem se firmou e se notabilizou por uma postura séria e combativa diante dos desvios éticos, das ameaças à democracia e das violações dos direitos fundamentais da pessoa humana, agindo como guardiã das liberdades, da ordem democrática e do compromisso com a ética.
A internet está cheia de piadinhas sobre os advogados, achacando-os, referindo-se à sua rapidez e esperteza para obter vantagens pessoais, tratando-os como picaretas, fazendo uma generalização que não reflete a realidade. Mas a versão vale mais do que o fato: ou nós reagimos coletiva e seriamente contra isso ou fazemos como a avestruz que enterra a cabeça para não ver, pensando assim evitar a ameaça que está prestes a nos destruir, corroendo perigosamente nossa credibilidade e nossa legitimidade.
Para resgatar a garra e a combatividade dos advogados, fortalecendo a OAB, três iniciativas e posturas são absolutamente salutares e necessárias:
Em primeiro lugar devemos todos evitar a cristalização dos grupos em quase partidos permanentes, instrumentos unicamente voltados para a disputa do poder na instituição. Assim sendo, criaríamos uma tal divisão, fragmentação e tensionamento que nos afastaria definitivamente dos objetivos mais nobres que sempre nos uniu.
Em segundo lugar devemos resgatar as principais bandeiras desfraldadas – por todos os candidatos – durante o processo eleitoral: lutar por um ensino jurídico de qualidade, aprimorar o exame de Ordem, exigir ética no exercício da advocacia, resgatar a Ordem enquanto instrumento de defesa das prerrogativas dos advogados e atuante na luta por uma sociedade mais justa e igualitária, na defesa da democracia e da ética na política. Só assim poderemos organizar as ações da OAB em torno de idéias – e não de pessoas e grupos – e de um projeto comum à grande maioria dos advogados .
Por fim, devemos encaminhar coletivamente algumas iniciativas concretas para o aprimoramento do processo político e eleitoral no seio da Ordem, garantindo a democracia interna, a unidade dos advogados em torno da instituição e a legitimidade de quem a dirige:
A primeira delas é a instituição da eleição em dois turnos para garantirmos a representatividade do presidente, da diretoria e do conselho eleito. Ora, a chapa eleita no último dia 17 obteve 31% dos votos e as demais chapas 69% do apoio dos advogados. Não estamos aqui questionando a legitimidade da chapa eleita, até porque esta é a regra vigente, mas inegavelmente uma eleição em dois turnos faria com que a chapa eleita representasse no mínimo 50% mais um dos advogados, obtendo maior representatividade e legitimidade.
A segunda alteração importante é a instituição da proporcionalidade do conselho. Assim, o presidente e a diretoria seriam eleitos através de um processo majoritário e o conselho eleito de forma proporcional de tal maneira que todos os grupos que participassem do processo eleitoral teriam assento, de acordo com os votos obtidos, garantindo maior democracia interna, pluralidade na composição do colegiado e uma efetiva participação de todos os grupos organizados na condução dos destinos da Ordem.
A terceira alteração é talvez a mais complexa, mas que se reveste de importância vital: a instituição de mecanismos que garantam maior rigidez nas regras eleitorais, coibindo de pronto qualquer desvio ético e utilização do poderio econômico como meio de influenciar o processo eleitoral. Se nós advogados queremos fortalecer a OAB e fazer com que ela retome suas bandeiras históricas, não podemos de maneira nenhuma macular os processos de disputa interna, sob pena de perdermos a credibilidade para lutar contra a corrupção, cobrar ética na política e exigir zelo pela coisa pública.
Por fim gostaríamos de parabenizar o candidato eleito e a chapa vitoriosa, salientando, sem rancor, que sobre suas cabeças paira, como a espada de Dâmocles, a atenção de toda a sociedade, especialmente os olhos muitíssimo atentos do conjunto dos advogados, a cobrar da Ordem e de seus dirigentes uma postura absolutamente isenta, independente e ética, comprometida com os valores mais sagrados da nossa democracia, sempre entrincheirada na luta contra o autoritarismo e contra os privilégios que visam sempre conspurcar e manipular os processos eleitorais.
Saulo Monteiro de Souza, Advogado, é professor universitário.